Na tarde desta terça-feira(02), a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara de Curitiba resolveu dar uma lição para a juventude da cidade. Não foi de cidadania, não foi de compromisso público – foi de como sonhar com a universidade continua sendo um privilégio reservado a poucos.
Meu projeto, que garantia tarifa zero nos dias de Enem e vestibulares, foi arquivado. Isso mesmo: enterraram sem dó uma proposta simples, constitucional, já ajustada e, o mais importante, apoiada pela população. Era um projeto que poderia mudar a vida de milhares de estudantes em situação de vulnerabilidade. Mas a CCJ preferiu se dedicar ao que realmente parece ser sua especialidade: dizer não ao povo e sim à conveniência.
E não foi por falta de cobrança popular. A sala estava cheia de estudantes, jovens que se organizaram e foram até a Câmara exigir o direito de chegar até a porta da universidade. Eles mostraram garra, mostraram consciência, mostraram luta. Já os vereadores, esses mostraram o contrário: medo da juventude pensante e disposição para enterrar sonhos.
O episódio beira o surreal. O relator, vereador Rodrigo Marcial (NOVO), primeiro deu parecer favorável. Chegou a dizer que o projeto era constitucional, só precisava de ajustes técnicos (escrever Enem por extenso). Fiz os ajustes. Aí, no meio do caminho, o vereador resolveu virar a mão e pedir o arquivamento. Mudou de opinião como quem troca de paletó — sem argumento plausível e sem vergonha. Se fosse redação de vestibular, levaria um belo zero por falta de coerência. Nota zero para Rodrigo Marcial e também para os vereadores que embarcaram na contradição: Fernando Klinger, Jasson Goulart, Rafaela Lupion, Tiago Zeglin e Toninho da Farmácia.
Ao invés da tarifa zero para estudantes, conseguiram nota zero pela contradição.
Ignoraram, sem pestanejar, dados que não deixam margem para dúvida: em 2023, Curitiba teve mais de 37 mil inscrições no ENEM, 36 mil no vestibular da UFPR e 18 mil na PUC/PR. Dezenas de milhares de jovens que se preparam durante meses para a prova que pode mudar o rumo da vida. E no dia decisivo podem ser barrados não pelo conhecimento, mas pelo preço da passagem.
Numa cidade onde 12,5% da população vive em vulnerabilidade, a conta é cruel. O valor de ida e volta de ônibus pesa no orçamento. Para muitas famílias, significa abrir mão do básico para que o filho consiga sentar na sala de prova. E foi justamente essas famílias que a Câmara resolveu ignorar.
Curitiba perdeu a chance de ser referência em justiça social. Enquanto países como Luxemburgo, Estônia e Escócia já tratam a tarifa zero como política de Estado — muitas vezes voltada para a juventude —, aqui seguimos atolados na miopia política e na boa e velha conveniência.
E a verdade é uma só: a classe que já nasce rica sempre pretende manter os pobres sem estudo, porque é conveniente. Afinal, menos jovens negros, periféricos e filhos da classe trabalhadora na universidade significam mais mão de obra barata e menos gente questionando privilégios.
O constrangimento visível dos vereadores que votaram pelo arquivamento não esconde a incoerência. Não foi um erro técnico: foi uma escolha política. Um recado expresso de que, para eles, a juventude é descartável.
Mas aqui vai outro recado: a juventude precisa seguir firme, continuar na luta e ocupar todos os espaços. Já já teremos audiências públicas sobre a nova licitação do transporte coletivo — um sistema que se diz “público”, mas não é, porque é pago e caríssimo. E é nesses espaços que vamos cobrar, juntos, o que é de direito: transporte de verdade público, acessível e que não seja uma barreira para os sonhos da juventude.
E eu fecho com o óbvio: é absurdo que ricos governem para ricos, mantendo as portas fechadas para quem mais precisa. Enquanto isso acontecer, meu lado seguirá sempre o mesmo: ao lado de quem precisa da coragem na política. Ao lado da população.
*Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.