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Jean Freire é médico e deputado estadual de Minas Gerais pelo Partido dos Trabalhadores (PT)

Propag: um novo caminho para enfrentar a dívida de Minas Gerais

A dívida é real. Mas é possível enfrentá-la sem abrir do que é do povo

Quando você negligencia uma dívida, ela cresce. E, quando a conta chega, vem alta demais. A dívida de Minas Gerais teve início na década de 1990, quando a União absorveu débitos dos estados. Desde então, o valor devido aumentou com os juros e encargos, impactando diretamente na situação fiscal do Estado. 

Atualmente, a dívida de Minas com a União está estimada em cerca de R$ 165 bilhões. Só entre 2020 e 2024, segundo dados da Secretaria de Estado da Fazenda, esse valor cresceu mais de 50% durante o governo Romeu Zema. Esse crescimento se deve principalmente à suspensão temporária dos pagamentos por decisões judiciais. Durante esse tempo, os juros e a correção continuaram sendo aplicados. Ou seja, mesmo sem novos empréstimos, a conta só foi aumentando.

Em vez de buscar uma saída coletiva e equilibrada, a gestão estadual apostou no Regime de Recuperação Fiscal (RRF), uma proposta que previa a privatização de empresas estratégicas, congelamento de salários e restrição de investimentos públicos por décadas.

Essa proposta foi amplamente rechaçada pela sociedade civil, por sindicatos, movimentos sociais e pelo bloco de oposição ao governo na Assembleia de Minas. Apesar da resistência e sem o aval da ALMG, Zema conseguiu autorização para aderir ao RRF por meio de um acordo com a União, homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em agosto de 2024. Ainda assim, a busca por uma solução mais justa e viável se manteve constante. 

Foi a partir desse cenário que nasceu o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), uma construção política que envolveu debates no Congresso Nacional, articulação entre bancadas estaduais e federais, e diálogo com o governo federal. O objetivo foi criar uma alternativa ao RRF, que permitisse a renegociação da dívida com a União sem privatizações nem cortes de direitos, respeitando a autonomia dos Estados e o papel do serviço público.

O texto final do Propag foi sancionado em janeiro de 2025 pelo presidente Lula. A adesão ao projeto indica uma alternativa concreta às propostas de privatização de companhias públicas, por meio do repasse de ativos à União — ou seja, a federalização. Para isso, Minas precisa reunir cerca de R$ 40 bilhões em ativos públicos, o equivalente a 20% da dívida total.

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Antes mesmo da aprovação do projeto de lei que autoriza a adesão ao Propag e a saída do RRF, o governador Zema já havia enviado à ALMG a lista de bens públicos que deseja oferecer à União. E aqui entra um ponto importante: se esses bens não forem aceitos pela União, eles poderão ser vendidos com desconto progressivo. Ou seja, quanto mais tempo demorarem a ser vendidos, maior será o abatimento em seus valores. Na prática, isso pode significar perdas enormes para o Estado, que se verá obrigado a entregar parte do seu patrimônio por valores muito abaixo do que realmente valem.

Mesmo com a adesão ao Propag já aprovada, a Assembleia Legislativa de Minas ainda tem um papel fundamental. Cada projeto que trata dos bens públicos indicados por Zema precisa passar pela análise e votação da ALMG. Isso significa que a Casa pode barrar propostas que representem prejuízo ao Estado ou ameaça ao interesse público. A Assembleia tem a responsabilidade de garantir que o Propag seja um caminho para a justiça fiscal e não uma desculpa para empurrar privatizações disfarçadas.

A dívida é real. Mas também é real a possibilidade de enfrentá-la com responsabilidade, sem abrir mão do que é do povo. Estamos diante de uma chance histórica de resolver um problema que se arrasta há anos e cabe a nós transformá-la em justiça social, desenvolvimento e respeito ao interesse público.

Dr. Jean Freire é médico e deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores (PT)

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Este é um artigo de opinião, a visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

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