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Sociólogo, Doutor em Ciência Política. Diretor da Democracia e Direitos Fundamentais. Conselheiro Instituto Novos Paradigmas e Brazil Office Alliance.

O Brics e a escalada da guerra

Reunião da Cúpula do Brics que ocorre no Rio de Janeiro, dias 6 e 7 de julho de 2025, sob a presidência do Brasil, está mais do que aquecida

Os países do Brics estão no centro das equações geopolíticas dos conflitos globais. Tanto as guerras da Rússia contra Ucrânia, a escalada colonialista de Israel contra a Palestina e, na sequência, a guerra de Israel contra o Irã, quanto as medidas tarifárias de Trump impactaram as relações internacionais. Esta reunião da Cúpula do Brics que ocorre no Rio de Janeiro, dias 6 e 7 de julho de 2025, sob a presidência do Brasil, está mais do que aquecida.

A reunião anterior, de 2024 em Kazan, foi marcada pela tensão sofrida pela Rússia em função dos países da União Europeia, Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e Estados Unidos agirem fortemente para isolá-la, comercialmente e politicamente. A resposta da liderança associada entre Rússia e China foi imediata, com o ingresso formal no Brics de outros Estados, como Emirados Árabes Unidos, Egito, Arábia Saudita, Etiópia e Irã, além da aceitação de um grande e relevante número de países na condição de parceiros do bloco.

Este foi um movimento muito ousado no tabuleiro internacional, inclusive no interior do bloco original do Brics. A despeito das posições mais recuadas de Brasil, África do Sul e Índia, no que diz respeito a ampliação, o fato político foi consumado. Um ano depois, o bloco chega à Cúpula do Rio de Janeiro de 2025 com a ampliação de seus membros consolidada e irreversível.

Com o avanço dos governos reacionários a frente de países ocidentais, em especial dos Estados Unidos, o tema do multilateralismo toma novo sentido. Obviamente que o debate que cerca a crise do multilateralismo e o espaço para os países do Sul Global não está relacionado exclusivamente ao confronto entre ideias reacionárias e progressistas, uma vez que também no Sul Global e no próprio bloco Brics há governos reacionários. Mas a ideia da construção de um sistema e pactos de governança que garantam interesses dos países extra Otan passa por um aumento do peso econômico e político de polos alternativos aos Estados Unidos e à União Europeia. O Brics, com sua ampliação e com a presença de dois países beligerantes contra aliados da Otan, Rússia e Irã, joga um peso decisivo a partir de sua característica de contraposição ao Norte Global.

O grande desafio desta Cúpula do Brics é assumir uma posição revisionista no que diz respeito à ordem mundial. Para tanto, será importante uma posição assertiva no que diz respeito à guerra de tarifas de importação imposta pelo governo Trump. Também, por mais difícil engenharia diplomática que possa ser, que a Cúpula do Brics produza uma convocação para um cessar fogo e o estabelecimento de mesas de negociações nas guerras em curso e incida para que haja uma desaprovação global à invasão colonial de Israel sobre as terras palestinas, como a iniciativa do governo Sul-Africano já sinalizou.

A ideia de uma nova multipolaridade onde o Sul Global tenha voz passa por uma impugnação explícita ao atual sistema de governança global onde uma única potência nuclear é capaz de determinar as relações globais e não houve os questionamentos à sua ordem colonialista e belicista. Temas como o combate à pobreza, equilíbrio ambiental, liberdade de imigração, direitos fundamentais, igualdade de gênero e respeito étnico não vão surgir exclusivamente a partir das articulações no interior do Brics, contudo uma ação afirmativa de questionamento do atual sistema de governança é uma expectativa plausível para uma articulação de Estados que passam na periferia da Otan, em que pese seu poder econômico e militar.

Esta reunião do Brics é decisiva para que se possa sinalizar que há um polo de aglutinação geopolítica alternativo ao bloco Estados Unidos/Otan e que o tema da multipolaridade possa presidir a agenda das relações internacionais como forma de obstruir o crescimento da beligerância, do neocolonialismo e do aumento da pobreza.

*Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

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