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Engenheiro Agronômo, MsC em Economia Rural, Dr. em Engenharia de Produção. Extensionista rural aposentado, fotógrafo. Colaborador da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, membro co...ver mais

Ineditismo e a audácia de bolsonaristas no Congresso justificam preocupações redobradas

Avança no Brasil uma tentativa de expansão do medo e da ignorância que permita a sustentação de criminosos em posições de poder

Há tempos firmei a convicção de que toda homogeneização é degradante. O argumento original era simples e óbvio: a diversidade agrega tons, perspectivas, qualidades e valores que, no conjunto, estendem os limites que podem ser alcançados por qualquer tipo de singularidade. E o caminho inverso sempre é degradante e leva à miséria, em seu sentido mais amplo. De fato, a homogeneidade carrega uma noção de pequenez associada a pressões antinaturais que se comparam a uma espécie de ódio negacionista contra processos de diferenciação evolutiva. Neste sentido a busca de homogeneidade costuma se apoiar em forças externas das quais se torna dependente, e que acabam assumindo o controle, ampliando rastros em níveis de degradação cada vez mais abrangentes. O avanço da monocultura de soja destruindo ecossistemas, abrindo mercados para o domínio de transnacionais detentoras de agrotóxicos e sementes transgênicas, formando bancadas legislativas comprometidas com a destruição de legislações protetivas ao ambiente e favoráveis ao genocídio de povos indígenas, exemplifica aquele conceito. A homogeneidade é estruturalmente pobre, e corrosiva, na medida em que descarta, a priori, a possibilidade de respeito à existência de outras perspectivas e outros valores. Negando a importância de uma lógica mais ampla, de aprendizado, trocas e complementariedades em relação ao que lhe é divergente, a homogeneização é degradante.

Além disso, no rumo oposto, a diversidade é criativa. Ela produz o surgimento de relações de sinergia positiva, e as qualifica. Promove o desenvolvimento em um sentido mais amplo na medida em que, ao reconstruir percepções da realidade, abre caminhos para existências inusitadas, para experimentações que desafiam a geração de qualidades emergentes. É assim na natureza. A partir de um primeiro organismo e de sua multiplicação diferenciada ao longo da árvore de vida que une todos os reinos, chegamos ao equilíbrio da biosfera. Foi aquele metabolismo integrado de todos os biomas, com a multiplicidade de seres inerentes a cada um deles, que formou este paraíso onde a regra básica afirma não existirem lados em disputa pela homogeneidade, que o todo é maior do que a soma das partes e que os limites se estendem com o respeito à diversidade e suas conexões.

O aquecimento global, as tragédias ambientais e as crises socioeconômicas que nos afetam decorrem da negação daquela premissa: a homogeneidade é degradante. E isso nunca foi tão óbvio como nos dias de hoje

Vejam que não há padronização possível, para pessoas como Lula e Donald Trump. Ao mesmo tempo as diferenças entre eles apontam caminhos para melhorias coletivas, que se relacionam ao leque de parcerias e articulações positivas que o comportamento de cada um deles oferece. Um propõem o múltiplo, outro propõem a “sua” singularidade. Não é surpreendente que aquelas pessoas que acreditam ser possível cobrir o Brasil com lavouras de soja também aceitem a noção de que possa haver um imperador do mundo, e que isso lhes pareça conveniente. Também não é estranho que esta homogeneidade na miopia leve à aproximação de indivíduos que compartilham outros fundamentos tão antisociais como o racismo, o machismo, o desrespeito e o ódio em relação a tudo que não alcançam compreender.

Trump, agora ameaçando a Índia com tarifas de 50% e anunciando aquelas represálias a Alexandre de Moraes está declarando que não dá a mínima para o que possam pensar, sentir ou pretender os diferentes povos e suas culturas em relação a si, a seus territórios ou quanto ao futuro do planeta.

E as semelhanças daquele procedimento com as atitudes de Benjamin Netanyahu, afirmando não haver fome em Gaza, ou de Bolsonaro e seus capangas, também não deixam dúvidas: todos rejeitam a possibilidade de existência para pensamentos ou atitudes que possam se opor a seus interesses. Trata-se de uma espécie de desejo de impor a si mesmos, como modelo de uma espécie campeã destinada a dominar e submeter tudo que possam alcançar. Uma doença tão perigosa quanto contagiosa, que se coloca a serviço de interesses destrutivos. Isto se relaciona a posturas explicitadas no desejo de metralhar  petistas, no enaltecimento de torturadores, no deboche dos sufocados pela covid-19, nas negociatas relacionadas às vacinas e à cloroquina, na tentativa de roubo de patrimônios nacionais, na compra de imóveis em dinheiro para além das possibilidades relacionadas à renda, no patrocínio de articulações contra o Brasil e no empoderamento de indivíduos assemelhados àqueles moldes, naturalizando o bolsonarismo como algo pior e bem maior do que o inominável e seus descendentes. Em dimensão mais ampla este câncer se articula ao “milleismo”, ao “netaneyahismo” e a outras metástases emergentes sob um guarda chuva trumpista que busca a homogeneização do caos neste mundo multidiverso.

No nosso ambiente os resultados desta intencionalidade buscam afundar a cultura e o inconsciente coletivo  nacionais naquele “pântano institucional” do qual, como bem alertou Gilmar Mendes em sua mais recente manifestação de solidariedade ao Alexandre de Moraes, nos livramos graças à coragem daquele ministro. Esperamos que sim, mas não há segurança em relação a isso.

Afinal, o ineditismo e a audácia dos bolsonaristas, esta semana, no Congresso Nacional, justificam preocupações redobradas e devem ser examinadas levando em consideração este fato: avança no Brasil uma tentativa de expansão do medo e da ignorância que tendem a permitir a sustentação de criminosos em posições de poder. Eles pretendem eliminar possibilidades de articulação entre valores coordenados pelo respeito à diversidade, para consecução de objetivos comuns. Querem o fim da soberania e da democracia representativa, querem o império de seus interesses e a validação de suas mistificações da realidade.

Isto se faz evidente na homogeneização dos discursos e na estética pobre que associa o compartilhamento de esparadrapos com a repetição de mentiras. Os bolsonaristas mal voltaram das férias e trataram de bloquear as atividades do congresso maquiando seus pedidos com frases politicamente corretas. Pedem “Anistia Ampla Geral e Irrestrita” para (novamente) ocultar crimes e beneficiar a si e aos seus. Pedem o fim do Foro Privilegiado, para que não venham a ser julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Sabem dos desvios de verbas, da corrupção e dos crimes que cometeram, dos quais serão acusados com a evolução das investigações sobre a tentativa de golpe de estado. Pretendem que, uma vez desmascarados, venham a ser avaliados por juízes de primeira instancia, de forma a que possam ganhar tempo ou talvez contar com apoio de alguns como aqueles que se notabilizaram durante a Lava a Jato.

E, naturalmente, pedem a cassação de Alexandre de Moraes. Depois pedirão a do Flavio Dino, e assim prosseguirão até que não sobrem julgadores com coragem no STF. Eles temem e odeiam a coragem, porque sabem que ela é contagiosa.

Confiam que a covardia também é contagiosa e para isso atiçam o Trump contra o Brasil, ao mesmo tempo em que ameaçam bloquear avanços nacionais em favor da democracia, da inclusão e da diversidade. O impedimento dos trabalhos no Congresso se destina a acender a fogueira do caos, cancelando a renegociação de dívidas dos estados e a aprovação da isenção de impostos para aqueles com rendas inferiores a R$ 5 mil/mês.

E é neste ponto em que estamos: as diferenças entre Lula e Trump, entre os golpistas/entreguistas/vendilhões da pátria, e nós, são positivas e devem ser reafirmadas.

Não podemos recuar, nem amarelar, nem fazer vista grossa ao que está em jogo. A covardia, a canalhice e as artimanhas deles precisam ser enfrentadas com a convicção que não há nada pior do que aqueles doentes empoderados, que em suas falas e gestos que não escondem o ódio à diversidade, às sinergias e ao tratamento respeitoso exigido pelos que querem viver em um ambiente de solidariedade.

O ódio, deles, é um sentimento que não tem cura, que não se aplaca, que deve ser afastado de nós.

Música É, de Gonzaguinha.

Lembrete: É fundamental que em 2026 os senadores eleitos nos respeitem e mereçam nosso respeito. Fora golpistas! Sem anistia aos traidores, sem tolerância com os vendilhões da pátria.

*Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato.

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