Por circunstâncias inesperadas da vida, estou aproveitando o veranico de maio de 2025 com a família na terrinha, Santa Emília, Venâncio Aires, interior do interior do Rio Grande do Sul.
O veranico sempre acontece em maio, depois do verão, no meio do outono, e depois de um abril com suas tradicionais turbulências, nublado e com chuva, como aconteceu na tragédia de 2024, e antes da chegada do inverno de muito frio, chuva, geadas e até neve em alguns lugares.
O veranico: duas a três semanas no mês de maio, com bastante sol, temperaturas chegando aos 30 graus, e muita luz dia e noite. Era, em priscas eras, final dos anos 1950, início dos 1960, o momento de colher a soja na roça da família. Juntava-se toda a família, com apoio de parentes e vizinhos, mobilizavam-se as carroças puxadas por bois. Tudo, naqueles tempos, era feito a mão, no braço: cortar os pés de soja com foices, a facão, ou mesmo arrancar os pés à mão. Colhiam-se cerca de 350 sacos de soja na roça da família, transportados nas carroças para os galpões de madeira, até a chegada dos caminhões e a sua venda. A soja era então a principal renda da família, que garantia a comida, o pagamento dos Seminários dos filhos e seus estudos. Se a colheita não fosse feita nesse período de sol, perdia-se toda a colheita. Ou seja, trabalho de manhã, de tarde, às vezes até de noite e madrugada, se houvesse anúncio ou risco da chuva chegar mais cedo.
Um tempo, portanto e no entanto, abençoado pelo sol, pela colheita, pela reunião solidária da família em torno de um objetivo comum, os estudos dos filhos, a boa comida, a sobrevivência em comunidade.
Assim, de alguma forma, está sendo o veranico de maio de 2025, apesar de todas as dores e turbulências pessoais: muito sol, lua reluzente, calor gostoso em Santa Emília. Estou sentado na cadeira de balanço de mais de 100 anos, lugar permanente e diário de vovó Gertrudes. Olho à esquerda, para o potreiro do vizinho. Vejo bois, vacas, terneiros pastando. Olho à direita, para o matinho de árvores centenárias ao lado de casa, onde, naqueles tempos sem água encanada, existia o poço da família, que garantia a boa água todos os dias. Crianças, fazíamos piqueniques no matinho. Era uma festa: comer fora de casa, mesmo a 50 metros de casa, brincar debaixo das taquareiras, dos pinheiros e outras árvores enormes. Hoje, no veranico de 2025, refaço meus passeios no matinho, pegando bergamotas e laranjas direto dos pés ao redor, uma doçura!
Em outros sentidos e olhares, como está o veranico de maio de 2025, quando o mundo perdeu FRANCISCUS e Pepe Mujica?
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, líder mundial, marcou presença na lembrança dos 80 anos da derrota do nazismo. O Papa Leão XIV fala das´Coisas Novas´, à luz da Encíclica RERUM NOVARUM de Leão XIII de 1891, quando o capitalismo estava em plena ascensão. “Não queremos outro império, mas um sistema mais justo”, diz Dilma Rousseff sobre os BRICS. “Presidenta do NDB destaca o papel dos Brics na construção de um projeto multipolar onde o Sul Global tem vez e poder de ação” (Carla Castanho, GGN, 20.05.25).
A COP 30, por acontecer no segundo semestre em Belém, Pará, está em preparação, com mobilização de toda a sociedade e a esperada presença de líderes de todo mundo. A crise ambiental está presente todos os dias na vida e na casa das pessoas, famílias e comunidades. O cuidado com a Casa Comum é decisivo para um futuro com esperança.
As políticas públicas com participação popular, com os FPS, Fóruns de Participação Social, com a PNEPS-SUS, Política Nacional de Educação Popular em Saúde, e o AgPopSUS estão em construção por todo Brasil, buscando envolver os movimentos sociais e populares, as Pastorais, o movimento sindical, as ONGS. Dezenas de milhares de agentes comunitários e populares de saúde estão sendo mobilizados. Está em fase final a atualização do Marco de Referência da Educação Popular para as Políticas Públicas, cuja primeira versão foi feita e tornada oficial pelo então ministro Gilberto Carvalho em 2014. Ecosol, Economia Popular e Solidária, está em ampliação, com centenas de militantes espalhados pelo Brasil a partir de projetos da Senaes, Secretaria Nacional de Economia Solidária. O Movimento Fé e Política, as Escolas de Fé e Política fazem formação e mobilizam lutadoras e lutadores, sonhadoras e sonhadores no Rio Grande do Sul e no Brasil. O Camp, Centro de Assessoria Multiprofissional, prepara um Curso de Formação para lideranças e militantes e a retomada do Café com Debates. O CEAAL, Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe, do qual Paulo Freire foi o primeiro presidente, prepara para agosto sua Assembleia latino-americana e caribenha, antecedida de uma reunião geral do CEAAL Brasil. As Cozinhas Comunitárias e Solidárias nas periferias, com os PPSSAN, Pontos Populares de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, seguem atuando contra a fome e fazendo diariamente a Formação na Ação. Agir e formar, formar e agir. A comunicação popular, com o Brasil de Fato RS, o Sul21 e outros muitos instrumentos de formação e comunicação, está presente e atuante.
A mobilização da sociedade está em crescimento com a realização de Conferências, o retorno dos Conselhos de Participação Popular e a preparação de um Plebiscito Popular.
É preciso estender e alargar o veranico de maio para o resto do ano de 2025, para os próximos anos, para a vida toda, no cuidado com a Casa Comum, na garantia da paz e da democracia. O veranico de maio é ESPERANÇAR.
*Este é um artigo de opinião e não representa necessariamente a linha editorial do Brasil do Fato.