No último dia 1º de julho, iniciou-se o Plebiscito Popular 2025, uma mobilização nacional que questiona diretamente essa lógica exploratória. A pergunta é direta: Você é a favor da redução da jornada de trabalho sem redução salarial e do fim da escala 6×1?. A campanha, que já movimenta as redes com a hashtags como #CongressoInimigoDoPovo, busca recolocar na pauta temas urgentes para a classe trabalhadora brasileira.
Organizado por sindicatos, movimentos sociais, coletivos de juventude, partidos e entidades religiosas, o plebiscito é um instrumento de participação popular que propõe ouvir o povo sobre temas que os governantes se recusam a debater com seriedade. Além da jornada de trabalho, o plebiscito também aborda a necessidade de uma reforma tributária justa que tribute os super-ricos para aliviar quem vive com até R$ 5 mil mensais. Mais do que consulta,
é uma prática de educação popular e fortalecimento da democracia direta.
Mas afinal, o que está em jogo quando falamos em escala 6×1?
Hoje, a legislação brasileira permite até 44 horas semanais, com direito a um dia de descanso. Isso dá margem para jornadas de seis dias consecutivos de trabalho com apenas um único dia de folga, o famoso 6×1. Essa prática, embora naturalizada, representa uma das formas mais cruéis de organização do tempo: sufoca a vida, engole o lazer, sabota a saúde física e mental.
E a jornada não termina no local de trabalho. Especialmente para as mulheres, que acumulam o trabalho doméstico e de cuidados não remunerado, como cozinhar, limpar, cuidar de filhos e familiares, a carga é ainda mais pesada. Elas trabalham, em média, 7,5 horas a mais por semana do que os homens. O tempo para descansar, viver e sonhar simplesmente desaparece.
A lógica por trás da escala 6×1 é a mesma que leva ao karoshi. No Japão, onde o termo se consolidou como diagnóstico social, estima-se que milhares de trabalhadores morram por exaustão a cada ano. São infartos, AVCs, colapsos físicos e psíquicos diretamente relacionados à sobrecarga laboral. O mais alarmante: 63,7% das vítimas têm entre 30 e 59 anos, ou seja, estão em plena vida produtiva.
Mesmo com uma legislação que estipula 40 horas semanais, o Japão permite até 45 horas extras por mês. Essa flexibilidade, aliada a uma cultura de hiperprodutividade, empurrou milhares para jornadas acima de 80 horas extras mensais, situação que levou o governo a adotar limites mais rígidos nos últimos anos. Aqui no Brasil, a situação não é muito diferente, ainda que mascarada. Horas extras não pagas, múltiplos vínculos precários, jornadas intermitentes e metas inalcançáveis levam muitos trabalhadores ao esgotamento total, condição agora reconhecida como Síndrome de Burnout, uma doença ocupacional.
O karoshi é um nome estrangeiro, mas sua lógica é bem conhecida por aqui. A ideia de que o trabalhador deve estar sempre disponível, sacrificando seu bem-estar em nome da produtividade, está profundamente enraizada nas relações de trabalho no Brasil. E a escala 6×1 é sua tradução mais direta.
É por isso que o debate promovido pelo Plebiscito Popular 2025 é tão necessário. Reduzir a jornada de trabalho sem reduzir salários é uma pauta de saúde pública, de justiça social e de humanidade. Não podemos continuar naturalizando a exaustão como parte do trabalho. É preciso dizer: o tempo de viver não pode ser luxo. É direito.
*Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.