Com o objetivo de ampliar a extração de petróleo no Brasil, aconteceu nesta semana o que ficou conhecido como “leilão do juízo final”, promovido pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), que vendeu 19 blocos de áreas destinadas à exploração na região da Foz do Rio Amazonas. 10 foram arrematados pela Petrobrás, em consórcio com a Exxonmobil. Ao todo, o governo federal havia ofertado 172 blocos.
O processo movimentou cerca de R$ 844 milhões e foi muito criticado por ambientalistas e outros especialistas. Agora, começará a fase de pedidos de licenciamento ambiental, mas, de certa forma, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) já deu sinal verde.
Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidenta do Ibama, avalia que a ação foi equivocada, do ponto de vista ambiental, mas também econômico.
“A opção pelo aumento da exploração de petróleo no país, em plena crise climática, é uma furada terrível em termos de proteção ambiental. Temos outras opções de como ganhar dinheiro e gerar renda, até mesmo porque o petróleo offshore gera dinheiro, mas não gera justiça social”, defende, em entrevista ao Conversa Bem Viver.
Araújo destaca ainda que as especificidades da região da Foz do Rio Amazonas merecem atenção e que os impactos da intensificação da exploração de petróleo na área podem ser imensuráveis.
“É uma área sensível, com correntes fortíssimas, muito perto do grande sistema recifal amazônico. Um acidente ali pode afetar o sistema recifal e levaria o óleo em menos de meio dia para águas principalmente da Guiana Francesa”, explica.
Diante do atual contexto de emergência climática e, em pouco mais de um ano desde a última enchente, a situação alarmante na qual se encontra novamente o Rio Grande do Sul, a ex-presidenta do Ibama também chama a atenção para a necessidade de o país se preparar para eventos extremos cada vez mais frequentes e intensos.
“Temos que preparar os territórios com medidas de adaptação à mudança do clima, nas cidades e nas áreas rurais. O Rio Grande do Sul, no ano passado, na grande enchente, perdeu solo na área rural. Tem áreas em que eles não vão conseguir plantar tão cedo”, enfatiza Araújo.
Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato – Qual é a sua avaliação sobre esse processo? O governo ganhou ou perdeu com o leilão? Quais são as principais preocupações ambientais?
Suely Araújo – No leilão havia 172 blocos ofertados, mas o governo conseguiu arrematar 34. Isso representa 20% da oferta. Deu tudo errado para o governo.
Eles colocaram em oferta, por exemplo, blocos na bacia potiguar, que também faz parte da margem equatorial e o mercado não se interessou. Eles tinham ofertado blocos perto de Fernando de Noronha. Ali há uma continuidade ecológica enorme, com uma cadeia de monte submarino cheia de peixe e uma alta biodiversidade. Eles tentaram no leilão de 2023 e agora, mas o mercado não se interessou. Para mim, foi um bom sinal.
Essa área da região conectada com Noronha está judicializada. Então eu acho que o mercado deu um sinal de “olha, nessa área não dá”. O próprio Ministério do Meio Ambiente tinha pedido para retirar todos os blocos que estavam na oferta e que integravam a bacia potiguar, mas a Agência Nacional do Petróleo (ANP) se recusou.
Do ponto de vista de proteção ambiental, ali deu certo. Mas, na bacia sedimentar da Foz do Amazonas, nós tínhamos 47 em oferta, foram arrematados 19 e a Petrobras está na aquisição de 10.
Para mim, há um recado bem claro de que a Petrobras escolheu a bacia sedimentar da Foz do Amazonas como área prioritária para expansão de suas atividades, porque 10 é bastante.
Na prática, com a liberação que o Ibama fez do teste pré-operacional para ver se a Petrobras tem capacidade de resposta para eventuais acidentes, que deve ocorrer em julho, isso significa, provavelmente, uma licença até o final de agosto. Porque vai ficar estranho o Ibama liberar esse tipo de teste e depois voltar atrás e começar a exigir mais medidas.
Quando o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, deferiu a vistoria no centro de animais e a realização do teste pela Petrobras, ele até colocou um alerta de que continua achando importante a realização de avaliação ambiental de área sedimentar na região. Eu, sinceramente, se continuasse achando importante a realização de avaliação ambiental de área sedimentar, rejeitaria a licença. Para mim, não tem lógica.
Eu defendo que em toda a região da bacia sedimentar da Foz e nas demais bacias sedimentares da margem equatorial, o país deveria realizar avaliação ambiental de área sedimentar, assim como na bacia de Pelotas, que é uma nova área de expansão. A própria Petrobras tem interesse, desde o leilão de 2023, em Pelotas.
Em resumo, o leilão certamente ficou bem aquém da expectativa do governo, principalmente para quem estava falando que estava precisando desse dinheiro para resolver as contas em relação às decisões recentes sobre impostos.
O Congresso não está gostando muito de medidas da área econômica e o governo está atrás do dinheiro. O dinheiro do petróleo aparece sempre como alternativa. Então, acho que o governo não deve estar satisfeito com o que conseguiu no leilão.
Acho também que a gente tem que tomar muito cuidado com o futuro da bacia sedimentar da Foz do Amazonas, que é uma área sensível, com correntes fortíssimas, muito perto do grande sistema recifal amazônico. Um acidente ali pode afetar o sistema recifal e levaria o óleo em menos de meio dia para águas principalmente da Guiana Francesa.
São condições muito muito particulares que dificultam tudo na região. A Petrobras não está acostumada a lidar com correntes tão fortes. A região tem características que nos levam a ter que tomar muito cuidado. Nós deveríamos ter muita atenção para valorizar essa área e, provavelmente, deveria ser uma área de exclusão de petróleo. Esse seria o caminho certo.
O leilão não foi bom para o governo, mas também não foi bom quando a gente olha a questão da bacia sedimentar da Foz do Amazonas, porque eles querem encher aquilo de blocos de petróleo, de plataformas. Em alguma perspectiva, todo mundo saiu perdendo então nesse leilão.
Ninguém desembolsa milhões de reais por um bloco desses sem intenção de explorar o petróleo. Então, é provável que, num futuro breve, venham os pedidos de licenciamento ambiental. Se o Ibama liberar os pedidos da Petrobrás, abrirá precedentes para ter que liberar outros?
Quando o Ibama liberar o 59, na mesma região, sob as mesmas condições, vai ficar muito complicado negar outros pedidos. Talvez, um impacto que possa ocorrer e não é improvável é que, na hora que eles fizerem a perfuração no bloco 59, dê vazio. O petróleo lá embaixo não é um “lagão” de óleo. Ele fica incrustado nas rochas. E, às vezes, você tem num bloco e não tem num próximo.
É sempre uma atividade de risco. A Guiana, que hoje é tida como exemplo que nós deveríamos copiar e que está explorando um monte de petróleo, antes de conseguir achar, perfurou cerca de 40 vezes. Não é tão simples a exploração de petróleo e pode ser que não haja petróleo no bloco 59. Ou, se houver petróleo, que ele não esteja em condições de, no futuro, gerar produção. Você tem que mensurar o volume, nem todo óleo que você acha serve para a produção.
Em relação às outras bacias que receberam ofertas e foram levadas por outras empresas, há o mesmo nível de preocupação que se tem com a Foz do Rio Amazonas?
Hoje, o mais preocupante realmente é a intensidade de exploração que eles pretendem dar à bacia da Foz. A bacia de Pelotas, por exemplo, é uma área que também deveria ser olhada com cuidado e fazer a avaliação ambiental de área sedimentada. O governo precisa parar de enrolar, porque quem faz a avaliação ambiental de área sedimentada é o Ministério das Minas e Energia, em conjunto com o Ministério do Meio Ambiente, e não as petroleiras.
O governo poderia, pelo menos em Pelotas, que é uma nova fronteira exploratória e as expectativas de volume de petróleo são maiores até do que da margem equatorial, aproveitar que está no início e fazer direito. Porque se eles fizessem a avaliação ambiental de área sedimentada em novas fronteiras exploratórias, delimitaria as partes daquela bacia que são aptas para produção e excluiria as partes que não são aptas. Se quer explorar petróleo, tem que fazer direito.
Eu acho que a opção pelo aumento da exploração de petróleo no país, em plena crise climática, é uma furada terrível, um erro muito grande em termos de proteção ambiental.
Metade do petróleo que o Brasil produz vai para a exportação. O Brasil já é um grande produtor, é o oitavo maior do mundo. A gente produz 3.400.000 barris por dia. Ano passado, o petróleo deu mais dinheiro do que a soja na exportação. Já somos grandes produtores e não temos porque ampliar em plena crise climática.
Temos outras opções de como ganhar dinheiro e gerar renda, até mesmo porque o petróleo offshore gera dinheiro, mas não gera justiça social. A gente produz há muito tempo e sabe que a mudança de padrão de vida da população carente não ocorre com o petróleo.
Quem ganha dinheiro são os investidores. Entra dinheiro para o governo, que, muitas vezes, faz isso como caixa. O próprio Tribunal de Contas da União (TCU) tem um relatório recente falando que o governo tem que aplicar direito os recursos da renda petroleira, dar a destinação social e não fazer contabilidade.
A Agência Internacional de Energia fala ainda que a demanda de petróleo vai começar a cair em 2030. Isso significa que a gente pode estar apostando numa canoa furada, porque pode cair o valor do petróleo no mercado internacional. E quem está falando não é o Greenpeace é a Agência Internacional de Energia.
Ou seja, inclusive do ponto de vista econômico, pode realmente ser uma péssima opção.
Por falar em emergência climática, há no Rio Grande do Sul, mais uma vez, pelo menos 50 municípios em sinal de alerta por risco de alagamentos, deslizamentos, etc. Você acha que a situação é semelhante à do ano passado?
É difícil afirmar, mas o sul do Brasil é apontado nos estudos como uma região que, na crise climática, ia ficar suscetível a eventos ligados à questão hídrica, como enchentes. Ao mesmo tempo, o Rio Grande do Sul tem períodos de seca e estiagem.
É uma região altamente suscetível aos efeitos de eventos extremos e a crise climática é uma realidade. O mundo mudou. A gente tem que “se acostumar” com eventos extremos cada vez mais frequentes e intensos. Precisamos nos preparar para isso, esforçando para reduzir as emissões de gás de efeito estufa.
Em 2024, nós tivemos o ano mais quente já registrado na história e está subindo. Nós ficamos com 1.55 °C acima dos níveis pré-industriais e isso quer dizer que nós ultrapassamos o limite máximo que o Acordo de Paris estabelece. Não só não conseguimos cumprir o que está no Acordo de Paris, como já temos que reduzir a temperatura e não está sendo nada fácil.
Temos que preparar os territórios com medidas de adaptação à mudança do clima, nas cidades e nas áreas rurais. O Rio Grande do Sul, no ano passado, na grande enchente, perdeu solo na área rural. Tem áreas em que eles não vão conseguir plantar tão cedo.
A água levou o solo e é um estado com uma agricultura forte. Então, é preciso, no caso do Rio Grande do Sul, um grande programa de recuperação da vegetação nativa. Também é um estado historicamente marcado pelo desmatamento e eles vão ter que dar um jeito de melhorar isso. Mesmo que não sejam as formações florestais originais, qualquer vegetação nativa dá um mais resiliência em casos como esse de eventos com chuva e enchentes.
Tem outras medidas que têm que ser tomadas, mas realmente o Rio Grande do Sul tem que olhar com carinho para uma grande aposta na recuperação da vegetação no estado inteiro para poder sobreviver, porque virão outros problemas. E agir com medidas de mitigação e adaptação o tempo todo, com política climática na veia.
Conversa Bem Viver
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