Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) avançam nos estudos sobre a possibilidade de utilização das toxinas produzidas por escorpiões no combate às células cancerígenas, em especial as que causam o câncer de mama, uma das doenças que mais mata mulheres ao redor do mundo.
A pesquisa vem sendo desenvolvida por Mouzarllem Barros, biomédico e doutor em imunologia, Karla de Castro Figueiredo, doutora em toxicologia e mestre em ciências farmacêuticas, e Eliane Candiani Arantes, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP de Ribeirão Preto.
Eles fazem parte do Centro de Ciência Translacional e Desenvolvimento de Biofármacos (CTS), cujo diretor é o doutor Benedito Barraviera. A pesquisa é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e vem chamando atenção internacionalmente pela sua importância.
“Todos os medicamentos que existem em uma farmácia, sem exceção, começam com a pesquisa científica. É essa pesquisa básica que, a passos lentos, vai se aperfeiçoando”, destaca Barros, em entrevista ao Conversa Bem Viver.
Além da possibilidade de produzir um medicamento que pode salvar milhares de vidas, o estudo também é relevante por evidenciar a grande biodiversidade existente em território brasileiro.
“52% da fauna de escorpiões do Brasil está concentrada na região Norte. Só no estado do Amazonas, são 28 espécies do gênero Tityus. Ou seja, existem muitos escorpiões para estudarmos, desvendarmos e aprofundarmos”, destaca Figueiredo.
Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato – Quais são as particularidades da pesquisa e quais foram as principais instituições envolvidas nesse estudo?
Karla de Castro Figueiredo – Essa história começou em meados de 2017, quando o biólogo Jonas Martins, de Manaus, entrou em contato com a professora Eliane, que sempre estudou venenos de escorpiões, oferecendo peçonha para estudos. Ele queria aprofundar os estudos com os escorpiões da região amazônica. Era o próprio Jonas quem fazia as extrações da peçonha, junto com o orientador dele, o professor Rud Procópio, da Universidade Estadual do Amazonas.
Todos são muito apaixonados pela ciência e a gente abraçou essa causa. Depois disso, em 2019, veio uma aluna de iniciação científica me procurar e eu fui orientadora dela, com todo o apoio estrutural e científico da professora Eliane no laboratório. Então, começamos a fazer alguns ensaios.
Depois, veio o pós-doc do Mouzarllem. Nós já temos outras duas pós-doutorandas, e estamos trabalhando na purificação, isolamento e caracterização dessas moléculas.
O estudo do Mouzarllem, primeiramente, testou a peçonha completa do escorpião em algumas células, em algumas linhagens tumorais de câncer de mama. Vimos que isso produziu atividade. O teste foi com o veneno do Brotheas amazonicus, que não causa risco de acidente em humanos e não é perigoso para a saúde pública. Mas, em termos de biodiversidade, tem muitas moléculas promissoras.
No teste, o veneno deu atividade, matando algumas células tumorais. Daí, começamos também a tentar separar frações desse veneno para ver se conseguíamos pegar em determinadas moléculas, até que conseguimos isolar uma molécula que determinamos de Escorpini like peptídeo 1 desse veneno de escorpião.
Realmente, ainda são estudos iniciais, tanto que essa molécula foi citotóxica e matou as células normais também. Então, ainda temos que aprofundar nos estudos. Esses estudos são importantes porque chamam a atenção para a nossa biodiversidade.
52% da fauna de escorpiões do Brasil está concentrada na região Norte. Só no estado do Amazonas, são 28 espécies do gênero Tityus. Ou seja, existem muitos escorpiões para estudarmos, desvendarmos e aprofundarmos.
Por sua importância, a pesquisa tem sido reconhecida inclusive internacionalmente, tendo sido apresentada na Fapesp Week, na França. Quais resultados o estudo encontrou e quais são as expectativas futuras em relação ao combate ao câncer?
Mouzarllem Barros – É um tema muito relevante para trabalharmos e a primeira coisa que tem que ficar clara é que todos os medicamentos que existem em uma farmácia, sem exceção, começam com a pesquisa científica. É essa pesquisa básica que, a passos lentos, vai se aperfeiçoando. Absolutamente qualquer droga que a gente use para tratar qualquer doença começa neste bastidor, com esses resultados preliminares.
A pesquisa teve um financiamento muito bem amparado, especialmente pelo Estado de São Paulo, a partir da Fapesp, que é uma das grandes responsáveis pelo avanço científico no país, uma fundação muito ética e coesa que tenta ser o mais democrática possível na distribuição das verbas.
A Fapesp financia e ampara centros de pesquisa que combinam o avanço em algumas áreas específicas, como é o centro de ciência e desenvolvimento que a gente tem em parceria com a professora Eliane. O centro tem sede em Botucatu e busca promover a descoberta de moléculas provenientes de animais peçonhentos com potencial para aplicação em diversas doenças.
É sempre bom citar o exemplo do captopril, que é uma das drogas mais utilizadas no mundo como anti-hipertensivo e veio do veneno da serpente. É uma das várias drogas que veio do isolamento de peçonhas e é muito aplicada na prática.
O caminho da ciência é muito árduo. Até uma droga chegar à farmácia para você ir lá e comprar, ela passa por muito trabalho de base, da ciência básica. Descobrimos qual é a molécula, depois sintetizamos, depois testamos, e assim segue.
Então, dentro de uma escada evolutiva do processo de chegada ao medicamento, estamos no caminho certo. Leva tempo, mas o grande barato dessa descoberta é que, junto com outras descobertas que já foram feitas para outras doenças, conseguimos começar a abrir o campo de visão para o tratamento de uma doença que é antiga, a que mais mata mulheres no mundo, o câncer de mama.
O tratamento vem sendo feito com quimioterapia, radioterapia e recentemente a imunoterapia. Todas essas terapias são, muitas vezes, efetivas quando o câncer é descoberto no início, mas elas têm muito efeito colateral, porque também matam células que não são cancerígenas.
Então, o que a gente quer aperfeiçoar no estudo é tornar essa droga mais específica. Esse aperfeiçoamento é completamente possível, porque a USP é uma casa muito responsável pelo avanço científico do Brasil, junto com a Fapesp. Estamos numa rede em que o resultado disso ficará para a saúde pública e para o SUS.
Um dos requisitos que a Fapesp cobra, quando você pede fomento para realizar determinada pesquisa, é mostrar aplicabilidade disso para a população, dentro de um projeto de extensão universitário ou levando essa patente para o SUS.
São resultados iniciais muito promissores. Somos o país com maior biodiversidade do mundo e temos um sistema muito bem amparado, que é o sistema de proteção de patrimônio genético, que nos permite registrar essa espécie.
O governo tem o domínio sobre aquela espécie, porque ela é do nosso território. Então, esses estudos precisam de autorização e a gente faz isso de uma maneira sustentável. Os nossos colaboradores vão em expedições na Floresta Amazônica que demoram, às vezes, vários dias, porque os escorpiões têm hábito noturno. Eles têm que entrar na mata à noite com luz ultravioleta para procurar os escorpiões, juntar a quantidade necessária para extrair o veneno e depois devolver eles para a natureza, apesar de existirem também biotérios de criação para esse intuito, a exemplo do Instituto Butantan.
É uma organização que vem do amparo social e público e que, de alguma maneira, retorna para a sociedade. Mas esse retorno, às vezes, é lento. Eu sei que muitas pessoas veem as manchetes de jornais e ficam esperançosas, porque estão passando por aquela patologia. Então, é óbvio que o olho brilha e estamos aqui tentando fazer o trabalho acontecer de uma maneira ética, correta e segura para que o resultado chegue para quem precisa.
Há outras linhas de pesquisa promissoras relacionadas ao combate às doenças, especificamente ao câncer?
Eliane Candiani Arantes – Muito se fala em guerra, política e futebol, mas pouco se fala de ciência. E a gente faz um trabalho muito sério aqui na universidade. Para mim, é um prazer estar conduzindo esse processo. O nosso grupo faz parte do Centro de Ciência Translacional e Desenvolvimento de Biofármacos, o CTS, que fica em Botucatu. O diretor é o Dr. Benedito Barraviera. Eu sou a vice-diretora.
O centro envolve várias instituições de pesquisa do estado de São Paulo e todos eles com linhas de pesquisas voltadas para a saúde. São grupos muito capacitados trabalhando em conjunto.
Dentro da infraestrutura do CTS está quase em funcionamento uma fábrica de medicamentos que vai trabalhar com a qualidade para uso em humanos. Então, nós temos ali a possibilidade de fazer justamente essa translação da bancada para o medicamento. Essa fábrica vai conseguir produzir moléculas com qualidade para uso humano, para que essas moléculas virem realmente medicamentos e possam ir para as fases clínicas. Essa infraestrutura foi financiada pelo Ministério de Saúde, e outros vários financiadores. A Fapesp financia todos os projetos que o meu grupo desenvolve.
Atualmente, já estão em fase clínica 3 de testes em humanos dois produtos: o selante de fibrinas, usado para acelerar a cicatrização de feridas crônicas muito demoradas, e o antiveneno apílico, que é para uso em casos de várias picadas de abelha. São coisas já muito palpáveis que, logo, a população vai começar a ter acesso.
Com o selante de fibrina, o nosso grupo está trabalhando para fazer a expressão das moléculas para desenvolver um selante mais aprimorado. Estamos fazendo a expressão em heteróloga, em levedura, para que o produto possa ser produzido em escala industrial.
Em relação às peçonhas de escorpiões, temos também algumas toxinas que bloqueiam canais para potássio, que têm um grande potencial para tratamento de doenças autoimunes.
São coisas que já estão bem adiantadas. Estamos também trabalhando com um anticorpo monoclonal que estamos buscando dentro de uma biblioteca humana de anticorpos para ajudar no tratamento do envenenamento por serpente botrópica, que é aquela que causa lesão no tecido.
Dentro do CTS, há ainda a possibilidade agora de fazer uma biblioteca de lhamas, que produzem nanocorpos, e depois ampliar em fagos para o tratamento de câncer de mama também. Então, são coisas muito importantes que o centro está abraçando.
Vocês têm também uma biblioteca de fagos? O que isso significa?
Eliane Candiani Arantes – A gente imuniza a lhama com alguns antígenos. Por exemplo, se você quer um antígeno para um tipo de câncer ou vírus, uma das opções é imunizar com o vírus da Covid. Depois, você faz uma seleção dos anticorpos produzidos pela lhama feitos contra esse vírus. Aí, você seleciona e amplifica dentro dos fagos.
Então, você consegue produzir esses anticorpos em grandes quantidades e depois seleciona apenas a parte que liga o antígeno ou o anticorpo, cliva, e fica uma molécula pequena que pode ser viabilizada como medicamento.
Conversa Bem Viver
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