Sucesso de bilheteria, o filme Homem com H, com direção de Esmir Filho conta a trajetória pessoal e artística de Ney Matogrosso, considerado um dos maiores cantores da música popular brasileira. O longa retrata aspectos importantes da carreira do intérprete, como a constituição, o auge do sucesso e o fim da composição original do grupo Secos e Molhados.
Além de Ney, a formação clássica da banda contava com o cantor português João Ricardo e o músico e compositor Gerson Conrad, que, em entrevista ao Conversa Bem Viver, avaliou a produção cinematográfica e falou sobre momentos marcantes para o grupo musical.
“Eu acho que a parte mais emocionante do filme é exatamente o início, quando nós vamos até o Rio de Janeiro, eu e o João Ricardo e conhecemos o Ney pessoalmente. Eles fizeram um trabalho de pesquisa muito bem feito. As cenas retratam com realidade tudo o que nós vivemos naquele encontro”, avalia.
Conrad foi o responsável por compor a melodia de Rosa de Hiroshima, que, na voz de Ney Matogrosso, foi imortalizada pelo Secos e Molhados. A composição era originalmente um poema de Vinicius de Moraes e, até os dias de hoje, é acionada para ajudar na interpretação política dos contextos de guerra e violência.
“É uma música que se tornou, ao longo desses 50 anos, não só referência na voz do Ney, mas também o meu cartão de visita como compositor, que atravessou fronteiras, porque existem inúmeras gravações mundo afora dela. É uma composição que segue atual. Eu tenho assistido vários jornais de televisão sempre mencionando a música e contrastando com esse momento atual em que o mundo vive com guerras”, destaca Gérson Conrad.
Leia a entrevista completa:
Brasil de Fato – Como foi a sua reação ao ver o filme Homem com H logo que ele foi lançado nos cinemas?
Gerson Conrad – Eu gostei do filme, mas tenho uma crítica muito particular. Acho que o Esmir Filho, que foi o diretor responsável por colocar esse produto no mercado, exagerou nas cenas que exploram o lado “de sexo” do Ney.
Apesar de as cenas terem sido muito bem produzidas, com uma cara poética nas tomadas, eu acho que foi demasiado. Também acho que ele deixou de contar fatos relevantes, não só do início do Secos e Molhados, como também da trajetória solo do Ney. Ele perdeu essa oportunidade por explorar demais essas tomada sobre sexo explícito.
Eu não acho que isso tenha espantado as pessoas, me atenho muito ao fato de que ele poderia ter explorado muito mais histórias relevantes. As duas ou três primeiras cenas até são muito interessantes, porque são pertinentes ao desenrolar do filme e o Ney nunca escondeu esse lado dele, mas depois entra num looping infinito. Para você ter uma ideia, eu dei uma cochilada na terceira ou quarta cena porque me desinteressou totalmente.
O que mais te emocionou no filme?
Eu acho que a parte mais emocionante do filme é exatamente o início, quando nós vamos até o Rio de Janeiro, eu e o João Ricardo e conhecemos o Ney pessoalmente. Eles fizeram um trabalho de pesquisa muito bem feito. As cenas retratam com realidade tudo o que nós vivemos naquele encontro.
Uma coisa interessante foi que o Jeff Lyrio, que representa o meu personagem no filme, me escreveu perguntando se eu havia gostado e quais considerações eu faria. Eu parabenizei a todos, porque todos os atores são brilhantes.
Houve também cuidado com a produção do filme, porque, no que toca essa parte do Secos e Molhados, o que me chamou muito a atenção é que até as roupas pessoais que nós usávamos na época eles conseguiram reproduzir. Não estou me referindo às fantasias que nós usávamos, as roupas de shows, mas sim às roupas de uso pessoal.
Foge apenas um detalhe ou outro, como a cor da calça, por exemplo, que poderia ser um pouco mais clara. Tem uma cena em que estamos no estúdio e o João Ricardo usa uma blusa de lã amarela com uma um detalhe em preto. Era igualzinha à blusa dele original da época.
Isso me chamou muito a atenção, esse cuidado de produção, além da performance dos atores, que foi brilhante.
Me chamou muito a atenção o ator português que faz o personagem de João Ricardo, porque ele é um sósia de João Ricardo com aquela idade. Já o Jef Lyrio, parecia nas tomadas distantes, não nas tomadas próximas, porque ele, a não ser seu cabelo, lembrava muito pouco a minha figura. Mas nas tomadas de performance do grupo, em que a câmera está mais distante, ele conseguiu reproduzir. Foi fantástico e eu parabenizei também por isso.
Eu vi no Instagram uma cena de performance nossa e você tem dificuldade até de reconhecer qual é o Secos e Molhados original, porque os movimentos corporais são realmente muito próximos do que nós fazíamos.
A cena em que você e João Ricardo se encontram com Ney no Rio de Janeiro é uma das mais bonitas e poderosas do filme. Na ocasião, você apresentou a ele a música Rosa de Hiroshima, adaptação sua que marcou a trajetória do Secos e Molhados. Como foi esse processo?
50 anos depois, eu não me lembro com tantos detalhes como gostaria, mas acredito que essa foi uma das músicas que nós apresentamos. Ele ficou muito tocado quando ouviu Rosa de Hiroshima. Eu acho que o grande intérprete dessa obra é o Ney Matogrosso. Ao longo desses anos, várias pessoas regravaram, mas a interpretação do Ney é insuperável.
O processo de composição começou quando nós estávamos pesquisando autores nacionais, latino-americanos e também portugueses. Era um trabalho de pesquisa para musicar poemas desses autores que nós já vínhamos selecionando.
O João Ricardo, que era jornalista nessa época, chegou em uma tarde com um livreto chamado Antologia Poética, de Vinícius de Moraes, e falou: “olha, dá uma olhada nessa antologia para ver se tem alguma coisa interessante, porque eu estou lendo outros autores e não terei tempo para me dedicar a isso”. Eu cheguei com o livro em casa e atirei sobre a minha escrivaninha, no meu quarto. E o livro caiu aberto exatamente onde estava o poema Rosa de Hiroshima. Foi o primeiro poema que eu li de toda aquela antologia.
Eu me lembro que fui dormir com aquele poema gritando na minha cabeça, porque, de cara, percebi que se tratava de um tema universal, que retratava a catástrofe de Hiroshima com a bomba atômica. E nós tínhamos um trabalho muito politizado.
Esse era o principal direcionamento do Secos e Molhados, apesar de não ser partidário, tínhamos um trabalho de uma consciência muito politizada. E eu, quando percebi que aquele poema tratava de um tema politizado e que tinha um cunho universal, pensei: “nossa, isso aqui cabe dentro do repertório de Secos e Molhados”.
Fui dormir por volta de 23 horas com aquele poema na cabeça. Quando eram umas 3 horas da manhã, eu me lembro de ter acordado. Estava com o meu violão ao lado da minha cabeceira, o peguei e falei: “poxa, eu preciso compor uma melodia para esse poema”. Antes de tentar compor qualquer coisa, eu me fiz uma pergunta: “como será que 99% dos bons compositores retratariam melodicamente um poema que, por si só, já é muito forte?”.
Foi aí que eu tive a grande sacada de, em vez de fazer uma música que brigasse com o poema, fazer algo muito doce, muito melódico, quase que uma caixinha de música, delineando o poema de Vinícius de Moraes. E o resultado foi esse que nós conhecemos.
É uma música que se tornou, ao longo desses 50 anos, não só referência na voz do Ney, mas também o meu cartão de visita como compositor, que atravessou fronteiras, porque existem inúmeras gravações mundo afora dela.
É uma composição que segue atual. Eu tenho assistido vários jornais de televisão sempre mencionando a música e contrastando com esse momento atual em que o mundo vive com guerras.
Eu compus a melodia e, menos de duas semanas depois de nós decidirmos que a música estaria no nosso repertório de gravação, tive a oportunidade de estar pessoalmente com Vinícius de Moraes, apresentá-la para ele e pedir a autorização para que pudéssemos gravar.
E Vinícius foi um profeta, porque ele me interrompeu antes mesmo que eu acabasse de tocar música com os olhos cheios de lágrimas, segurou meu braço e falou assim: “menino, tenha certeza de que sua música vai eternizar meu poema”.
Isso foi uma profecia de Vinícius, porque foi exatamente o que aconteceu. O poema que Vinícius havia escrito quando era diplomata no fim da década de 1940, segundo ele mesmo me contou, era conhecido por pouquíssimos intelectuais, o que o causava uma certa tristeza. Porque o poema, por si só, não tinha uma relevância dentro do trabalho dele.
Quando eu apresento a música no poema, ele diz que a música iria eternizar o poema e foi o que aconteceu. Isso é emocionante.
Você, Ney e João Ricardo chegaram a conversar sobre o filme e o sucesso de bilheteria? Como foi o fim do grupo Secos e Molhados?
Eu tive oportunidade de comentar muito rapidamente com o Ney sobre o filme e ele tinha gostado muito. Ele disse que o filme atendeu às expectativas, que foi muito fiel à história dele. Com João Ricardo, infelizmente, eu não tenho contato desde 2002.
O filme relata exatamente o que aconteceu no fim do Secos e Molhados. Quando viajamos para o México, João Ricardo estava conversando quase que diariamente com o pai dele. Moracy do Val era nosso empresário e não nos acompanhou na viagem. Foi ali que a coisa começou a ruir, porque nós confrontamos João Ricardo, até que o desfecho foi aquele que o filme mostra.
Tínhamos uma empresa chamada SPPS Produções Artísticas, que respondia juridicamente pelo Secos e Molhados. Nós quatro éramos sócios em 25%, incluindo o Moracy. Era uma sociedade de 100%, com 25% de cotas para cada um de nós.
Eu e Ney havíamos deixado uma procuração para que o pai de João Ricardo, João Apolinário, pudesse dirigir a empresa, porque faríamos uma turnê de nove meses fora do país, a começar pela Alemanha, na Copa do Mundo de 74.
O João Apolinário se colocou à disposição para dirigir o escritório durante essa época, mas eles usaram da procuração para colocar fim na sociedade que nós tínhamos e criaram a SM, na qual só os dois eram donos e eu e o Ney passávamos de sócios para funcionários contratados.
No filme, eles mostram a cena de quando Ney recebe a pessoa do cartório, que vinha entregar o documento. Ele rasga o documento durante uma reunião na sede da SPPS. Eu estava do lado e nós saímos juntos, porque não havia condição de continuar.
Quando o Ney fala “Eu não fico mais”, foi exatamente o momento em que eu também disse que não ficaria mais no grupo, do modo como eles estavam propondo. Eu confesso que achei que seria uma coisa que em 90 dias seria resolvida, mas o tempo foi passando e a vida não quis que fosse assim.
Todo mundo perdeu. Eu lancei um livro em 2012 chamado “Meteórico Fenômeno: Memórias de um ex-Secos e Molhados”, porque estava com 50 e poucos anos nessa época e me sentindo maduro o suficiente para rever todo esse episódio que eu havia vivido de tão perto.
E, nesse livro, eu coloco muito claramente que, infelizmente, João Ricardo e o pai dele mataram a galinha dos ovos de ouro, porque acabou o grupo em pleno auge de sucesso.
João Ricardo acabou ficando dono do nome Secos e Molhados e, ao longo da carreira dele solo, confundiu a máxima literária que diz “não importa a intenção do autor, o que importa é a obra”, a ponto de se julgar a própria obra. Isso, para mim, é o mais triste dessa história toda, né?
Ele tentou inúmeras vezes usar novas formações do Secos e Molhados, mas nenhuma delas trazia a magia que foi o encontro de Ney comigo e João Ricardo. Nenhuma delas chegou nem aos pés da primeira formação. E é por isso que as pessoas ainda a têm na memória.
Conversa Bem Viver
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