Expoente da primeira geração do Hip Hop brasileiro, Genival Oliveira Gonçalves, o GOG, 57, destaca o papel de iniciativas como a Casa GOG, espaço cultural fundado em 2024, em Brasília, na manutenção da arte, cultura e educação voltados principalmente para a população negra e periférica.
Para GOG, a afrobetização é um tema transversal que perpassa as práticas socioculturais e diálogos promovidos pelo espaço cultural em busca de transformação social. O termo joga luz a um modelo pedagógico diferente, inserindo o letramento racial para inverter o processo histórico e político que sempre colocou o negro como ser inferior em relação ao branco.
“A Casa GOG não tem um viés político partidário, mas tem um espectro de entendimento do mundo que é progressista. Acho que o campo progressista, ligado diretamente ao movimento social, movimento de base, de estruturação é que vai refundar a política no Brasil”, destaca o artista em entrevista ao Conversa Bem Viver
Na esteira desse processo, GOG também fala a respeito da Lei Anti-Oruam, em discussão na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), mas também já em voga em algumas cidades pelo país que reaplicaram o texto. A proposta tenta impedir a manifestação de artistas, principalmente, do funk e do rap por conta das letras retratadas nas canções.
“A desobediência civil está aí para ser praticada. Gandhi libertou a Índia do jugo inglês através de práticas não violentas que o trouxeram como um dos grandes mestres da humanidade. Eu sou um cara muito perigoso, e talvez eu faça apologia à leitura, ao texto. É o crime do raciocínio, é o crime do som batendo forte no falante.”
Confira a entrevista na íntegra
Como você tem tocado, junto com outras pessoas envolvidas, a Casa GOG?
É muito bom falar da Casa GOG [esse espaço cultural e educacional que está no Guará II, no Distrito Federal]. É um processo contínuo, então a todo momento está tendo novidades e desafios.
A Casa GOG teve caminhos e passos muito importantes para que ela pudesse exercer como eu pensei a Casa a princípio. Saiu da caixola e foi pra rua, para os bares, para restaurantes, para as rodas de debate, e todo esse aprendizado vem aperfeiçoando a Casa GOG no dia a dia.
A Casa Gog tem um lema que é “uma casa com ideias”. Então todos são bem-vindos, bem-vindas, bem-vindes para somar, para trazer suas contribuições.
E embora nós tenhamos colaboradores, professores, nós também aprendemos muito com a nossa comunidade. Nesses 5 meses, fizemos muitos encontros, debates com a comunidade, aumentamos o nosso número de colaboradores, mas acho que talvez um dos fatores principais que aconteceram foi a elaboração do nosso PPP, Plano Político-Pedagógico. E agora a afrobetização passa a ser um tema transversal.
Nós vamos apresentar livros para a comunidade, vamos discutir textos, mas textos que tenham a nossa aparência, que tenham nossa proximidade, o nosso entendimento e que no nosso subjetivo nós possamos falar assim: “Mano, isso já aconteceu comigo”, “Isso aqui faz parte da minha rua, da minha casa, da minha história, da minha vivência”, “o meu avô passou por isso, a minha avó passou diretamente por isso, eu sou fruto disso”.
A Casa GOG não tem um viés político partidário, mas tem um espectro de entendimento do mundo que é progressista, que se coincide com algum campo político por acaso.
Então a gente tem que ir com muito cuidado com a comunidade, porque muita gente se afasta quando vê o viés político, partidário.
Eu tenho esperança que a Casa GOG possa ser mais uma vez, como eu fiz na primeira geração do hip-hop, algo que seja pilar para uma estrutura que vem aí para para fecundar e trazer algo para além de discussões rasas.
Te parece que o rap segue também com essa pretensão, esse objetivo, de também fazer a formação política dos jovens de hoje?
Não só o rap, o hip-hop e seus elemento. Isso também afeta o grafite, o DJ, afeta o B Boy, a B Girl.
Eu acredito que o sistema, principalmente o sistema capitalista, ele não tem uma capacidade de enxergar, por mais que a tecnologia esteja avançada, a linguagem dele é binária. Dá dinheiro ou não dá dinheiro. Acumula ou não acumula. E primeiramente, como ele já tem todo um um varal de possibilidades, tudo que é novo eles querem matar, entendeu? Eles já têm um varal pronto para utilizar em suas indumentárias.
O movimento de base, o movimento de rua, o movimento social, a comunidade, o boca a boca faz com que algumas indumentárias novas sejam colocadas quase que impositivamente naqueles varais.
E eles passam, através do poder econômico, a cooptar essas cenas, trazer a linguagem deles. Eles querem dizer o que é certo através do paradigma deles, da visão que eles têm.
Então tudo isso vai sabotando a luta porque são propostas que parecem coerentes a princípio, se você não tiver uma historicidade. Mas quando se mata a história, quando se mata a memória, você mata a possibilidade de renovação. Você tem um novo que simplesmente é uma repetição. Você tem um texto que não transforma.
Quando você ouve, “quando o dia escurece, só quem é de lá sabe o que acontece”, essa frase fala: “Mano, que porrada que vem aí depois?”. O amor é muito bonito, mas chega de tanto amor também. É preciso disputar os outros sentimentos também.
E na minha estrada eu aprendi que a revolução de um só é vaidade, então tem que juntar mais gente, mas é difícil juntar gente. Fazer revolução está cada vez mais complicado. Evoluir está cada complicado, porque as propostas são muito loucas.
Hoje as pessoas fazem música criando refrões no WhatsApp. Joga ali no TikTok, se rolou, bacana. Se não rolou, troca por outro. E daqui a pouco, nossa música é mais tocada do Spotify. É um novo que causa muito estranhamento pra gente que é da arte, que quer esculpir, que quer trazer uma roupagem, uma história, quer que as pessoas descubram mensagens subliminares no que você escreve, no que você traz como texto.
E foi a minha geração que aprendeu assim, mas a gente entende que existe uma nova geração que tem outras estratégias. Porque na realidade, como o poder econômico continua nas mesmas mãos, não deixa de ser uma estratégia de sobrevivência.
E quando as pessoas querem sobreviver, você não pode falar: “Mano, não sobreviva dessa forma porque não é justo, você tem que procurar uma forma educativa de sobreviver”. Não, o instinto de sobreviver é o primeiro do ser humano. Na hora que a gente faz essa análise, você tem que bater, mas você tem que entender também a conjuntura.
Como você, uma pessoa que foi calcada escrevendo no papel, na caneta, construindo o beat com parceiros, vê a nova geração utilizando a inteligência artificial nesse processo? Imagino como deve ser um lugar complicado de batalhar mentalmente.
O professor Nicolelis, nosso mestre Nicolelis, fala da inexistência da inteligência artificial. Até porque a inteligência é inerente ao ser humano. A gente não pode dar o título de inteligência a algo que não é orgânico. Então, é tudo menos inteligência. Logo, não existe uma inteligência artificial. Existe um acúmulo artificial de informações.
E aí vem outra responsabilidade, porque a pseudo inteligência artificial só vai ser contributiva a partir do momento que você coloca mais coisas dentro da máquina para a máquina pesquisar mais, para que ela possa ter uma maior robustez de informações quando consultada.
A partir do momento que as pessoas substituem a organicidade, o orgânico pela máquina, ele está emburrecendo a máquina e com isso, ele está trazendo o processo criativo para declínio.
Sobre a Lei Anti-Oruam, queria te ouvir sobre essa lei que está sendo tramitada nos níveis estadual e federal, mas também nesses pequenos universos que já estão começando a cercear a manifestação do rap e do funk.
O hip-hop surge ali nos anos 70, 80, exatamente com esse viés contestador diante do que é colocado na lei Anti-Oruam, da forma que ela é escrita, o protesto, a narrativa de uma situação pode ser considerada como apologia ao crime.
A lei Anti-Oruam nasce num terreno fértil. Aquela fala combinada e decorada dos partidos de extrema direita. Elas pavimentam para que aconteçam cenas como a que está acontecendo na relação Brasil e Estados Unidos no momento. Em que a soberania do Brasil é colocada à prova em nome de uma liberdade de expressão de pessoas que simplesmente pegaram e chegaram no centro do poder, tido como democrático e fazem da forma que querem, colocando como liberdade de expressão. E aí vem o contraponto, que aquilo não é apologia ao crime.
Eu acho que cada um faz o que quer, mas o que não dá para fazer é aplaudir uma coisa e apontar outra como erro. Eu acho também que se a guerra é preta, a estratégia é quilombola.
Eu acredito que existem algumas estratégias. A desobediência civil está aí para ser praticada. Gandhi libertou a Índia do jugo inglês através de práticas não violentas que o trouxeram como um dos grandes mestres da humanidade. Eu sou um cara muito perigoso, e talvez eu faça apologia à leitura, ao texto.
É o crime do raciocínio, é o crime do som batendo forte no falante. Então, eu acho que tem outras formas da gente conversar das mesmas coisas e deixando de passar batido. Quando eles falam do dinheiro público, do espaço público, o espaço é do povo. O povo não foi consultado.
Vem uma regra de cima para baixo de partidos conservadores, de partidos que fazem isso no sentido de colher votos. Isso é eleitoreiro.
Os vereadores do Rio de Janeiro, em Campo Grande, em Fortaleza, em Salvador, uma cidade como Salvador, com tanta energia cultural, como é que funciona a cabeça de um vereador para discutir a apologia ao crime numa cidade que é 80% de preto e só foi governada por brancos até hoje, com raras exceções?
Então, o que é a apologia ao crime na realidade? O que é crime nesse país onde 1% ganha o que 90% ganha? A Casa GOG se propõe a discutir essas cenas, então, quer dizer, no país da bola o que vai decidir o jogo é a bolinha dos olhos.
Que todos possam ter o espaço de se expressar e que as pessoas entendam que quando você pisa no pé do outro, já não é o seu espaço, é o espaço do outro. É que são coisas simples, mas que as pessoas tentam deixar de forma muito complexa para a comunidade, para que a comunidade não entenda e vote a partir de uma coisa que vai machucá-las lá na frente.
Porque as maiores vítimas dessas leis e dessas regras são exatamente as pessoas que são de periferia, de comunidade e que diante de uma inoperância do Estado no seu espaço de moradia, eles acabam votando no opressor. Eles acabam apoiando regras que só vão puni-los ainda mais.

Em diferentes horários, de segunda a sexta-feira, o programa é transmitido na Rádio Super de Sorocaba (SP); Rádio Palermo (SP); Rádio Cantareira (SP); Rádio Interativa, de Senador Alexandre Costa (MA); Rádio Comunitária Malhada do Jatobá, de São João do Piauí (PI); Rádio Terra Livre (MST), de Abelardo Luz (SC); Rádio Timbira, de São Luís (MA); Rádio Terra Livre de Hulha Negra (RN), Rádio Camponesa, em Itapeva (SP), Rádio Onda FM, de Novo Cruzeiro (MG), Rádio Pife, de Brasília (DF), Rádio Cidade, de João Pessoa (PB), Rádio Palermo (SP), Rádio Torres Cidade (RS); Rádio Cantareira (SP); Rádio Keraz; Web Rádio Studio F; Rádio Seguros MA; Rádio Iguaçu FM; Rádio Unidade Digital ; Rádio Cidade Classic HIts; Playlisten; Rádio Cidade; Web Rádio Apocalipse; Rádio; Alternativa Sul FM; Alberto dos Anjos; Rádio Voz da Cidade; Rádio Nativa FM; Rádio News 77; Web Rádio Líder Baixio; Rádio Super Nova; Rádio Ribeirinha Libertadora; Uruguaiana FM; Serra Azul FM; Folha 390; Rádio Chapada FM; Rbn; Web Rádio Mombassom; Fogão 24 Horas; Web Rádio Brisa; Rádio Palermo; Rádio Web Estação Mirim; Rádio Líder; Nova Geração; Ana Terra FM; Rádio Metropolitana de Piracicaba; Rádio Alternativa FM; Rádio Web Torres Cidade; Objetiva Cast; DMnews Web Rádio; Criativa Web Rádio; Rádio Notícias; Topmix Digital MS; Rádio Oriental Sul; Mogiana Web; Rádio Atalaia FM Rio; Rádio Vila Mix; Web Rádio Palmeira; Web Rádio Travessia; Rádio Millennium; Rádio EsportesNet; Rádio Altura FM; Web Rádio Cidade; Rádio Viva a Vida; Rádio Regional Vale FM; Rádio Gerasom; Coruja Web; Vale do Tempo; Servo do Rei; Rádio Best Sound; Rádio Lagoa Azul; Rádio Show Livre; Web Rádio Sintonizando os Corações; Rádio Campos Belos; Rádio Mundial; Clic Rádio Porto Alegre; Web Rádio Rosana; Rádio Cidade Light; União FM; Rádio Araras FM; Rádios Educadora e Transamérica; Rádio Jerônimo; Web Rádio Imaculado Coração; Rede Líder Web; Rádio Club; Rede dos Trabalhadores; Angelu’Song; Web Rádio Nacional; Rádio SINTSEPANSA; Luz News; Montanha Rádio; Rede Vida Brasil; Rádio Broto FM; Rádio Campestre; Rádio Profética Gospel; Chip i7 FM; Rádio Breganejo; Rádio Web Live; Ldnews; Rádio Clube Campos Novos; Rádio Terra Viva; Rádio interativa; Cristofm.net; Rádio Master Net; Rádio Barreto Web; Radio RockChat; Rádio Happiness; Mex FM; Voadeira Rádio Web; Lully FM; Web Rádionin; Rádio Interação; Web Rádio Engeforest; Web Rádio Pentecoste; Web Rádio Liverock; Web Rádio Fatos; Rádio Augusto Barbosa Online; Super FM; Rádio Interação Arcoverde; Rádio; Independência Recife; Rádio Cidadania FM; Web Rádio 102; Web Rádio Fonte da Vida; Rádio Web Studio P; São José Web Rádio – Prados (MG); Webrádio Cultura de Santa Maria; Web Rádio Universo Livre; Rádio Villa; Rádio Farol FM; Viva FM; Rádio Interativa de Jequitinhonha; Estilo – WebRádio; Rede Nova Sat FM; Rádio Comunitária Impacto 87,9FM; Web Rádio DNA Brasil; Nova onda FM; Cabn; Leal FM; Rádio Itapetininga; Rádio Vidas; Primeflashits; Rádio Deus Vivo; Rádio Cuieiras FM; Rádio Comunitária Tupancy; Sete News; Moreno Rádio Web; Rádio Web Esperança; Vila Boa FM; Novataweb; Rural FM Web; Bela Vista Web; Rádio Senzala; Rádio Pagu; Rádio Santidade; M’ysa; Criativa FM de Capitólio; Rádio Nordeste da Bahia; Rádio Central; Rádio VHV; Cultura1 Web Rádio; Rádio da Rua; Web Music; Piedade FM; Rádio 94 FM Itararé; Rádio Luna Rio; Mar Azul FM; Rádio Web Piauí; Savic; Web Rádio Link; EG Link; Web Rádio Brasil Sertaneja; Web Rádio Sindviarios/CUT.
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