Em 5 de junho de 2024, o governo federal instituiu o Programa Nacional de Conservação e Uso Sustentável dos Manguezais do Brasil (ProManguezal), que visa à conservação, à recuperação e ao uso sustentável da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos associados aos manguezais do país. No entanto, até agora são poucos os avanços sentidos pela população que vive nesses territórios.
Nesta edição do Conversa Bem Viver, programa do Brasil de Fato, Marizelha Lopes, marisqueira e liderança quilombola de Bananeiras, na Ilha de Maré, em Salvador (BA), destaca como as mudanças no clima e ações de grandes empresários e gestores estaduais e municipais influenciam o ecossistema associado ao manguezal em Ilha de Maré, afetando diretamente centenas de famílias que dependem deste território para sobreviver.
“Por mais que a gente se dedique e haja propostas que venham proteger o manguezal, que venham proteger a floresta, o território, em paralelo estão arquitetando coisas e fazendo movimentações para que isso não aconteça. Se a gente olhar o que foi que avançou no sentido de proteção ao manguezal, vou dizer que para nós, não conseguimos visualizar nenhum avanço”, ressalta Marizelha Lopes
“As coisas continuam do mesmo jeito, não se faz as consultas, quando estão fazendo por aqui é brincando de fazer consulta, a própria secretaria de algum governo municipal, estadual que chega na comunidade, que conversa com as pessoas e depois diz que foi feito consulta para legalizar as intenções e interesse de empresários. Então as coisas só pioram.”
Confira entrevista na íntegra:
Para começar, ia ser muito legal se você pudesse apresentar um pouquinho da Ilha de Maré, principalmente com esses contornos difíceis, ainda que seja um território tão bem ocupado historicamente por populações quilombolas, por populações tradicionais, mas que já faz bastante tempo que a cotidianidade da vida das pessoas vem sendo afetada pelos impactos de grandes empreendimentos, principalmente da área do petróleo, mas não apenas.
Já falando do PL da Devastação, na verdade, tem sido uma postura não só aqui na Bahia, mas vou focar mais aqui, já acontece um desrespeito total às leis ambientais, ao próprio estado como um todo. Então com relação aos órgãos que cumpririam esse papel de fiscalizador e de proteção do meio ambiente, principalmente a área de manguezal, o que a gente vê é uma flexibilização que já faz tempo, para que chegue os empreendimentos. O que eles estão fazendo agora é legalizar o que já está em prática.
Vemos o que aconteceu, por exemplo, em Mariana e Brumadinho e o que de concreto aconteceu para minimizar esses impactos no ambiente, no território? Paralelo a isso, estão pipocando mineradoras em todo canto, licenciadas pelos mesmos.
E aí empresas como a Vale que acabam sujas ali, enfraquecem a sua imagem, tem tido a postura de inventar um outro nome, até fictício, e vai para outros cantos e são liberados pelos mesmos órgãos. Então, na verdade, para nós é só uma legalização. Ainda assim, ficamos muito preocupados. Aqui as coisas só tendem a piorar.
Em alguns estados você vê um cuidado maior para que não chegue mais contaminantes, para que não chegue mais empresas que venham ameaçar ainda mais o meio ambiente, que não é meio, é todo, e os trabalhadores que vivem nas comunidades aceitam tudo.
Um outro impacto que a gente está muito preocupado é a ponte Salvador-Itaparica. Já tem o Porto de Aratu, a Dow Química está dentro do Rio de Aratu, que também está em Alagoas, que contaminou, ameaçou e teve que ser retirado um quarteirão gigante de comunidades que já estavam ali acostumadas, com modo de vida específico, e foram remanejados.
E tem a refinaria Landulpho Alves, que continua, de forma irresponsável, atuando, explorando. Vemos agora, uma coisa que nos assusta muito é a ideia de explorar petróleo na Amazônia.
Está tudo muito ligado, muito orquestrado, por mais que a gente faça ações, por exemplo, o ProManguezal, por mais que a gente se dedique e haja proposta que venha proteger o manguezal, que venha proteger a floresta, o território, paralelo a isso estão arquitetando coisas e fazendo movimentações para que isso não aconteça.
Se a gente olhar o que foi que avançou no sentido de proteção ao manguezal, vou dizer que, para nós, não conseguimos visualizar.
As coisas continuam do mesmo jeito, não se faz as consultas, quando estão fazendo por aqui é brincando de fazer consulta, a própria secretaria de algum governo municipal, estadual, que chega na comunidade, que conversa com as pessoas e depois diz que foi feito consulta para legalizar as intenções e interesse de empresários. Então as coisas só pioram.
A gente celebra o ProManguezal, um lançamento de um programa que de fato conversou com as pessoas, que promete fazer mudanças estruturais, mas passa um ano, não vemos nada e de repente aparece um PL da devastação. E a sensação é que em um ou dois dias qualquer avanço que existiu em relação ao ProManguezal vai por água abaixo, quase literalmente.
Lula assinando esse PL [da Devastação], na íntegra, como está, o que defendemos aqui é que não seja aprovado, porque não tem o que mudar ali. Tem que acabar, mas aprovando a gente pode dizer que vai pipocar tudo o que a gente sempre apontou ali como um problema.
Agora mesmo está em curso o projeto aqui no Rio de Aratu, chamado Bahia Terminais, que está destruindo, está cortando com motosserra sete hectares de manguezal. E quem liberou foi o governo do Estado, que é do PT. Então o que esperar?
Acho que tanto o Cacique Nailton, Nego Bispo, os mais velhos mesmo que tem orientado a gente, mesmo Nego Bispo que tombou, mas ainda assim escutamos a mensagem e a voz dele, é dizer que a demarcação, a proteção, somos nós que precisamos fazer, porque os caras vem para cima com tudo.
Vimos toda a movimentação de privatização das praias. Como isso teve uma repercussão muito grande, eles conseguiram uma manobra de legalizar. Então, vamos esperar que vai ter privatização das praias com essa PL. Tem sido tempos muito difíceis.
Estamos vendo o aquecimento, quanto que aumentou o calor, o avanço das águas, estamos vendo os sinais da natureza dizendo “chega, acabou”. Só que os caras não estão nem aí para isso, então vai avançar.
Que impactos você poderia nomear sobre os efeitos das mudanças climáticas dentro da região da Ilha de Maré?
A gente não tem conseguido fazer a leitura, que sempre foi orientada pela natureza, através do vento, da luz da lua, não tem conseguido mais. Esse é um dos aspectos.
As marés que sempre esperamos com muita alegria, a maré de março e de fevereiro para nós era uma maré que vinha recheada de alegria, de abundância do pescado, de poesia, de ternura junto com a lua cheia. E aí, nos últimos dois, três anos, estamos com medo.
A água conseguiu chegar nos lugares onde os mais velhos nunca viram chegar. Então as pessoas de mais de 80 anos, 90 anos dizem para nós que a maré nunca chegou naquele determinado lugar. Aqui, em Ilha de Maré, tem casas que se o prefeito não fizer logo a contenção, como a gente está cobrando que faça, vai começar a cair.
Outra coisa é a quentura das águas. Principalmente nós mulheres, ao coletar marisco, chega um momento em que precisamos sentar nas poças de água na maré quando seca as coroas. E a gente não tem conseguido fazer isso. No verão a gente não conseguiu fazer isso. Muito quente e com a água quente, afugenta o pescado, a gente começa a ver espécies que são mais da terra, espécies de peixe não chegam mais, porque está muito quente, tem matado os mariscos, então já estamos sofrendo os efeitos.
Eles mexeram demais com a terra, com o meio ambiente, mexeram demais com o nosso planeta e agora as consequências vem e chegam para nós que, infelizmente, não temos condições de mitigar, não temos condições de se adaptar. Para mariscar, a gente vai fazer como agora?
Embora sejam tantas questões difíceis que precisamos encarar com muita seriedade, é difícil ver uma esperança em tudo isso, é importante também ver alguns avanços, algumas conquistas importantes que aconteceram, por exemplo, no ano passado, nas eleições municipais, em que pela primeira vez, a Câmara de Vereadores de Salvador elegeu uma mulher quilombola. Estamos falando de Eliete Paraguaçu, que também é da Ilha de Maré. Conta um pouquinho como foi essa vitória, se foi uma celebração de toda a Ilha de Maré, como vocês estão enxergando essa presença?
O mandato, que tem como nome o Mandato das Águas, a gente celebrou muito, a gente festejou muito porque são várias questões. Primeiro, pontuar que é uma mulher e uma mulher negra. Temos vivido as perseguições de maneira muito forte, principalmente dos homens nas nossas comunidades, então é o machismo que se soma desde os gestores públicos até as pessoas da própria comunidade.
Enfrentamos isso, foi muito difícil. A gente, por exemplo, tanto eu quanto Eliete Paraguaçu, os empresários entraram com ações contra nós. Quando a Eliete ganhou, foi uma emoção, uma alegria muito grande.
E estando lá, começa a pontuar e pautar a cidade. Então, nós pertencemos ao município de Salvador e parece que éramos muito distantes, parece que não existíamos. E já teve um resultado concreto, por exemplo, a Eliete conseguiu marcar uma conversa com o prefeito e o prefeito topou fazer o exame para medir o nível de contaminação no sangue, na saúde da população de Ilha de Maré.
Veja como é importante estarmos lá, sendo representados. E Eliete super nos representa como mulher, como marisqueira, pescadora, então estamos muito felizes.
E o resultado desse exame já aconteceu?
Não, estamos na fase de elaboração, com a parceria da UFBA e também com a Fiocruz. Está planejado entregar esse projeto ao prefeito dia 7 de agosto, para então começar. Se ele disser ok e bater o martelo, com recurso, vamos começar a executar o projeto.
Ela, de fato, acreditava e lutava pelo que acreditava.

Em diferentes horários, de segunda a sexta-feira, o programa é transmitido na Rádio Super de Sorocaba (SP); Rádio Palermo (SP); Rádio Cantareira (SP); Rádio Interativa, de Senador Alexandre Costa (MA); Rádio Comunitária Malhada do Jatobá, de São João do Piauí (PI); Rádio Terra Livre (MST), de Abelardo Luz (SC); Rádio Timbira, de São Luís (MA); Rádio Terra Livre de Hulha Negra (RN), Rádio Camponesa, em Itapeva (SP), Rádio Onda FM, de Novo Cruzeiro (MG), Rádio Pife, de Brasília (DF), Rádio Cidade, de João Pessoa (PB), Rádio Palermo (SP), Rádio Torres Cidade (RS); Rádio Cantareira (SP); Rádio Keraz; Web Rádio Studio F; Rádio Seguros MA; Rádio Iguaçu FM; Rádio Unidade Digital ; Rádio Cidade Classic HIts; Playlisten; Rádio Cidade; Web Rádio Apocalipse; Rádio; Alternativa Sul FM; Alberto dos Anjos; Rádio Voz da Cidade; Rádio Nativa FM; Rádio News 77; Web Rádio Líder Baixio; Rádio Super Nova; Rádio Ribeirinha Libertadora; Uruguaiana FM; Serra Azul FM; Folha 390; Rádio Chapada FM; Rbn; Web Rádio Mombassom; Fogão 24 Horas; Web Rádio Brisa; Rádio Palermo; Rádio Web Estação Mirim; Rádio Líder; Nova Geração; Ana Terra FM; Rádio Metropolitana de Piracicaba; Rádio Alternativa FM; Rádio Web Torres Cidade; Objetiva Cast; DMnews Web Rádio; Criativa Web Rádio; Rádio Notícias; Topmix Digital MS; Rádio Oriental Sul; Mogiana Web; Rádio Atalaia FM Rio; Rádio Vila Mix; Web Rádio Palmeira; Web Rádio Travessia; Rádio Millennium; Rádio EsportesNet; Rádio Altura FM; Web Rádio Cidade; Rádio Viva a Vida; Rádio Regional Vale FM; Rádio Gerasom; Coruja Web; Vale do Tempo; Servo do Rei; Rádio Best Sound; Rádio Lagoa Azul; Rádio Show Livre; Web Rádio Sintonizando os Corações; Rádio Campos Belos; Rádio Mundial; Clic Rádio Porto Alegre; Web Rádio Rosana; Rádio Cidade Light; União FM; Rádio Araras FM; Rádios Educadora e Transamérica; Rádio Jerônimo; Web Rádio Imaculado Coração; Rede Líder Web; Rádio Club; Rede dos Trabalhadores; Angelu’Song; Web Rádio Nacional; Rádio SINTSEPANSA; Luz News; Montanha Rádio; Rede Vida Brasil; Rádio Broto FM; Rádio Campestre; Rádio Profética Gospel; Chip i7 FM; Rádio Breganejo; Rádio Web Live; Ldnews; Rádio Clube Campos Novos; Rádio Terra Viva; Rádio interativa; Cristofm.net; Rádio Master Net; Rádio Barreto Web; Radio RockChat; Rádio Happiness; Mex FM; Voadeira Rádio Web; Lully FM; Web Rádionin; Rádio Interação; Web Rádio Engeforest; Web Rádio Pentecoste; Web Rádio Liverock; Web Rádio Fatos; Rádio Augusto Barbosa Online; Super FM; Rádio Interação Arcoverde; Rádio; Independência Recife; Rádio Cidadania FM; Web Rádio 102; Web Rádio Fonte da Vida; Rádio Web Studio P; São José Web Rádio – Prados (MG); Webrádio Cultura de Santa Maria; Web Rádio Universo Livre; Rádio Villa; Rádio Farol FM; Viva FM; Rádio Interativa de Jequitinhonha; Estilo – WebRádio; Rede Nova Sat FM; Rádio Comunitária Impacto 87,9FM; Web Rádio DNA Brasil; Nova onda FM; Cabn; Leal FM; Rádio Itapetininga; Rádio Vidas; Primeflashits; Rádio Deus Vivo; Rádio Cuieiras FM; Rádio Comunitária Tupancy; Sete News; Moreno Rádio Web; Rádio Web Esperança; Vila Boa FM; Novataweb; Rural FM Web; Bela Vista Web; Rádio Senzala; Rádio Pagu; Rádio Santidade; M’ysa; Criativa FM de Capitólio; Rádio Nordeste da Bahia; Rádio Central; Rádio VHV; Cultura1 Web Rádio; Rádio da Rua; Web Music; Piedade FM; Rádio 94 FM Itararé; Rádio Luna Rio; Mar Azul FM; Rádio Web Piauí; Savic; Web Rádio Link; EG Link; Web Rádio Brasil Sertaneja; Web Rádio Sindviarios/CUT.
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