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Força coletiva: como a organização dos agricultores familiares impulsiona as cooperativas no Ceará

Antônio José conversou com o BdF sobre os desafios e conquistas das cooperativas do MST no Ceará

O estado do Ceará marcou presença na 5ª edição da Feira Nacional da Reforma Agrária, realizada de 8 a 11 de maio, no Parque da Água Branca, em São Paulo, reunindo aproximadamente 180 cooperativas de todo o país. De acordo com informações divulgadas pelo Governo do Estado do Ceará, a agricultura familiar cearense comercializou cerca de 20 toneladas de produtos oriundos de assentamentos do interior. Para falar sobre a força das cooperativas do MST no Ceará e sobre a participação do estado na Feira Nacional da Reforma Agrária, o Brasil de Fato conversou com Antônio José, da Coordenação do Setor de Produção, Cooperação e Meio Ambiente, da Direção Estadual do MST Ceará.

Confira a entrevista

Brasil de Fato: O que é uma cooperativa?

Antônio José: Antes da cooperativa, vem todo um conceito que costumamos destacar: a questão do associativismo e do cooperativismo. Nós, no MST, chamamos de “cooperação agrícola”, que é a junção dessas formas de cooperação. Entendemos que o associativismo e o cooperativismo são formas de organização coletiva que desempenham um papel crucial na agricultura familiar, oferecendo benefícios como acesso ao mercado, insumos, financiamento, além de promover capacitação e desenvolvimento das comunidades rurais.

Baseados nesse foco, temos um organismo no qual os agricultores se unem para alcançar objetivos comuns. Embora o aspecto econômico seja importante, acima dele está a questão social — é muito significativa essa união dos agricultores, no nosso caso, os agricultores familiares, camponeses, assentados e assentadas da Reforma Agrária. Acreditamos que sozinhos não vamos a lugar algum.

É com base nesses princípios que avançamos nas diversas formas de cooperação e, dentro delas, está a cooperativa em si: um instrumento legal, uma empresa social que expressa essa junção organizativa da classe trabalhadora.

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Quais são os maiores desafios das cooperativas no Ceará?

Nosso maior desafio hoje ainda é a agregação de valor. São muitos assentamentos, muita produção, mas, até agora, só conseguimos organizar cinco sistemas — ou seja, apenas cinco agroindústrias participam desse processo. Nosso grande desafio é a massificação, o que chamamos, em nossas discussões, de “massificação da agroecologia”.

Mas o que é essa massificação? Trata-se da agroindustrialização e do fortalecimento do cooperativismo. Já somos bastante organizados nesse sentido, mas precisamos fomentar e fortalecer ainda mais.

Outro ponto importante é a mecanização agrícola, fundamental para nosso desenvolvimento, assim como a discussão sobre energias renováveis, pois os grandes já estão se apoderando dessas tecnologias. Precisamos também nos organizar nesse aspecto. O desafio é trazer esse acúmulo em energias renováveis para facilitar o beneficiamento, agregar valor à nossa produção e baratear os custos, especialmente nas irrigações.

Além disso, há o desafio dos bioinsumos, buscando nossa autonomia na produção de insumos. E, por fim, ainda temos muita dificuldade de fazer esses negócios girarem, especialmente devido à falta de capital de giro.

E quais as conquistas?

As conquistas são muitas. A primeira é o avanço da Reforma Agrária, graças à pressão e à organização do povo. Se não existisse o MST, se não nos organizássemos enquanto movimento social, não teríamos conseguido a terra — que, para nós, é a grande conquista.

É claro que a Reforma Agrária ainda não se concretizou plenamente, por isso continuamos existindo e persistindo. Mas já conquistamos algumas áreas de terra.

O poder público tem dado algum incentivo para fortalecer as cooperativas no Ceará?

Tem. Dentro da Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA) existe a Secretaria de Fomento Produtivo e Agroecologia, que possui algumas coordenadorias que fortalecem o cooperativismo.

Temos, por exemplo, uma coordenadoria que organiza políticas públicas voltadas aos sistemas produtivos, como os “sisteminhas”, cisternas de produção e o programa Hora de Plantar, por meio da Coordenadoria de Desenvolvimento da Agricultura Familiar (Codaf). Portanto, existem várias políticas de incentivo à agricultura familiar, e é através das cooperativas que conseguimos acessá-las.

Também há políticas do governo do estado, em parceria com o governo federal, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Essas iniciativas têm nos ajudado a fortalecer nossa produção, pois possibilitam que vendamos e comercializemos nossas produções para esses mercados institucionais.

Você é da coordenação do Setor de Produção Cooperação e Meio Ambiente do MST Ceará. Explica um pouco sobre a atuação desse setor.

A primeira função do setor é organizar as famílias através da cooperação, da coletividade, do cooperativismo, do associativismo. Levamos formação, capacitação, organizamos a produção, acompanhamos o serviço de assistência técnica e extensão rural.

Também elaboramos projetos para crédito e financiamento junto às agências financiadoras, como o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). No nosso caso, há uma linha específica, o Pronaf A, destinada a assentados e assentadas da Reforma Agrária.

Nosso papel é elaborar e acompanhar a implantação desses projetos produtivos nos acampamentos e assentamentos, organizar todo o sistema cooperativista, controlar a Cooperativa Central, estruturar as empresas — que chamamos de “empresas sociais”, como as agroindústrias — e, agora, também a comercialização.

De acordo com informações divulgadas pelo governo do estado do Ceará, a Feira Nacional da Reforma Agrária deste ano reuniu 180 cooperativas de todo o país. O que esse dado representa?

O número de pessoas que passaram por lá durante o período da feira foi exorbitante. Isso, para nós, significa muito. Primeiro, demonstra nossa capacidade e força organizativa de realizar um evento tão grande, unindo todo o Brasil em um único local, com essa imensa produção e representatividade das cooperativas.

Temos uma representatividade significativa no desenvolvimento da nação. Isso nos enche de orgulho.

De acordo com informações divulgadas pelo governo do estado do Ceará, a agricultura familiar cearense comercializou cerca de 20 toneladas de produtos de assentamentos do interior do estado. | Foto: Foto: Rafael Fonteles/SDA

Como foi a participação das cooperativas do Ceará na 5ª Feira Nacional da Reforma Agrária, que aconteceu de 8 a 11 de maio em São Paulo?

Estive presente e fui um dos organizadores da delegação do Ceará. Também faço parte do Coletivo Nacional do Setor de Produção, então ajudamos a construir e organizar nossa participação.

Nossas cooperativas participaram em peso, com uma grande delegação de aproximadamente 70 pessoas. Alguns foram antes, para ajudar na organização, na comunicação e na montagem da infraestrutura no parque.

Tivemos uma equipe de trabalho que foi primeiro, e depois mais um ônibus com 50 delegados, que chamamos de “feirantes” — aqueles que vão para vender, expor nossa produção e apresentar a culinária da terra. Levamos a cozinha cearense, com nossos pratos tradicionais, para a Feira Nacional.

Tivemos muitas visitas: as pessoas passavam pela nossa banca, compravam nossos produtos, degustavam nossa culinária e vivenciavam um pouco do Ceará. Isso é muito gratificante.

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