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Lula deve retomar anti-imperialismo e se comprometer com o Sul Global, diz José Arbex

Jornalista avalia que taxação de Trump é 'tiro no pé' da extrema direita e tem potencial de fortalecer Lula em 2026

A taxação de 50% sobre produtos brasileiros anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pode ter sido um “tiro no pé” da extrema direita e um “presente”, do ponto de vista político, para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A avaliação é do jornalista e professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), José Arbex Jr., em entrevista ao podcast O Estrangeiro, do Brasil de Fato.

Para Arbex, a resposta de Lula à ameaça estadunidense, ao dizer que Trump deveria “chupar jabuticaba”, captou bem o sentimento popular diante do ataque à economia brasileira. “Ele conseguiu traduzir o sentimento que essa ameaça do Trump produziu no Brasil. Foi um tiro no pé, evidente”, afirma. O professor compara a reação nacional ao episódio que ocorreu no Irã, quando ataques dos EUA e de Israel geraram uma unidade interna contra o imperialismo.

Arbex defende que o presidente brasileiro aproveite a conjuntura para reforçar um alinhamento com o Sul Global e retomar uma política externa de enfrentamento à hegemonia estadunidense. “Lula deveria mostrar claramente que dentro do Congresso Nacional existem aqueles que são a favor do imperialismo, da intervenção. E existem os brasileiros não suportam a intervenção e são a favor da soberania nacional. Dizer isso com todas as letras, esclarecer a população, mostrar o que está em jogo hoje, para capitalizar em cima desse momento”, sugere.

Na visão do jornalista, o governo pode ainda usar o episódio como plataforma para a campanha de reeleição na eleição de 2026. “Foi um presente colocado na mão dele. Não sei se o governo Lula vai conseguir aproveitar esse presente e mobilizar a nação brasileira contra o imperialismo, que é o que ele devia fazer hoje, decididamente”, completa.

Apesar de reconhecer avanços pontuais, como a resposta à taxação, Arbex critica o que considera uma hesitação do governo brasileiro em aderir à Nova Rota da Seda e em fortalecer o Brics. “Ele vacila em não declarar [de forma mais enfática] que o Brasil faz parte do Sul Global e que está comprometido com o Sul Global. O futuro dos empresários brasileiros depende muito mais dessas alianças do que de gestos dos Estados Unidos”, opina.

Momento para agir

Correspondente do Brasil de Fato na Venezuela, Lorenzo Santiago também aponta que a medida pode aproximar Lula do empresariado nacional. “Por mais que o Brasil não tenha uma burguesia nacionalista, desenvolvimentista, na hora que sente no bolso todo mundo corre para defender o seu lado. Lula encontra essa brecha de poder chamar o empresariado, colocar no primeiro plano a defesa da soberania nacional e trazer o imperialismo como pauta prioritária”, explica.

Lorenzo traça paralelos com o que ocorreu na Venezuela, onde o empresariado, após inicialmente apoiar sanções contra o governo, passou a se posicionar contra o bloqueio dos EUA. “O governo venezuelano aproveitou essa situação, chamou os empresários para afinar o discurso e o posicionamento público. É um presente que Lula pode aproveitar. A bola está quicando na frente do gol, ele precisa chutar”, conclui.

O podcast O Estrangeiro vai ao ar toda quarta-feira às 11 horas no Spotify e YouTube.

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