Circo da Democracia

É preciso ir para o ‘Vale Tudo pelo SUS’ contra as propostas do ‘Sinistro da Saúde’

Ricardo Barros recebeu o apelido de 'Sinistro da Saúde' durante o debate sobre saúde pública, no Circo da Democracia

Curitiba |
A intervenção foi produzida pela Companhia de Teatro e Palhaços Mirabólica, e misturou a linguagem do teatro com a dos palhaços
A intervenção foi produzida pela Companhia de Teatro e Palhaços Mirabólica, e misturou a linguagem do teatro com a dos palhaços - Anderson Moreira

A peça ‘Vale Tudo pelo SUS’ transformou o picadeiro do Circo da Democracia no ring da luta em defesa do SUS, contra a privatização e precarização do direito universal à saúde pública. Do lado direito estava a lutadora ‘Ebserh Funeas’, trapaceira e apoiada pelo juiz da partida. “Ela é campeã nacional nas categorias precarização, desmonte e terceirização, e já ganhou muitos prêmios em dinheiro, minha gente!”, anunciou o narrador. Como nome e sobrenome, a personagem reprentou a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) e a Fundação Estatal de Atenção à Saúde do Paraná (Funeas), que representantam o avanço da privatização do serviço público de saúde. Do lado esquerdo, estava o atleta ‘SUS’, famoso por dar acesso gratuito à saúde. “Ele parece estar um pouco abatido hoje, mas nada que uma boa luta não resolva”, sugeriu.

Apesar da peça tratar de um assunto preocupante, a interpretação dos dois palhaços-lutadores arrancou risadas e formou torcida na plateia - a favor do SUS, claro. A intervenção foi produzida pela Companhia de Teatro e Palhaços Mirabólica, e abriu o debate sobre Seguridade Social no Circo da Democracia, na tarde deste domingo (7).

No início da atividade, houve o lançamento da Frente em Defesa da Seguridade Social e Políticas Públicas, composta por dezenas de entidades sindicais, sociais e estudantis do campo da saúde, previdência e assistência social. Os convidados para o debate foram Sarah Granemann, assistente social e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Danilo Amorim, estudante de medicina e integrante da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina (Denem). Ambos apresentaram argumentos para contrapor o discurso de desvalorização do SUS e dos direitos sociais e trabalhistas.

Um dos principais ataques é ao Regime Geral de Previdência Social, o INSS. Segundo a Granemann, cerca de 30 milhões de pessoas são aposentadas, pensionistas ou beneficiárias de programas sociais como o Bolsa Família. Na estimativa apresentada pela pesquisadora, 90 milhões de famílias brasileiras dependem diretamente desses benefícios. "Este é o maior programa de distribuição de renda do país. Significa dizer que cerca de 80% da população se beneficia com repasses de até 3 salário mínimos". 

Amorim se refere ao atual ministro interino da Saúde, Ricardo Barros, como "Sinistro da Saúde". A partir da projeção de manchetes de jornais, o estudante resgata opiniões de Barros, como de que a Constituição tem direitos de mais, que o SUS é grande demais, ou que os planos de saúde privados são uma saída para a fragilidade do acesso à saúde no Brasil.

Os dados sobre o gasto e atendimento à saúde desmente a afirmação de que o SUS não funciona. Em 2015, do total de gastos com saúde, o SUS foi responsável por 46% dos recursos, e atendeu 75% da popular, segundo informações apresentadas por Amorim. Já o sistema privado gastou 56% e atendeu 25% da população. Para dar conta do que está estabelecido na Constituição, pelo menos 7% do do orçamento da União (cerca de R$ 420 bilhões), deveriam ir para a saúde. No entanto, a destinação atual é de R$ 100 bilhões, com tentativas de congelamento ou redução.

A tentativa de desmonte, na avaliação de Amorim, pode tratar-se de retribuição pelas generosas contribuições do setor privado de saúde nas eleições de 2014. Ao todo, os planos de saúde deram R$ 55 milhões a diversas campanhas eleitorais. Em sua campanha para deputado federal, Ricardo Barros (PP) recebeu financiamento de 10 milhões de uma das maiores seguradoras de planos privados do Brasil.

Histórico de resistência

No campo dos direitos sociais, a professora da UFRJ afirma que os ataques vêm desde 1990. "Não podemos nos iludir e achar que tudo começa com o Temer". No entanto, classifica o cenário atual como um dos mais difíceis da história de resistência dos trabalhadores: "Este governo quer retroagir a antes de 1945, quando o capital começou a ter que fazer políticas sociais de 'Bem Estar Social'", resgata.

Danilo Amirim resgata o papel da Constituição de 1988 como o marco de mudança na compressão do direito à saúde: "Antes da Constituição, a Saúde não era direito, era mercadoria. Só tinha acesso quem podiam pagar por ela ou dependia da benevolência das Santas Casas de Misericórdia". A conquista veio a partir da mobilização da sociedade, em especial por meio do Movimento da Reforma Sanitária.

Para a professora, a ameaça aos direitos no Brasil está ligada a uma reorganização do capital mundial, que busca novas formas de conseguir extrair lucro. "Capital está numa das suas maiores crises, e não era uma 'malora'. A taxa de lucro do capital está em franca queda. Mas para os capitalistas tanto faz vender salsichas ou venda educação", em referência a um trecho da obra de Karl Marx.

Tarefa de milhões

Na avaliação Sarah Granemann, a reação dependerá de milhões de trabalhadores e trabalhadoras nas ruas, com ampliação da capacidade de comunicação com a sociedade. "Precisamos reinventar as nossas lutas, não sendo pós-modernos de jogar partidos, sindicatos e movimentos fora. Não é isso. Mas uma classe trabalhadora que ficou 13 para 14 anos numa pedagogia do apaziguamento, não vai agora abrir uma janela e diz 'vem classe, vem pra luta'”, critica.

Diante da necessidade de massificar a luta por direitos, Danilo Amorim parabeniza a iniciativa do Circo da Democracia: "A gente precisa reinventar as iniciativas de diálogo e mobilização para envolver a popular. Por isso, iniciativas como a do Circo são extremamente necessárias para a democracia".

O desfecho do ‘Vale Tudo pelo SUS’ é triunfal: depois de nocauteado por um golpe baixo da lutadora ‘Ebserh Funeas’, o SUS é socorrido e reanimado pelo povo. A ‘Ebserh Funeas’ perde a partida e saí do ring arrastada por servidores da saúde e usuários do SUS. A plateia aplaude de pé a vitória da saúde pública, universal e gratuita. 

Para ver a programação completa, acesse o site do Circo da Democracia.

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