Retrocesso

Governo quer alterar regras de demarcação de terras indígenas

Minuta do Ministério da Justiça ameaça direitos territoriais de povos indígenas, mesmo aqueles que já foram demarcados

Brasil de Fato | Belém (PA) |
Indígenas protestam em frente ao Congresso Nacional
Indígenas protestam em frente ao Congresso Nacional - Wilson Dias

O Ministério da Justiça elaborou uma ‘Proposta de Regulamentação da Demarcação de Terras Indígenas’ que pretende modificar o sistema de reconhecimento de territórios dos povos ancestrais. Analistas garantem que, desde a Ditadura Militar, não se tem uma proposta tão radical como esta sugerida pelo governo.

A justificativa para a mudança é que seria necessário atualizar as normas e os decretos dos procedimentos de demarcação das terras indígenas. Entre as propostas de atualização que a minuta do decreto sugere, está adoção da tese do ‘marco temporal’, que só reconhece a existência de comunidades indígenas que já ocupavam terras ou a disputavam judicialmente a partir da promulgação Constituição de 1988. 

Outra novidade polêmica sugerida é a indenização financeira para os indígenas que tiveram seus territórios ocupados. Pelas normais atuais o governo compensa com indenizações os donos de propriedades rurais que se encontram em áreas reconhecidas como terras indígenas.  

Ameaças

No baixo Tapajós, região do município de Santarém, no Pará, existem 19 territórios indígenas, alguns que sequer iniciaram os estudos de demarcação e outros que ainda estão na etapa de homologação. A nova proposta do governo põe em risco a vida dos indígenas como afirma Auricélia Arapiun, 28 anos, indígena e estudante de direito na Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA).

“Todos os nossos territórios foram solicitados após a Constituição Federal, e isso para nós é um retrocesso enorme dos nossos direitos territoriais, quando não se tem direito ao território não se tem direito a nada, porque se é negado a identidade, a cultura e as tradições”, disse.

A minuta também abre precedente para contestar áreas já demarcadas por pessoas que desejam requerer o mesmo espaço. Há 20 anos as demarcações de terras indígenas são regulamentas pelo decreto 1.775. 

Para o sócio fundador do Instituto Socioambiental (ISA) e ex-presidente da Funai, Márcio Santilli, o documento passa por cima do caráter originário dos direitos indígenas que está garantido pela Constituição e atende aos interesses daqueles que são contra os direitos dos povos ancestrais. Diante da polêmica Santilli custa acreditar que de fato a minuta seja verdadeira, tamanha a gravidade de violações de direitos.

“A gente ainda está custando a crer no que está sendo divulgado, na verdade, não se tem notícia de uma proposta como essa desde o fim da Ditadura Militar, é uma proposta que inviabiliza a identificação de terras indígenas e chega inclusive a pretender que terras que já concluíram várias etapas de seu procedimento administrativo de demarcação não sejam homologadas. Se de fato o que circulou vier a ser editado nesses termos, com certeza esse decreto será questionado no Supremo [Tribunal Federal]”, acrescenta. 

O Brasil de Fato entrou em contato com o Ministério da Justiça por meio de sua assessoria de comunicação, para questionar se tal minuta não contraria o Decreto 1.775, mas o Ministério disse não ter conhecimento sobre o documento.

Acesse aqui o documento.

 

Edição: José Eduardo Bernardes

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