Redes

Conferência debate Internet, liberdade de expressão e privacidade em Brasília

Atividade problematizou a Internet como espaço político transformador, mas que apresenta ameaças à privacidade

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Flávia Lefèvre, Dafne Plou, Marcos Urupá, membro do Intervozes que intermediou o debate, Murilo Ramos e Joana Varon
Flávia Lefèvre, Dafne Plou, Marcos Urupá, membro do Intervozes que intermediou o debate, Murilo Ramos e Joana Varon - Mídia NINJA

Internet, liberdade de expressão e privacidade foram os temas centrais da conferência que aconteceu na manhã deste sábado (27), na Universidade de Brasília (UnB). Parte do 3º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação (ENDC), o debate buscou pensar respostas conjuntas a algumas perguntas, entre elas: como usar a internet para a construção política, ficando, ao mesmo tempo, alerta às ameaças de privacidade nas redes?

A resposta, de longe, não foi fácil, mas a contribuição dos palestrantes presentes ajuda a pensar caminhos possíveis. Para Flávia Lefèvre, que compõe a Coalizão Direitos na Rede e a Associação Proteste, alguns dos problemas centrais a serem combatidos para garantir o direito à privacidade dos usuários das redes são: a ausência de uma lei de proteção de dados pessoais no Brasil e o debate em torno dos centros de poder por trás das redes.

"A gente precisa ampliar a discussão em torno da governança na internet, porque isso já está tendo e vai ter ainda mais consequências decisivas na formação dos cidadãos e na garantia do direito à expressão", disse.

Para Lefèvre um dos principais pontos a ser pautados é o fato de a internet "estar sob ataque do capital, dos mais ricos (...), já que as redes têm se mostrado um importante espaço de liberdade de expressão e mobilização".

Ela também criticou os prejuízos produzidos pelo sistema de algoritmo do Facebook. "O Facebook tem acertos com as grandes mídias, eles clippam determinadas noticias, resumem e, usando algoritmos, colocam na sua timeline o que eles acham que você tem interesse de saber". Em suas palavras, isso é um claro ataque ao direito, não só à liberdade de expressão, mas à informação, que acaba impactando o direito dos usuários da rede social de formar uma opinião política com base em discursos diversos sobre as conjunturas.

"As empresas passaram a coisificar os cidadãos. Quando eles [os algoritmos] se associam às bases de dados coletadas, passam a nos colocar dentro de bolhas e restringir não só o que a gente acessa, se informa e conhece, mas também a quem nós vamos falar", concluiu.

Também presente, o professor da Faculdade de Comunicação da UnB, Murilo Ramos, defendeu que há a necessidade de fazer uma leitura crítica da web. "A internet hipnotiza, paralisa, é fascinante. Mas a questão é política, ética, e tem que ser discutida. Dados pessoais são a disputa do futuro", disse em sua contribuição para o debate.

Membra do Coding Rights, Joana Varon abordou na atividade, principalmente, o modelo de negócios do capitalismo de dados. A organização, liderada por mulheres e com sede no Brasil, discute as políticas por trás das tecnologias e como elas se aplicam na prática em questões de privacidade e gênero.

"Os modelos de negócio monopolizantes, como Facebook e Google, se fundaram baseados na mineração de dados", disse Varon. E explicou: "esses modelos de negócio baseados na extração de dados têm por trás a venda da narrativa de que os serviços são de graça e você não tem nada a esconder, e isso se conecta com a narrativa de segurança do Estado".

Ela pontua que, nos dias de hoje, a vigilância nas redes acontece com uma conexão entre o setor privado e o público, na qual o público usa, cada vez mais, os dados pessoais colhidos pelos setores particulares. No entanto, Varon é positiva ao pensar no cenário. "Isso não quer dizer que a privacidade morreu. Quer dizer que a gente tem que reforçar o direito à privacidade e lutar cada vez mais"

América Latina

Não são apenas entidades nacionais que compõe o 3º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação. Nesta conferência, por exemplo, esteve presente Dafne Plou, da Associação para o Progresso das Comunicações (APC) da Argentina.

Ela ressaltou a importância de enxergar e pretender a internet como um espaço de fortalecimento de uma comunicação democratizadora. Plou acredita que devemos estar alertas a três grandes formas de vigilância: a do setor corporativo, que coloca a vida privada dos indivíduos como parte do mercado; a do Estado, cujo aparato repressivo continua funcionando; e a vigilância entre pares que, em sua explicação, acontece quando pessoas próximas nos fazem sentir a obrigação de compartilhar nossas vidas pessoais nas redes.

"A questão da privacidade é um tema político. É fundamental incorporar uma ética e normas no serviço das plataformas de internet", sentenciou. Ela também compartilhou a preocupação com o fato de alguns países, como o Brasil, possuírem um "campo livre" para a concentração dos meios de comunicação.

"É hora de reivindicar a autonomia sobre nosso corpo, sobre nossas imagens e a privacidade. A privacidade é condição indispensável para uma sociedade plural, diversa. Sem privacidade, não há liberdade de pensamento", concluiu.

O 3º Encontro Nacional pelo Direito à Comunicação acontece até este domingo (28). O Brasil de Fato continuará disponibilizando a cobertura dos debates.

 

Edição: Mauro Ramos