Paraná

Mobilização

Universidade do Paraná criminaliza estudantes e professores por ocupação de campus

Entre os nomes investigados, o consenso é de que o processo ocorre por perseguição política

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Ocupação do campus central da UTFPR de Curitiba durou sete dias e aconteceu ao fim de novembro de 2016
Ocupação do campus central da UTFPR de Curitiba durou sete dias e aconteceu ao fim de novembro de 2016 - Ednubia Ghisi

No último ano, em 19 estados do país, milhares de estudantes ocuparam suas escolas e universidades contra medidas impostas pelo golpista Michel Temer (PMDB). No Paraná, mais de mil instituições de ensino foram ocupadas em reação às novas políticas, marcadas por um grave impacto sobre a educação – dentre elas, a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Neste mês, porém, professores e alunos do campus Curitiba da UTFPR foram notificados pela direção sobre um processo de sindicância, aberto com o propósito de criminalizar os envolvidos na luta contra o desmonte das escolas públicas.

Entre os 50 nomes investigados, que incluem docentes e discentes, o consenso é de que o processo foi motivado por perseguição política. Conforme a estudante Waleria*, que participou da ação em 2016 e preferiu preservar sua identidade, a ocupação da UTFPR foi bastante turbulenta em relação às demais: houve um forte movimento de desocupação encabeçado por estudantes e professores contrários à luta coletiva. “Foi necessário construir uma mobilização fechada para resistir à violência de quem estava fora, nos portões, forçando a nossa saída”, relata a estudante.

Sem direito de resposta

A direção do campus Curitiba bloqueou o acesso de Waleria e dos quase 40 alunos criminalizados na sindicância ao sistema da Universidade, antes mesmo de escutar seus depoimentos. “Só foram ouvidas as testemunhas do lado de fora e já nos condenaram. A impressão é que o diretor mal sabe o que está fazendo e quer apenas nos punir, como se fôssemos criminosos”, avalia Waleria. Com o sistema bloqueado, os estudantes não podem colar grau nem realizar, modificar ou cancelar matrículas. O processo os sujeita à suspensão de até 90 dias e até mesmo à expulsão da universidade.

Outra incoerência apontada por Waleria está na liberação de um estudante contrário à luta interna que soltou uma bomba dentro da UTFPR, na intenção de atingir os ocupantes. “Ele foi inocentado porque não machucou ninguém. Enquanto isso, expõem nossos nomes em praça pública, como no Brasil colonial, para reprimir e censurar novas manifestações como aquela”.

Criminalização docente

Diante do conflito, na ocasião, muitos docentes interferiram para garantir que ninguém se machucasse. A professora Yara*, que também pediu para não ser identificada, destaca que dezenas de educadores da UTFPR chegaram a formar um cordão de segurança para evitar ataques de bombas e as agressões do movimento que vinha do lado de fora. “Um grupo de professores – e eu estava entre eles – permaneceu na Universidade pelo maior tempo possível para proteger a integridade dos alunos, dos dois lados, e acalmar os ânimos de todos”, recorda-se.

Yara é um dos nomes intimados no processo de sindicância, que também fechou relatórios sem chamar os acusados. Ela assinala a perseguição política da iniciativa: dentre 13 docentes indicados para prestar depoimento, pelo menos metade tem ligação direta com o Sindutf-PR, sindicato que representa os professores da UTFPR. “Todos os que integravam a direção da entidade foram intimados pela sindicância”, diz Yara. Até o fechamento desta reportagem, dois educadores já prestaram depoimento na última segunda-feira (11) e quatro depuseram na quarta  (13). “Nenhum outro campus da UTFPR abriu sindicância contra seus alunos e professores. Aliás, nenhuma das universidades ocupadas no país adotou esse procedimento”, informa a professora.

Por educação democrática

No dia 25 de setembro, será lançado, o Movimento Educação Democrática no Paraná. A ideia é organizar a luta pela qualidade do ensino e pela educação livre. Na programação, o evento conta com palestra do professor Fernando Penna, da Universidade Federal Fluminense, e a participação de estudantes e professores da rede pública do estado como debatedores. A atividade será no edifício Dom Pedro I, da Reitoria da Universidade Federal do Paraná, no Centro de Curitiba.

Ainda em defesa da escola pública e dos estudantes e professores criminalizados da UTFPR, foi lançado um manifesto coletivo sob a forma de um abaixo assinado. A moção denuncia a perseguição política contra servidores que mediaram conflitos durante a ocupação da universidade, além dos 35 estudantes submetidos ao processo administrativo disciplinar. Até o momento, a moção recebeu mais de 800 assinaturas.

* Os entrevistados preferem não se identificar, por receio de novas represálias

Edição: Ednubia Ghisi