Estados Unidos

Artigo | Steve Bannon, o mito por trás dos monstros

Um fantasma ronda a globalização neoliberal em decomposição, o fantasma do populismo de ultradireita

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Bannon começou a testar algumas ideias mediante Cambridge Analytics, consultora que sugou dados de 50 milhões de usuários do Facebook
Bannon começou a testar algumas ideias mediante Cambridge Analytics, consultora que sugou dados de 50 milhões de usuários do Facebook - Wikicommons

Essa sombra fantasmagórica, a princípio difusa e hoje mais nítida, teve seu primeiro êxito com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos, e terminou de se solidificar com a chegada de Jair Bolsonaro à presidência do Brasil. Um terceiro vértice deste triângulo encontramos na Europa de Matteo Salvini (Itália), Viktor Orban (Hungria), Marine Le Pen (França) e Vox (Espanha). 

E como articulador deste fenômeno monstruoso, encontramos um nome: Steve Bannon, que foi durante sete meses o chefe de estratégia e assessor presidencial da Casa Branca de Trump. 

Quem é Steve Bannon? Ex-banqueiro, ficou conhecido por ser o diretor executivo de Breibart News, a web referência da ultradireita antiestablishment nos Estados Unidos, a partir de onde se impulsionou a criação do movimento Alt-right (direita alternativa, um eufemismo para nomear a supremacia branca), e que o catapultou para ser o chefe de campanha de Trump, e posteriormente o homem forte da Casa Branca, até sua demissão em agosto de 2017. 

Mas na verdade, essa demissão foi o impulso para um Bannon que soube ler e aproveitar muito bem o momento gramsciano onde o velho não terminou de morrer e o novo não terminou de nascer. Um momento histórico de crise terminal do capitalismo em um mundo multipolar onde o projeto de globalização neoliberal das elites econômicas entrou em crise, e onde surgem, neste claro-escuro, os monstros.

Até então, Bannon havia começado a testar algumas ideias mediante Cambridge Analytics, a consultora que sugou dados de 50 milhões de usuários do Facebook e os utilizou para manipular psicologicamente a eleição que deu a vitória a Trump. 

Mas é um ano depois, em agosto de 2018, que Bannon se reúne com Eduardo Bolsonaro, atualmente o deputado federal mais votado da história do Brasil com quase 2 milhões de votos, e fazem o acordo de colaboração para levar seu pai, Jair Bolsonaro, à presidência do Brasil. 

O resultado é conhecido por todos, e Bolsonaro representa o triunfo de um monstro de ultradireita no maior país da América Latina. 

De novo outra rede social, como aconteceu nos EUA, neste caso o Whatsapp (propriedade também do Facebook), resultou determinante na ampla vantagem que Bolsonaro obteve no primeiro turno, e no resultado final do segundo, criando todo um ecossistema de fake news que foi transmitido pelo serviço de mensagens, e mediante a micro segmentação e o uso de big data, terminaram desconstruindo a realidade política ao mesmo tempo que construíam uma paralela no imaginário da população. 

Tanto nos Estados Unidos como no Brasil, a mensagem que foi alimentada era similar (com as especificidades de cada país): a luta contra o marxismo cultural e a ideologia de gênero, além de um discurso crítico com os meios de comunicação de massa parte do stablishment (sejam estes CNN ou Globo), apelando aos medos e aspirações dos setores populares. 

A partir desta ideologia de ultradireita, da experiência em Breitbart e como forma de articular e expandir o Alt-right, Bannon criou The Movement (O Movimento) e pousou seu olhar na Europa, onde por muito tempo o único partido de ultradireita com músculo político era a Frente Nacional, de Marine Le Pen (que chegou a ganhar umas eleições europeias na França com o voto antiimigração da classe trabalhadora branca). 

O Movimento nasce em Bruxelas, nada é casualidade, pois a partir daí opera seu aliado Partido Popular Belga, e tem sua sede no Parlamento Europeu, o próximo objetivo de Bannon, que tentará criar um grupo de euroscéticos e populistas de ultradireita, para as eleições europeias de maio deste ano. 

Os primeiros que integrarão este Eurogrupo são os partidos dos primeiros ministros da Itália, Matteo Salvini, e Hungria, Viktor Orban, assim como o partido ultradireitista espanhol, Vox, cujo contato com Bannon é Rafael Bardají, ex-assessor da Fundação Faes, de José Maria Aznar. Vox acaba de obter 10% dos votos nas eleições em Andaluzia (cujo tamanho é similar a Portugal), sendo decisivo para desbancar o PSOE e dar a presidência ao PP, e esta pode ser a grande surpresa nas próximas eleições europeias na Espanha. 

Mas, além disso, os tentáculos do Movimento já têm ramificações na Alemanha (AfD), Áustria (FPO), Polônia (PiS), Suécia (SD), Finlândia (Perussuomalaiset) e Reino Unido (Ukip). 

O Eurogrupo que pode surgir depois destas eleições de maio poderia ser o segundo mais numeroso, com um programa radical de ultradireita contra a imigração, o Islã e o feminismo, e em defesa da segurança e das fronteiras. 

Com este novo mapa político na União Europeia, junto com os Estados Unidos de Donald Trump e o Brasil de Bolsonaro, se consolida uma tríade cheia de monstros. E atrás destes monstros, a figura de Steve Bannon cresce, articulando uma alternativa global de ultradireita e a globalização neoliberal. 

Em nossas mãos está construir não só uma resistência a este movimento, mas enfrentá-lo com propostas e alternativas a este mundo fragmentado e em crise em que nos tocou viver. 

(*) Katu Arkonada é cientista político, autor de livros relacionados à política latino-americana e membro da Rede de Intelectuais na Defesa da Humanidade. Este artigo foi publicado originalmente no jornal mexicano La Jornada.

Edição: Vermelho | Tradução: Mariana Serafini