Lava Jato

Delação de Antonio Palocci: quando a tortura é usada como moeda de troca

Depois de permanecer um ano e meio preso, ex-ministro decide falar o que a Lava Jato quer e recebe generosos benefícios

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Ex-ministro Antonio Palocci deve ficar livre, mesmo tendo confessado crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Ex-ministro Antonio Palocci deve ficar livre, mesmo tendo confessado crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. - Heuler Andrey/AFP

O ex-ministro Antonio Palocci pode gozar de generosos benefícios por conta de dois novos acordos de delação premiada, firmados com a Polícia Federal e os procuradores da República que atuam no Distrito Federal. Caso seja condenado, Palocci poderá ter apenas que prestar serviços comunitários e pagar uma multa pelos crimes cometidos.  

O ex-ministro foi preso em caráter preventivo em setembro de 2016, numa das fases da Operação Lava Jato. Em novembro de 2018, ele foi solto pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), graças ao primeiro acordo de delação, firmado com a Polícia Federal em Curitiba em março do ano passado e homologado pelo juiz federal de segunda instância, João Pedro Gebran Neto em junho. 

Para o advogado e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Márcio Tenenbaum, a divulgação das delações possuem objetivos claramente políticos. 

“Parece que elas são divulgadas a conta-gotas. A medida que os setores antipetistas, do sistema e do atual governo têm alguma dificuldade, divulgam partes da delação do Palocci para dificultar e prejudicar mais ainda o presidente Lula. A gente tem que lembrar que, coincidentemente, a divulgação da delação do Palocci ocorre exatamente quando o filho do presidente Jair Bolsonaro está sofrendo denúncias gravíssimas. A última denúncia que a própria Rede Globo divulgou [sobre Flávio Bolsonaro], insinuou que ele tem relação com milícias”.

O acordo permitiu reduzir pela metade a pena de Palocci, para nove anos e dez dias. Os novos acordos firmados oferecem a liberdade em caso de condenação, propondo apenas penalidades restritivas de direitos, como serviços comunitários. 

À época, a defesa do ex-presidente Lula afirmou que o ex-ministro tomou “a iniciativa de fazer afirmações sem qualquer relação com o processo, o nítido objetivo de atacar a honra e a reputação” do ex-mandatário. Em nota, o advogado Cristiano Zanin Martins disse ainda que “Palocci sabe que suas afirmações são mentirosas e que por isso não poderão ser confirmadas por qualquer testemunha. Por isso mais uma vez o ex-ministro recorre a narrativas que envolvem conversas isoladas com Lula”, sem provas testemunhais.

Em uma rede social, a senadora paranaense e presidenta do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, lembrou que o próprio Ministério Público havia rejeitado o acordo com o ex-ministro por falta de provas, rebateu as acusações de Palocci no depoimento e criticou o uso da delação como moeda de troca pela liberdade de criminosos confessos. “É isso que tem acontecido. Bandidos confessos mentem para conseguir a liberdade e ficar com parte do dinheiro roubado! Absurdo completo Palocci ir para casa e Lula continuar preso. Essa é a obra do Moro. Onde está a justiça?! Quantos ladrões Moro já liberou?!”, questionou. 

O conteúdo da delação de Antônio Palocci foi vazado à imprensa pelo então juiz de primeira instância, agora ministro da Justiça, Sérgio Moro,  em setembro de 2018, a poucos dias do primeiro turno das eleições presidenciais. 

Apesar de a Procuradoria-Geral da República haver feito ressalvas sobre a dimensão dos benefícios, a segunda delação foi homologada no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo ministro-relator da Operação Lava Jato, Edson Fachin. 

Tenenbaum critica a modus operandi da Operação Lava Jato no colhimento de delações premiadas. A manutenção de pessoas em prisões preventivas por longos períodos, no sentido de forçar a colaboração. 

“O que a delação premiada está nos colocando? Você delata uma determinada situação, ou uma determinada pessoa e em troca, eu lhe dou a liberdade. Ou em troca eu lhe dou uma prisão domiciliar. Ou então te dou 10% ou 20% do que eu digo que você roubou. Porque muitos delatores estão livres e gozando de parte do dinheiro pelo qual eles são acusados”. E conclui: “A verdade é a última coisa que eles estão interessados”. 

O terceiro acordo de delação do ex-ministro Antonio Palocci foi firmado em janeiro de 2019 com procuradores da Lava Jato e ainda precisa ser homologado pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, responsável pelo caso na 10ª Vara Federal de Brasília. Ele prevê ainda o pagamento de multa de R$ 37,5 milhões.

Edição: Luiz Felipe Albuquerque