Rio de Janeiro

DIREITOS HUMANOS

Defensoria Pública do Rio ouve moradores da Favela do Fallet sobre violência policial

Vizinhos e familiares dos 15 mortos na última operação relataram execuções e tortura

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Ouvidor-geral da Defensoria Pública do Rio destaca responsabilidade das instituições de apresentarem laudos de forma transparente
Ouvidor-geral da Defensoria Pública do Rio destaca responsabilidade das instituições de apresentarem laudos de forma transparente - Agência Brasil/Arquivo

Uma atividade na Favela do Fallet ouviu nesta terça-feira (12) os moradores sobre a ação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e do Batalhão de Choque (BPChq) que deixou 15 mortos na última sexta (8) em Santa Teresa e no Catumbi, região central do Rio de Janeiro.

Uma equipe de defensores públicos do estado e da União prestou assistência aos familiares das vítimas que denunciam execução e torturas. As mortes são alvo de três investigações paralelas, da Divisão de Homicídios da Polícia Civil, que apreendeu as armas dos policiais envolvidos, do Ministério Público, e de um inquérito aberto pela PM.

“O depoimento dos moradores é muito contundente nesse sentido de mutilações no corpo, facadas, abdômen aberto, traumatismo craniano. Então tem cenários na descrição dos moradores que são muito dramáticos”, disse Pedro Strozenberg, ouvidor-geral da Defensoria Pública do RJ. “O que cabe a nós é acompanhar e as instituições responsáveis apresentarem esses laudos de forma transparente para toda sociedade”, acrescenta. 

Segundo relatam moradores, 20 pessoas suspeitas de terem envolvimento com o tráfico de drogas fugiram da operação para dentro de um imóvel no Fallet e pretendiam se entregar. Neste local, onde a polícia alega que houve confronto, nove pessoas morreram encurraladas. Um vídeo mostra a viatura do Choque em frente à casa. Os corpos colocados na caçamba do veículo foram levados para o Hospital Municipal Souza Aguiar, no centro. 

“Entre os feridos, 13 vieram a óbito e dois estão internados. Durante a operação os policiais apreenderam quatro fuzis, 14 pistolas, seis granadas, três radiocomunicadores, além de carregadores e drogas”, informou a PM em nota. Questionada sobre as mortes dentro do imóvel, a corporação se limitou a dizer que instaurou inquérito e disponibiliza canais de comunicação para eventuais denúncias.

Em outras duas casas no mesmo terreno, vizinhos apontam quatro vítimas, além de uma morte na comunidade do Fogueteiro. Dois corpos encontrados na mata do Morro dos Prazeres no sábado (9) aumentam para 15 o número de mortes. No atestado de óbito de um deles, Mateus de Lima, de 22 anos, consta como causa da morte “lesão do polivisceral, ferimento transfixiante do tórax” com “ação perfuro contundente”.

A denúncia de tortura bate com a de outras mães. “Ainda por cima quebraram membros, o pescoço dele, crânio fraturado. Como teve troca de tiros do jeito que meu filho tá?”, disse outra que foi ao MPRJ. O corpo de Mateus foi encontrado por parentes enterrado na mata em Santa Teresa.

Com receio de retaliações, as testemunharam puderam contar sua versão dos fatos sem necessariamente se expor. As queixas também relatam abusos cotidianos por parte da polícia. “Se a gente for falar alguma coisa apanha na cara porque nós não prestamos. Esses meninos estão hoje sepultados, mas todos tinham direito à vida e direito de defesa. Eles vêm na comunidade para nos condenar”, disse uma moradora consternada. "A gente até pode ter filho na vida do crime, mas nossos filhos têm direito. Leva preso, mas não faz uma injustiça dessa".

"Começar o ano dessa maneira é preocupante, especialmente pra quem mora em favelas e periferias. Espero que isso sirva pra repensar formatos e fazer um esforço integral de redução da letalidade. É muito importante que a segurança pública preserve vidas. Se as nossas instituições de força tirarem vidas, isso produz uma situação de tensão social que só contribui pra insegurança", conclui o ouvidor-geral. 

Deputado quer homenagear a PM

O deputado estadual Rodrigo Amorim (PSL) propôs uma homenagem aos policiais do Choque na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) pela operação nas favelas do Fallet-Fogueteiro, Coroa e Prazeres. Amorim rasgou a placa da vereadora assassinada Marielle Franco durante a campanha eleitoral.

A moção de congratulação e aplausos diz que a atuação da Polícia Militar na última sexta (8) foi “irrepreensível e impecável”. Na tarde desta quarta (13), sete organizações e movimentos sociais protocolaram uma denúncia no Ministério Público Estadual sobre a solicitação do deputado.

“A moção visa legitimar e potencializar a política genocida e seletiva em curso no estado do RJ, afirmando que existem pessoas que podem ser mortas e executadas pelo Estado, o que viola nossa constituição federal, que não prevê pena de morte”, assinam o texto o Fórum Grito da Baixada, Rede de Movimentos contra a Violência, Frente Estadual pelo Desencarceramento, Maré 0800, Movimento Candelária Nunca Mais, Eu Sou Eu e Campanha Caveirão Não – Favelas pela Vida e contra as Operações. 

Edição: Vivian Virissimo