Quem mandou

Investigação confirma que assassinato de Marielle está ligado a sua atuação política

Polícia Civil e Ministério Público detalharam operação que levou a prisão dos acusados do crime nesta madrugada

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |

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Delegado Giniton Lages fala sobre os detalhes da investigação que prendeu acusados do assassinato de Marielle Franco
Delegado Giniton Lages fala sobre os detalhes da investigação que prendeu acusados do assassinato de Marielle Franco - Tomaz Silva | Agência Brasil

O delegado Giniton Lages, titular da Delegacia de Homicídios (DH) do Rio de Janeiro, detalhou na tarde desta terça-feira (12) a primeira fase da investigação que levou a prisão dos dois homens acusados pelo assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes. A detenção aconteceu nesta madrugada, dois dias antes de completar um ano do atentado. 

A Polícia Civil e o Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) prenderam o ex-policial militar Ronnie Lessa, acusado de ter efetuado os disparos que mataram a vereadora, e o motorista Elcio Queiroz, que dirigia o carro de onde partiram os tiros. De acordo com Lages, os investigadores têm certeza do envolvimento de Lessa e Queiroz no crime há cerca de três meses.

O delegado apontou ainda que a investigação contou com a participação exclusiva de 47 policiais, ouviu mais de 230 testemunhas no caso e recebeu 190 denúncias sobre o crime até agosto de 2018. Lages classificou o crime como “sofisticado” e “perfeito”.

Segundo o pronunciamento do titular da DH, o carro modelo Cobalt que foi utilizado no crime saiu do Quebra-Mar na Barra da Tijuca, na zona oeste, em direção a Rua dos Inválidos, onde a vereadora participava de um evento. Lá os assassinos ficaram de “tocaia” aguardando o momento em que Marielle sairia.

“Entrou uma informação para nós dizendo que Ronnie Lessa estava no carro que saiu do Quebra-Mar e quando nós visitamos o banco de imagens, de fato estava o carro deixando o Quebra-Mar e isso nos obrigou a traçar o perfil psicossocial do apontado [Ronnie Lessa]”, relata.

Lages detalha que Lessa começou a ter importância após um tiro que ele recebeu no pescoço logo depois do assassinato de Marielle. A tentativa de homicídio ocorreu num restaurante, no Quebra-Mar.

“Não houve uma tentativa de eliminá-lo. A dinâmica do disparo que ele recebeu apresenta detalhes de uma tentativa de roubo, única e exclusivamente, e que o autor disparou porque percebeu que ele [Ronnie] estava armado e o outro colega próximo, investigado no caso Marielle, disparou contra um dos autores. Foi ultrapassada a possibilidade de queima de arquivo”, explica.

Segundo o delegado, haverá uma segunda etapa da operação, em que serão investigados possíveis mandantes do crime, além do paradeiro do carro utilizado no dia do assassinato.

Motivação política

O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPERJ) também se pronunciou sobre o caso após quase um ano de investigação. De acordo com as promotoras Simone Sibílio e Letícia Petriz, que estão a frente da investigação, os motivos que levaram ao assassinato de Marielle e Anderson estavam ligado as causas que a vereadora defendia.

“A motivação abjeta é decorrente da atuação política de Marielle, mas não repele o mando. Estamos numa primeira fase. Nenhuma linha é descartada”, afirma Sibilio que também é coordenadora do GAECO.

De acordo com o Ministério Público, ainda não há provas contundentes da relação de Ronnie Lessa com a milícia, mas há indícios de que ele tenha envolvimento com grupos paramilitares. O órgão já investiga o ex-PM por ligação à contravenção e prática de homicídios.

A operação Lume que resultou na prisão de Queiroz e Lessa não seria deflagrada nesta terça-feira e sim amanhã, segundo o MP. Porém, devido a um suposto vazamento, a opção foi por adiantar a operação.

“Elcio foi preso portando munições e arma. Ronnie Lessa possuía um verdadeiro arsenal em casa. O nome de Lessa surge como um possível mercenário sim”, destaca Sibilio.

As prisões ocorreram por volta das 4h30 da manhã. Lessa e Queiroz foram pegos saindo de casa na madrugada.

Quem são os acusados?

Ronnie Lessa mora no mesmo condomínio que Jair Bolsonaro, na Barra da Tijuca. O ex-PM passou pela Polícia Civil e também integrou o Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) e ficou conhecido por executar crimes de mando e pela eficiência e frieza em puxar o gatilho.

Em 1998, Lessa recebeu uma homenagem na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). A mostra de admiração foi concedida pelo ex-deputado Pedro Fernandes Filho, já falecido, e avô de Pedro Fernandes Neto (PDT), atualmente secretário de Educação do governador Wilson Witzel (PSC). O autor da moção também é pai da vereadora Rosa Fernandes (MDB).

Segundo registros, ele seria homenageado “pela maneira profissional como vem pautando sua vida profissional como policial militar”.

Lessa foi afastado da polícia após um atentado a bomba que sofreu no Rio de Janeiro, há 10 anos. De acordo com a investigação na época, a motivação para o ataque teria sido uma briga entre facções criminosas.

A explosão ocorreu quando o policial passava com o seu carro blindado, uma picape Hilux prata, pela rua Mirinduba, a poucos metros do 9ª BPM, que fica em Rocha Miranda, zona norte carioca.

Já Elcio Queiroz, acusado de dirigir o Cobalt utilizado na ação que matou Marielle e Anderson, foi expulso da PM em 2016 por fazer segurança ilegal em uma casa de jogos de azar no Rio.


 

Edição: Aline Carrijo