Agrotóxicos

Júri nos EUA considera que o glifosato, herbicida mais usado no Brasil, causa câncer

Corte da Califórnia viu relação causal entre câncer e a exposição ao Roundup, herbicida da Bayer à base de glifosato

Brasil de Fato | São Paulo |

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Glifosato é o herbicida químico mais utilizado na agricultura brasileira
Glifosato é o herbicida químico mais utilizado na agricultura brasileira - Josh Edelson/AFP

Por unanimidade, um júri dos Estados Unidos considerou que o herbicida à base de glifosato da empresa Bayer, o Roundup, foi o causador do linfoma não-Hodgkin no cidadão californiano Edwin Hardeman. O julgamento ocorreu nesta terça-feira (19) na corte federal de São Francisco. A decisão abre caminho para que o tribunal determine se a Monsanto, unidade da Bayer, terá que pagar uma indenização a Hardeman pelo dano causado. 

Segundo a advogada e integrante da organização Terra de Direitos, Nayara Bittencourt, embora o Brasil tenha soberania para tomar decisões no campo jurídico, a sentença da corte de São Francisco deveria acender um sinal de alerta nas autoridades brasileiras sobre os riscos da ampla utilização desse produto na agricultura. 

“Eu acredito que, tendo esse precedente no panorama internacional, especialmente nos Estados Unidos, que é um país onde também tem um agronegócio muito forte e tem um alto índice do glifosato, do Roundup, desses produtos altamente tóxicos, significa que o Judiciário brasileiro, especialmente as autoridades brasileiras que estão no momento de avanço da flexibilização de agrotóxicos, de ingredientes ativos, vão ter que de alguma forma olhar para esse tipo de decisão e considerar nas análises internas”, afirma. 

Bittencourt acrescenta que o governo de Jair Bolsonaro tem tratado de flexibilizar os mecanismos de controle do uso de agrotóxicos no Brasil. Segundo ela, somente este ano, mais de 80 novos produtos adquiriram autorização de uso no país. O quadro pode piorar se for aprovado o chamado “pacote do veneno”, uma série de medidas legais que tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de facilitar o registro de novos químicos para o uso agrícola no Brasil. 

“Com certeza, ficou muito mais fácil de se aprovar tanto ingredientes ativos como os próprios produtos finais no Brasil. Isso pode piorar com o ‘pacote do veneno’, esse projeto que está em trâmite na Câmara dos Deputados. Porque vai ser legalizado, por exemplo, a autorização para registros temporários, vai ser criada quase uma indústria de registros temporários de agrotóxicos, porque o Estado não vai dar conta de cumprir os prazos que o poder legislativo estabelecerá para a autorização do registro de agrotóxicos”, lembra. 

O Roundup é um herbicida à base de glifosato utilizado no combate de pragas na agricultura. Em 2017, o governo da França anunciou que o produto seria banido do país em um prazo de três anos, em resposta aos danos à saúde das populações e ao meio ambiente.

Enquanto isso, no Brasil, o glifosato é o herbicida de uso mais utilizado na agricultura. Telma Nery, médica sanitarista e pesquisadora do tema, afirma que o próprio Ministério da Saúde já publicou pesquisa relacionando o uso do glifosato com intoxicações agudas provocadas em seres humanos:

“O próprio Ministério da Saúde publicou em dezembro de 2018 uma análise sobre o uso do glifosato no Brasil nos últimos seis anos e correlacionando com as intoxicações agudas. Foi a primeira vez que um órgão federal fez isso, além das instituições ligadas a movimentos sociais que identificaram não só as intoxicações agudas, mas doenças hepáticas, câncer, enfim”. 

Nos Estados Unidos, mais de 11 mil processos estão relacionados ao uso do glifosato. 

A Bayer se pronunciou sobre o resultado do julgamento por meio de nota, afirmando que a decisão do júri “é decepcionante”, de acordo com os interesses da empresa. “Estamos confiantes de que as evidências na fase dois mostrarão que a conduta da Monsanto foi apropriada e que a empresa não deve ser responsabilizada pelo câncer do Sr. Hardeman”, disse o comunicado. A empresa argumenta que realizou estudos e avaliações regulatórias que afirmam a segurança do produto para uso humano. 

Edição: Daniel Giovanaz