Paraná

Privatização na saúde

Terceirização de UPAs em Curitiba foca no lucro, retira pediatria e outros serviços

Especialista afirma que experiências em outras cidades trouxeram mais gastos e casos de corrupção

Curitiba |

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Servidores e sindicato fazem manifestação contra terceirização de UPAs
Servidores e sindicato fazem manifestação contra terceirização de UPAs - Giorgia Prates

Apesar das manifestações contrárias feitas por profissionais da saúde e servidores, na última quarta-feira (19), o Conselho Municipal da Saúde de Curitiba aprovou por 19 votos a 9 ampliar a terceirização na administração das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Com esta votação, as unidades do Boa Vista, Cajuru e Sitio Cercado serão administradas por uma OAS, organizações sociais que prestam serviço a prefeituras. Isso já acontece na UPA do CIC e, por esse modelo, a unidade não tem mais pediatria, não oferece exames de sangue, raio X e não reduz custo para a prefeitura.
Especialistas, servidores e vereadoras, em entrevista ao Brasil de Fato Paraná, foram unânimes em dizer que o projeto aprovado está focado no lucro, e não na qualidade de atendimento. Para a servidora e integrante do Conselho Estadual da Saúde, Irene Rodrigues, “temos muita dificuldade em entender por que um serviço feito por organizações sociais custará mais barato. E que esse barato não afeta a qualidade, em especial quando tratamos de urgência e emergências. A prefeitura deveria ter ouvido a população e fazer o debate da qualidade do serviço, e não do custo. Uma vida não tem preço.”

Sem pediatria
Irene alerta que o projeto extingue a pediatria nas UPAS, o que trará problemas para a cidade. “Vão entregar essas unidades sem garantia de atendimento pediátrico. E um dos gargalos da saúde em Curitiba é o atendimento pediátrico.” Em maio de 2019, o Hospital Pequeno Príncipe teve que interromper o atendimento por 48 horas devido à grande procura no setor SUS.

Desmonte do serviço público
Para a vereadora Professora Josete Dubiaski (PT), que vem acompanhando o tema, o modelo ultraliberal dessa proposta é o mesmo do governo Bolsonaro. “É o desmonte do serviço público e a extinção das políticas públicas de saúde o que está implícito nessa proposta.” Já para a vereadora Maria Leticia (PV), que é médica e acompanhou a reunião do Conselho Municipal de Saúde, “a transformação das UPAs em OAS é algo muito equivocado da gestão. Uma estrutura que não reconhece o servidor municipal, ou seja, não lhe garante os seus direitos, trará problemas no atendimento. ”No modelo de terceirização, não há garantia de direitos trabalhistas, precarizando também a situação do trabalhador da saúde”, afirma.

Mais gastos e menos qualidade
“É preciso pensar no impacto que isso vai trazer para a gestão pública, ou seja, nos estados que transferiram parcela do seu sistema de saúde para organizações sociais, há pesquisas de instituições com bastante credibilidade que demonstram que se mostrou mais caro que a administração direta. Ou seja, quem for administrar ganha em cima do serviço prestado”, explica Manoela Lorenzi, especialista em saúde da família do trabalhador. Organizações como essas estão entre as maiores empresas do país e movimentaram R$ 22,9 bilhões entre 2009 e 2014, segundo estudo publicado no ano passado pela Universidade Federal de Pernambuco.
Segundo a especialista, “a justificativa para terceirizar vem de uma estratégia com um subfinanciamento, ou seja, recursos insuficientes para saúde e por consequência ineficiência da gestão.“ Manoela também cita que foi observado em experiências em outras cidades que a terceirização traz mais facilidade para corrupção. “Não dá para deixar de falar que são inúmeras as notícias de desvios de recursos detectados onde esses modelos foram implantados: serviços cobrados que nunca foram ofertados para a população, fraudes em processos seletivos e conluio com gestões públicas mal-intencionadas.”
Em fevereiro de 2019, foi noticiado um desses casos, em que uma organização criminosa teve suspeita de desviar mais de R$ 1,6 bilhão de dinheiro público destinado à saúde na Paraíba e em outros dois estados. O grupo atuava através de duas organizações sociais.
 

Edição: Frédi Vasconcelos