Assassinatos

Familiares de vítimas de ações policiais debatem pacote de Moro com Rodrigo Maia

Além de críticas da sociedade civil, "Pacote Anticrime" do ministro da Justiça tem publicidade suspensa por juiz do TCU

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Bruna Silva, mãe do garoto assassinado Marcus Vinícius; garoto foi morto quando ia para a escola
Bruna Silva, mãe do garoto assassinado Marcus Vinícius; garoto foi morto quando ia para a escola - Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Uma comitiva de familiares de vítimas letais de ações policias foi à Câmara dos Deputados, nesta terça-feira (8), se manifestar de forma contrária a projetos legislativos que ampliam as hipóteses de excludente de ilicitude, ou seja, previsões nas quais possíveis homicídios não sejam tratados como crimes. O grupo, formado por pessoas de diversos estados brasileiros, foi recebido pelo presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que ouviu os relatos dos representantes da Rede Nacional de Mães e Familiares de Vítimas do Terrorismo do Estado.

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Após a reunião com Maia, uma das integrantes da comitiva, Bruna Silva, moradora do complexo da Maré (RJ), que perdeu o filho Marcus Vinícius, de 14 anos, quando este foi alvejado indo para o colégio, afirmou à imprensa que a violência do Estado é uma constante na vida dos moradores de favelas. Ela trouxe um posicionamento contrário aos projetos que visam dar uma "licença pra matar" em abordagens policiais.

“Somos contra essa lei que quer nos matar. Já nos matam. Botando no papel, vão matar dobrado. Essa lei mira diretamente no pobre. Ela já foi feita para o pobre. É o pobre que vai morrer a caminho da escola, dentro de casa. Nossos filhos já foram, mas a gente não quer que outros filhos se percam também”, disse Silva.

A ideia de ampliar as hipóteses legais de excludente de ilicitude foi derrubada pelo Grupo de Trabalho (GT Penal) que analisa o conjunto de propostas enviada para o Congresso pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, o que foi apelidado pelo governo de “Pacote Anticrime”. Em paralelo, proposta semelhante é debatida em um Projeto de Lei que ficou conhecido como “PL Ana Hickman”. 

“Vocês sabem que ela já foi derrubada no GT Penal. Mas ela pode voltar no Plenário. Há um projeto tramitando na CCJ [Comissão de Constituição e Justiça] em velocidade relâmpago, que é o 7883, que tenta trazer a mesma terminologia que já foi derrubada no GT”, explica Silvia Souza, da organização de direitos humanos Conectas, que acompanhou a ida da comitiva de mães e familiares à Câmara. 

Projetos

O chamado PL Ana Hickman faz referência a um caso envolvendo a apresentadora de televisão. Seu cunhado, Gustavo Henrique Belo Correia, matou, em 2016, um homem que havia invadido o quarto de hotel onde estavam e tentara matar a celebridade. 

No mês passado, Correia foi absolvido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais por unanimidade, sob o argumento de legítima defesa, já existente na legislação penal. Ainda assim, a situação inspirou parlamentares a proporem projetos de lei com o objetivo de ampliar as hipóteses de excludente de ilicitude. 

Na Câmara, o Pacote Moro não tem recebido prioridade por parte de Rodrigo Maia, que, recentemente, voltou a criticar o ministro da Justiça, afirmando que o ex-magistrado tem “estratégia permanente de acuar as instituições”. No começo do governo Bolsonaro, a troca de ataques entre o presidente da Câmara e Moro chegou a ser constante.

Nova derrota de Moro

Nesta terça-feira, Moro sofreu um novo revés: um ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) proferiu uma decisão individual pela suspensão da campanha publicitária em torno do Pacote. O órgão deve se reunir nesta quarta-feira (9) para avaliar o caso. 

O ministro Vital do Rêgo atendeu a um pedido de parlamentares da oposição, que entendem que, diante das restrições orçamentárias impostas no momento, a campanha -- estimada em R$ 10 milhões -- não é justificável. 

“O mais grave é que, no orçamento de 2019, só há recursos de publicidade para publicidade de utilidade pública. Utilidade pública é publicidade para esclarecer a população acerca de algum risco iminente, por exemplo, e não se trata do que está. Há um desrespeito ao orçamento da União”, aponta o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), um dos signatários da representação.   

Rêgo entendeu que as peças desrespeitam a noção de publicidade institucional, cujo objetivo é "informar, educar, orientar, mobilizar, prevenir ou alertar a população para a adoção de comportamentos que gerem benefícios individuais e/ou coletivos”. Assim, em sua visão, não é justificável informar a população sobre uma proposta que ainda não foi aprovada pelo Congresso.

"Isso porque, como qualquer projeto de lei, o que se tem são teses abstratas que serão alteradas pelos legitimados a representar a população. Assim, não se poderia falar que tal campanha tem por objeto educar, informar ou orientar já que ainda não há uma regra decidida e aprovada pelo Poder Legislativo que reúna condições para tanto", diz trecho da decisão. 

O plenário do TCU ainda deve se reunir para avaliar o caso coletivamente. Já o secretário especial de Comunicação da Presidência, Fábio Wajngarten, tem 15 dias para prestar esclarecimentos sobre a campanha publicitária.  ​

Edição: Vivian Fernandes