O governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) demorou um mês para se manifestar sobre o vazamento de petróleo em todo o litoral do Nordeste, mas foi rápido para encontrar um “suspeito”. Baseado em suposto relatório da Petrobras e da Marinha – que está sob sigilo e não foi divulgado oficialmente – o governo informou que o óleo está vindo “muito provavelmente da Venezuela”, sem explicar como teria chegado ao litoral brasileiro.
A hipótese de um vazamento direto do país vizinho, no entanto, não poder ser levada a sério, já que as coordenadas geográficas da Venezuela levariam o petróleo para bem longe do Brasil.
“Seria impossível vir da Venezuela, porque lá predomina a corrente do Caribe, que vai em direção ao Golfo do México, e os ventos alísios do Norte, que vão para a direção oeste”, afirma o oceanógrafo Thiago Oliveira.
Ao mesmo tempo em que a acusava a Venezuela, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse no começo da semana, também sem esclarecer a fonte de suas afirmações, que o óleo “veio por um navio estrangeiro, ao que tudo indica, navegando próximo à costa brasileira, com derramamento acidental ou não”.
Segundo o Ibama, que trabalha na limpeza das praias, até agora foram retiradas 130 mil toneladas de óleo nos quase 140 pontos de contaminação. O volume equivale à capacidade de um navio petroleiro, entre 140 mil a 175 mil toneladas de óleo cru.
A área atingida tem cerca de dois mil quilômetros de extensão e vai do norte da Bahia ao meio do litoral do Maranhão
A demora do governo em agir pode estar relacionada ao fato de o monitoramento das águas brasileiras ser feito, de fato, pela IV Frota Naval do EUA, e não pela Marinha Brasileira, segundo afirma o cientista político William Nozaki.
“A dificuldade da Marinha em monitorar nossa costa é resultado de uma política que terceirou a proteção da costa brasileira para a IV Frota Naval dos EUA e que desmontou a nossa indústria naval. Da mesma forma, a dificuldade de o Ibama e outros órgãos competentes de apresentar uma avaliação conclusiva sobre o ocorrido é resultado de uma política que abriu mão de zelar pelos nossos recursos naturais e águas para se ocupar de interesses predatórios do agronegócio e do extrativismo”, critica.
Meio Ambiente
A primeira vítima visível do derramamento foi uma tartaruga verde marinha adulta encontrada morta no dia 1 de setembro, na praia do Sabiaguba, em Fortaleza (CE).
Desde então, até 8 de outubro, as manchas de petróleo cru causaram a morte de mais 14 tartarugas e atingiram outros 177 animais.
Além do litoral, a chegada do óleo ao rio São Francisco também preocupa técnicos e ambientalistas.
O rio, com uma das principais bacias hidrográficas do Brasil, também foi atingido pelo vazamento. Na quarta-feira (9), uma comitiva formada por técnicos do Ibama, membros do Comitê do Rio São Francisco e a Marinha fiscalizou a situação da foz do São Francisco, na divisa entre Sergipe e Alagoas.
“Foram encontrados, já no rio, tanto do lado de Alagoas como de Sergipe, focos de contaminação. A equipe de Emergência Ambiental do Ibama está na região. Como não sabemos a origem, não tem como barrar o avanço. A nossa preocupação é com as comunidades ribeirinhas”, disse Maciel Oliveira, vice-presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.
Na foz do Rio São Francisco, o mar avança até 12 quilômetros com a maré alta. É uma região onde a economia gira em torno da pesca do camarão, com desova de tartarugas e reprodução de diversas espécies de peixes marinhos e de água doce.
Edição: João Paulo Soares