Lava Jato

"Delação de presos sugere tortura", afirma Gilmar Mendes citando ministro do STJ

Em palestra no Senado, magistrado disse ainda que espera resolução do caso sobre prisão após segunda instância

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

Ouça o áudio:

"Acho que é preciso ter segurança jurídica nessa quadra”, afirmou Mendes nesta quinta, ao falar sobre prisão após segunda instância
"Acho que é preciso ter segurança jurídica nessa quadra”, afirmou Mendes nesta quinta, ao falar sobre prisão após segunda instância - Antonio Cruz/Agência Brasil

Em palestra feita nesta quinta-feira (17), no Senado, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes criticou a Lei nº 12.850/2013, que instituiu a delação premiada no país. Um dos principais mecanismos utilizados pela operação Lava Jato, a prática consiste na aceitação formal da colaboração de réus no processo de investigação criminal e tem sido comumente utilizada para entregar possíveis comparsas do acusado.

Ao discorrer sobre o tema da criminalização da política, Mendes disse que a legislação teria sido aprovada como “tábua de salvação para o combate à corrupção”, mas sugeriu que a medida trouxe como ressonância um conjunto de problemas.

“Hoje nós vemos que faltaram [na lei] normas de organização e procedimento. Ainda anteontem, o ministro Nefi Cordeiro dizia, no STJ [Superior Tribunal de Justiça], que a prisão do delator ou a delação feita por alguém preso, de fato, sugere uma tortura. E nós estamos agora, com as revelações do Intercept, apreendendo o que se fez nesse ambiente”, afirmou.  

Crítico da operação, o ministro também lembrou uma das denúncias feitas pelo veículo na série de reportagens conhecida como “Vaza Jato”, que vem sendo publicada desde junho deste ano. Ele fez menção indireta à pressão da equipe da operação sobre a filha do empresário luso-brasileiro Raul Schmidt, alvo da Lava Jato, para tentar convencer o acusado a se entregar.

“‘Delate, fulano’ ou ‘delate, sicrano’ ou ‘talvez a gente prenda a filha dele porque, assim, ele fica mais sensível’. Quer dizer, tudo isso sugere que tem que ter um outro tipo de tratamento [para tais casos]”, (15:05) acrescentou, ao citar diálogos trazidos à tona pelo Intercept

“Esse é um debate que muitos estão tendo e, [sobre] os abusos que vêm sendo revelados nas delações, há alguma sugestão que já tramita hoje aqui na própria Câmara ou no Senado no sentido de proibir a delação daquele que está preso”, destacou.

O ministro também comentou a questão da preservação do Poder Legislativo no sistema institucional do Brasil e se disse preocupado com o envio de policiais ao Congresso Nacional para cumprimento de medidas de busca e apreensão em gabinetes. No mês passado, por exemplo, a situação se repetiu e teve como alvo o líder do governo de Jair Bolsonaro (PSL) no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).

“Nós temos uma tradição de interrupção dos ciclos democráticos entre nós. A Constituição Federal já está vivendo o seu limite em termos temporais. Trinta anos, normalmente, já é um período de estresse nas instituições, e é o mais longo período de normalidade institucional da República. Agora, você mandar polícia para o Congresso em ação ostensiva passa uma imagem extremamente negativa sem que haja necessidade”, defendeu.

Julgamento

Questionado por jornalistas a respeito da expectativa para o julgamento do STF sobre a legalidade de prisão após condenação em segunda instância, que se iniciou nesta quinta-feira (17), Gilmar Mendes se limitou a confirmar a projeção de que a Corte deve se concentrar nas sustentações orais nesta semana, deixando a retomada do tema para a próxima semana, a partir do voto do relator do caso, ministro Marco Aurélio.  

“Acho que esse tema precisa ser definido. Acho que é preciso ter segurança jurídica nessa quadra e acho que vamos ter isso definido agora”, disse.

Edição: Rodrigo Chagas