Colapso

Sistema de saúde de Altamira entrará em colapso, alertam médicos

Profissionais fazem apelo por respiradores, condições de trabalho e leitos no maior município do Brasil

Belém (PA) | Brasil de Fato |

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Hospital Regional Público da Transamazônica, em Altamira (PA). Com 135 casos da doença Altamira – maior município do país – ocupa a 11º posição em relação ao contágio entre os municípios paraenses  - Pró-Saúde

O Pará ultrapassou mil vítimas da covid-19. Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde (Sespa), até esta quinta-feira (14), foram registrados 1.063 mortes em decorrência do novo coronavírus.

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Com isso, superou o Maranhão tanto em número de casos, quanto de mortos, tornando-se o sexto estado brasileiro mais letal para a covid-19. Segundo dados da Sespa, com 135 casos da doença Altamira – maior município do país – ocupa a 11º posição em relação ao contágio entre os municípios paraenses. 

Com apenas nove leitos de UTI, para atender a população estimada em 400 mil pessoas, que engloba outros oito municípios e contabiliza 260 casos e 12 mortes, médicos em Altamira (PA) apontam para a iminência do colapso no sistema de saúde do município.

"Até agora o que conseguimos fazer foram improvisos, como transformar os únicos cinco leitos de UTI Pediátrica em leitos para adultos com a covid-19, diminuindo a já deficiente capacidade de atendimento a crianças em estado grave na região", denunciam médicos em um texto assinado por 68 profissionais que atuam na região. No documento eles fazem um apelo por respiradores, condições de trabalho e leitos. 

O problema agora está em nossa casa e não estamos preparados. Não temos respiradores, nem profissionais suficientes, não há equipamentos de proteção individual para os trabalhadores da saúde, o isolamento social voluntário não ocorreu e não foi aumentada a capacidade de atendimento na rede de alta e média complexidade para dar conta de demanda.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Altamira tem uma área de 159.533,328 km², o que a torna a maior cidade brasileira. Além disso, o município é referência  no atendimento aos povos indígenas e populações tradicionais na região.

Ao todo, são 11 Terras Indígenas, segundo o Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI), além de três Reservas Extrativistas.

Altamira enfrentou embates para aderir ao isolamento social. Foi preciso o Ministério Público Federal (MPF) ajuizar uma ação civil pública no dia 30 de março para impedir a flexibilização do decreto municipal, que determinava o fechamento de serviços não-essenciais e a obrigatoriedade do isolamento social. 

O prefeito do município, Domingos Juvenil (MDB) chegou a anunciar depois de reunião com comerciantes e empresários locais, o retorno do comércio “em sua plenitude”. Contudo, o pedido do MPF foi acatado pela justiça e cumprido pela prefeitura. 

Reivindicações

Um médico que assinou a carta que pede por soluções conversou com o Brasil de Fato, mas não quis se identificar para não sofrer retaliação. Ele disse que Altamira enfrenta muitos problemas, mas que os gargalos atuais – para o enfrentamento da covid-19 – são falta de leitos de UTI, falta de equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e falta de medicação nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) para tratar pessoas na fase inicial da doença de forma que ela não progrida.

"Chegaram três respiradores enviados pelo governo do estado inadequados para atender pacientes graves e que não serão utilizados. Os 10 leitos anunciados como 'doação' pela Norte Energia no Jornal Nacional, têm previsão de entrega apenas para o mês de julho, quando será muito tarde. Cabe ressaltar que a empresa descumpriu diversos compromissos fundamentais, previstos como condicionantes para instalação e funcionamento da Usina Hidrelétrica de Belo Monte", dizem os médicos.  

A carta assinada por 68 médicos de Altamira e região (PA) é endereçada às secretarias municial e estadual de Saúde, Conselho Regional de Medicina do Pará (CRM-PA), à Associação Beneficente de Assistência Social Hospitalar Pro Saúde, à empresa Norte Energia S. A, ao Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) e Ministério Público Federal (MPF).

O Brasil de Fato entrou em contato com todas as organizações citadas e aguarda retorno. Com relação aos respiradores, o Pará enfrenta uma crise depois que comprou ventiladores pulmonares da China, que não funcionam. A Justiça bloqueou os bens dos empresários e um deles foi preso na última na última quarta-feira, 13.

Em nota, a assessoria de comunicação do CRM-PA disse que teve conhecimento da carta por meio da imprensa e que ela não foi protocolada no CRM-Pará, por meio da Delegacia Regional do CRM-PA em Altamira.

"O CRM-PA ressalta que médicos que atuam em unidades de saúde (postos, UPAs, prontos-socorros e hospitais, entre outros) que oferecem assistência a casos confirmados e suspeitos de covid-19 podem e devem informar falhas na infraestrutura de trabalho oferecida por gestores (públicos e privados) por meio da plataforma online desenvolvida pelo CFM, que permite que o médico, de qualquer lugar do país, comunique a situação que encontrou em seu local de trabalho", diz o texto.

O MPF disse que vai anexar a carta aos argumentos que a instituição e outros órgãos de fiscalização apresentaram à Justiça Federal em processo já em andamento e nos demais procedimentos por meio dos quais o MPF vem cobrando dos gestores públicos melhorias na infraestrutura de materiais e recursos humanos no combate à covid-19 no Pará e em Altamira.

Alem disso, o MPF e o Ministério Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) ajuizaram, na Justiça Federal, a liberação urgente de R$ 6 milhões do Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável (PDRS) do Xingu para o combate à covid-19 em Altamira e região.

O MPPA afirma que uma nova ação civil sobre a pandemia será protocolada nesta sexta-feira (15) e será divulgada pela assessoria do órgão.

A Norte Energia disse que todos os equipamentos e materiais que se propôs a disponibilizar para  população do entorno da Usina Hidrelétrica Belo Monte foram totalmente adquiridos.

"Há, de fato, um grave problema da parte de fornecedores de modo geral, decorrente da intensa demanda frente ao momento atual. Tal dificuldade não afeta apenas a Norte Energia; atrasos de entregas aos Poderes Públicos e empresas solidárias são frequentemente divulgados. Não obstante, a empreendedora de Belo Monte já vem envidando esforços junto a seus fornecedores no sentido de antecipar as datas de entrega dos equipamentos e materiais. Por fim, a Norte Energia renova a sua absoluta solidariedade com a população do entorno da Usina e reafirma as doações que representam mais de R$ 6 milhões em investimentos para o reforço do combate à pandemia na região. Com estas ações, a Norte Energia demonstra seu compromisso com a região onde está situada a Usina, ao tempo que ressalta que, junto aos seus colaboradores, vem seguindo as recomendações das autoridades de saúde e adotando todos os cuidados para assegurar a geração de energia – serviço essencial e importante contribuição de Belo Monte ao país nesse momento tão complexo que o mundo todo atravessa", diz a nota.

O Hospital Regional Público da Transamazônica (HRPT) disse em nota que as denúncias não se referem à unidade. Disse ainda que desde o início da pandemia, o HRPT conta com 36 leitos de internação para tratamento de pacientes suspeitos ou confirmados para a covid-19, sendo 16 leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) e 20 leitos clínicos. Desse total, a taxa de ocupação nesta até essa quinta-feira (14/5), atingiu o índice de 77,7%. Em relação aos insumos e medicamentos, o hospital está com o seu estoque abastecido. 
  
Sobre a doação enviada ao Regional, pelo Consórcio Norte Energia, a direção informa que no mês de abril o hospital recebeu 500 macacões impermeáveis de segurança para os colaboradores que estão atendendo na linha de frente contra o coronavírus. Nesta quarta-feira (13/5), o HRPT recebeu novos equipamentos doados pelo Consórcio que já estão em uso nos leitos de Enfermaria. 
 
Em relação aos dez leitos de UTI doados pela Norte Energia, cabe mencionar que essa doação será concretizada por meio da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (Sespa), responsável por direciona-los ao hospital, tão logo sejam recebidos.

Edição: Leandro Melito