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O povo de Teresina (PI) tem um segredo para fazer chover que é único

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Nesta semana, Mouzar Benedito volta a falar de suas aventuras nordestinas - Foto: Craig Whitehead/Unsplash
Perguntei se no hotel tinha água quente, ele respondeu: "Moço, no Piauí não existe água fria não..."

Tenho saudade do tempo em que viajava de carona. Sem dinheiro suficiente para viajar de ônibus e dormir em bons hotéis, sempre que possível viajava de carona e dormia em espeluncas. E meu destino favorito sempre foi o Nordeste.

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No fim, foi melhor assim, porque conheci melhor o povo.

Era um tempo em que os caminhoneiros não tinham medo de assaltos como atualmente. E gostavam de uma companhia para conversar na viagem, pois passavam semanas dirigindo. Davam carona com gosto.

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Viajei muito de carona no final dos anos 1960 e nos anos 1970. Numa dessas viagens, com dois amigos, tínhamos como meta chegar a São Luís do Maranhão.

Quando chegamos em Teresina, capital do Piauí, resolvemos parar uns dias na cidade e precisávamos de um hotel bem barato. Fomos para perto da estação rodoviária, com mochilas nas costas, e logo estávamos rodeados por donos ou empregados de hotéis. Um deles ofereceu seu hotel, com diária de 15 cruzeiros por pessoa.

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Outro gritou: “No meu é 12”. Em um outro era 10 cruzeiros, e foram baixando, até que um gritou que no hotel dele 6 cruzeiros por pessoa. Íamos aceitar esse, quando um outro gritou: “No meu é 6, com café da manhã”.

Fomos para esse, se não me engano o nome dele era Hotel São Cristóvão. Só tenho certeza de que tinha nome de santo. No caminho, resolvi brincar com o dono. Mesmo com aquele calorão de trinta e tantos graus, falei:

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— Tem uma coisa: eu não tomo banho de água fria. No seu hotel tem água quente?

Ele sorriu e falou:

— Moço, no Piauí não existe água fria não...

Ri, gostei do humor dele. No hotel, ficamos com mais uns três ou quatro sujeitos num quarto grande, dormindo em redes.

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No dia seguinte, nas margens do rio Parnaíba, olhando para a outra margem, que já é estado do Maranhão, via a cidade de Timon (MA) e resolvemos ir lá. Fomos a pé. Mal atravessamos a ponte, caiu um baita pé d’água, ficamos ensopados, mas continuamos o passeio.

Estranhei que só choveu em Timon. Nem um pingo d’água em Teresina.

Quando voltamos para o hotel, comentei com o dono e vi que era um maranhense gozador.

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Falei pra ele que achei esquisito chover só do lado maranhense, ele disse que acontecia muito isso e brincou:

— Piauiense quando quer ver chuva vai pra Timon...

Edição: Lucas Weber