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Sem emprego e prestes a perder a casa: a realidade das mães da Ocupação dos Queixadas

Além do medo do despejo, previsto para os próximos 90 dias, moradores sofrem com ameaças dos supostos proprietários

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Desempregada e sem condições de pagar aluguel, Ângela da Silva é uma das moradoras da Ocupação dos Queixadas, que está sob ordem de despejo prevista para os próximos 90 dias. - Vanessa Nicolav

Cerca de 100 famílias da Ocupação dos Queixadas, localizada em Cajamar, região metropolitana de São Paulo, podem ser desalojadas durante os próximos 90 dias, em pleno período de pandemia. Criada em 2019, por trabalhadores desempregados, principalmente mães com crianças pequenas e idosos, a ocupação recebeu ordem de reintegração de posse proferida pela juíza de primeira instância Gina Fonseca Corrêa, na última semana de setembro deste ano. 

Uma das pessoas que pode ficar sem casa durante o processo é Cecília Nascimento, de 83 anos. Moradora da comunidade desde o seu início, ela conta que buscou abrigo na ocupação após não conseguir mais dar pagar as contas que vinham aumentando a cada mês. 

“Com o valor dos aluguéis, não dá. Porque ganhamos só um 'salarinho', e temos que acabar escolhendo entre morar ou comer. Então, morar aqui para mim é muito bom. Porque precisamos de moradia.”

Ela não é a única que afirma que os altos valores dos aluguéis, em comparação com os baixos salários é o motivo principal da busca pela ocupação. Neuma Salen, costureira desempregada também afirma que mora atualmente no Queixadas porque não consegue mais pagar aluguel e sustentar três filhos.

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“Olha, eu já trabalhei muito de costureira e eu já criei três filhos, praticamente sozinha, e é difícil, viu. Eu mesma se for pagar aluguel agora, água e luz e tudo, não dá. Fica sem nada pra outras coisas.” 

Ameaças

O pedido de reintegração de posse, veio dos irmãos Zanotti, que reivindicam a posse do terreno como sendo parte de herança deixada pelo seu pai. Porém, os acusantes não possuem a documentação que comprova a titularidade efetiva do terreno, apenas um registro de compra e venda na década de 1970, mas que não foi formalizado em cartório. 

“Para reintegração de posse, você tem que provar que tem a posse. Você tem que provar que tem o título da propriedade legítimo, né? Porque se a propriedade não é sua, como você vai provar o segundo elemento, que é a posse? Ela não tinha nem o título de propriedade, muito menos a posse. Porque o terreno estava abandonado há 17 anos, no mínimo”, afirma, Avanilson Araújo, advogado que representa a comunidade dos Queixadas no processo.

Além do medo do despejo, os moradores também sofrem com ameaças dos supostos proprietários do terreno. Uma das irmãs, Vera Lúcia Zanotti, conhecida "bolsonarista" da cidade, promove constantemente ameaças à comunidade, inclusive soltando rojões no local.

“É desumano o que estão fazendo. Porque, primeiro, a maioria, se sair daqui, não tem onde ir. Não vão conseguir dinheiro para pagar o aluguel, porque as pessoas estão desempregadas. E a gente sabe que vai ser muito difícil conseguir emprego”, diz Vanessa Mendonça, moradora da ocupação e liderança do movimento Luta Popular, que ajuda na organização da ocupação.

Zeis

A prefeitura também é alvo de crítica dos moradores, pois retirou o status de Zona Especial de Interesse Social (Zeis) do terreno, logo após o processo ter sido aberto. Segundo esse status, o uso prioritário da área deveria ser justamente a moradia social.

“Esse imóvel estava demarcado como Zeis, porém, no final do ano, durante remodelamento do plano diretor da cidade, que ocorreu sem participação da população, mudaram o zoneamento da cidade. Então, justamente o terreno da ocupação, perdeu o status de Zeis, que deveria ter como prioridade o uso para moradia social”, detalha o advogado Avanilson Araújo.

Em resposta, a Prefeitura afirmou que a delimitação do loteamento foi realizada de forma regular, por meio da lei complementar 179, referente à revisão do Plano Diretor.

"Agora, estamos trabalhando num agravo para conseguir a nulidade da audiência. Porque a audiência não permitiu produção de provas de titularidade da propriedade. Segundo, porque estamos em plena pandemia. E terceiro, pela ausência de prova de posse pelos supostos proprietários”, resume Araújo.

No próximo domingo (1º), a comunidade está organizando um ato para denunciar o despejo e tentar reverter a decisão judicial.

Edição: Rodrigo Chagas