ancestralidade

Grupo Umoja celebra história do Noite dos Tambores com lançamento de livro

Identidade, ancestralidade e resistência por meio dos tambores é o cerne do projeto realizado nas periferias de SP

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Livro lançado pelo grupo Umoja conta história e pesquisa por trás do projeto Noite dos Tambores, realizado desde 2012 nas periferias de São Paulo - Divulgação
o couro repercute uma vibração e essa vibração ela tem o poder de juntar

“O tambor é esse instrumento junta, que repercute e que dá ânimo, porque som é um elemento que tem esse poder, de aglomerar e esse poder de fazer resistir”.

Quem faz o relato sobre o poder que reverbera do toque do tambor é Euller Alves, produtor cultural baiano, radicado em São Paulo há mais de 30 anos.

Ele é um dos integrantes do grupo Umoja, coletivo de cultura popular afro brasileira, responsável pela disseminação de diferentes atividades de culturas percussivas nas periferias de São Paulo.

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Com quase uma década de atuação, o grupo agora lança um livro que conta a história de um dos seus mais importantes projetos: a Noite dos Tambores.

Realizado anualmente desde 2012, o evento é voltado para a celebração da cultura do tambor, sua musicalidade, dança e conhecimentos que remontam a mais de 6 mil anos de história. 

Concebido pelo grupo Umoja, o projeto surgiu como desdobramento da pesquisa sobre cultura afro que se desenvolvia na Casa de Cultura do M'Boi Mirim e à necessidade de colocar em roda esses conhecimentos ancestrais. 

“A gente fazia uma vivência afro na Casa de Cultura que era só nossa. Mas a gente pensou então, a gente precisava compartilhar isso com outras pessoas, e saber de outros tambores também. Então, chegamos a esse significado, desse elemento de vibração, dessa repercussão. Porque o couro repercute uma vibração e essa vibração ela tem o poder de juntar, de ligar”. afirma Alves, que também relembra que a Casa de M'Boi Mirim foi o primeiro centro cultural desse tipo do município de São Paulo.

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A repercussão dessa união por meio das batidas dos tambores gerou muitos frutos. Conforme conta o livro lançado pelo grupo, a Noite dos Tambores já reuniu 64 grupos do Brasil e do mundo, em 110 apresentações e um público estimado de 25 mil pessoas, nesses oito anos de história.

Com textos de Gaspar do Grupo Z´África, do historiador Saloma Salomão, e Priscila Obaci, o livro também traz textos que contam um pouco da extensa pesquisa sobre o as culturas percussivas realizadas pelo grupo ao longo de sua história.

“O processo do projeto, de trazer as pessoas tocarem e tal, nos levou a um projeto de formação, de troca de experiência, de acúmulo de conhecimento, e por conta disso, um projeto que necessitava de um registro, para servir de parâmetro para se tornar um processo educacional”, afirma Alves. 

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No sentido de preservação e disseminação dessa cultura que é fundamentalmente oral, a educação é entendida como elemento transversal do projeto. Por isso, além das atividades culturais e artísticas, oficinas teóricas e práticas são realizadas ao longo do ano para novas gerações.

“O que eu passo para meu filhos, carnais ou meus filhos de santo é para eles respeitarem o tambor, não pegar de qualquer jeito, não desdenhar um tambor. Porque um tambor é vida, traz vida, ele chama”, comenta Rose Eloy, uma das figuras centrais do grupo, que além de cantora e percussionista também é mãe de santo.

Com a ascensão da intolerância política e religiosa no país, o toque da alfaia, do atabaque, djembê, zabumba, mais do que nunca, também é elemento que anima os corações e corpos para a resistência. 

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“Quem está no lado da resistência, quem está no enfrentamento como nós, pretos de periferia, essa resistência, essa luta é natural. É um processo de necessidade. Nós precisamos do tambor presente na nossa resistência. Isso é um fato. Por isso que nós temos a resistência do samba, a resistência da capoeira, porque o som é um elemento simbólico, mas ao mesmo tempo concreto que nos dá força para resistir”, destaca.

Sobre os desafios que o período coloca para as culturas periféricas, principalmente às ligadas às matrizes africanas, o coordenador da Noite dos Tambores é taxativo: "a resistência só começou".

“Todas as pessoas que estão neste livro, são da periferia, maioria imensa de pretos. Ou seja, a gente tem aí um núcleo de resistência muito grande. A gente vai dar muito trabalho para esses caras. A gente vai dar muito trabalho.” conclui Alves.

 

Edição: Daniel Lamir e Douglas Matos