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SP confirma dois casos da nova mutação do coronavírus; entenda o que está em jogo

Protocolos sanitários devem ser seguidos à risca para evitar a transmissão da nova variante, dizem infectologistas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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"Nós temos um vírus mutante em uma condição epidémica em agravamento", adverte integrante da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) - Foto: Mauro Pimentel/AFP

A chegada da nova variante do coronavírus ao Brasil parece anunciar o agravamento de um cenário já crítico da pandemia no país. Dois casos da B.1.1.7, com potencial de transmissão maior, foram identificados pelo laboratório Dasa em São Paulo no último dia 31 de dezembro e confirmados nesta segunda-feira (4) pela Secretaria da Saúde estadual.

A confirmação foi feita pelo Laboratório Estratégico do Instituto Adolfo Lutz após o sequenciamento genético de amostras encaminhadas pelo laboratório privado no sábado (2).

Segundo a secretaria, as pessoas infectadas pela nova variante são jovens: uma mulher de 25 que se infectou após contato com viajantes que passaram pelo Reino Unido, onde essa variante do vírus foi identificada inicialmente, e um homem de 34 anos, seu contactante, ambos moradores da capital paulista.

"A investigação epidemiológica sobre ambos os casos está em andamento e, por isso, não há mais detalhes sobre quadro clínico e sintomas apresentados pelos pacientes. Até o momento, não há comprovação científica  de que esta variante inglesa encontrada no Brasil é mais virulenta ou transmissível em comparação a outras previamente identificadas", informou a secretaria por meio de nota.

Mutação do coronavírus

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a mutação já representa mais de 50% dos novos casos de covid-19 diagnosticados na Inglaterra, onde foi encontrada inicialmente. Pelo menos outros 17 países já registraram a versão mais contagiosa do vírus.

O que a literatura científica tem registrado até agora é que, apesar de mais infecciosa, a variante não torna o coronavírus mais letal. Em princípio, a linhagem recém registrada também não é mais resistente às vacinas.

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No entanto, isso não significa que não é preciso se preocupar, já que o número de óbitos em decorrência da doença respiratória não para de crescer no Brasil.

Informações divulgadas pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) neste domingo (3) apontam que desde o início da pandemia, o Brasil já contabilizou 7.716.505 de infectados e 195.725 vítimas fatais.

Isolamento continua sendo a principal recomendação

Segundo o infectologista Hélio Bacha, ainda que a possível alta transmissibilidade seja foco dos estudos científicos, é o não cumprimento dos protocolos sanitários que agravará a pandemia, em especial o protocolo do isolamento social, o mais eficaz para conter a propagação do vírus.

"Não há vírus mutante ou não mutante que seja transmissível sem contato humano. Nós temos um vírus mutante em uma condição epidêmica em agravamento. Se as pessoas evitarem aglomerações, aproximação e fazerem uso de máscara, lavarem as mãos, a transmissão será mais difícil”, aconselha. 

A infectologista Marcela Vieira, que atua no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), endossa que todas as orientações de combate ao coronavírus devem ser mantidas, sem exceção.

“É uma variante que não tem ainda uma identificação ampla na população e os protocolos seguem sendo os mesmos: manter o isolamento social, evitar aglomeração e não realizar atividades que podem ser postergadas", aponta.

Vieira, que também integra a Rede Nacional de Médicos Populares ressalta que essas recomendações "precisam ser ainda mais ostensivas porque, nesse momento, com a cepa mais infectante podemos ter picos ainda maiores de incidência que invariavelmente repercutirão na lotação dos serviços de saúde”. 

Mesmo que as mutações aconteçam normalmente na microbiologia, Bacha se preocupa que a população entenda, erroneamente, que a nova cepa é responsável pelo aumento do número de casos.

“Há a relação associada e a relação causal. O agravamento se deve, aqui no Brasil, especialmente, a um comportamento inadequado da população, especialmente entre os jovens”, diz o infectologista, citando as aglomerações registradas durante as festas de fim de ano. 

Consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI),  ele ressalta que as complicações da doença são as mesmas, portanto não há diferença em saber se foi contaminado pelo vírus recorrente ou pela nova mutação.

“Do ponto de vista individual, o tratamento é o mesmo. A gravidade da apresentação da doença é a mesma. Mas do ponto de vista da saúde pública é importante acompanhar as mutações para se entender quem está passando para quem e para onde está indo a epidemia”, complementa. 

Testagem e detecção 

Na sexta-feira da semana passada (1º), a Gerência Geral de Tecnologia de Produtos para a Saúde (GGTPS) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou uma nota técnica com informações sobre os possíveis impactos da variante do coronavírus durante o processo de diagnóstico.

A Agência recomendou aos laboratórios que realizem testes que foquem em diferentes alvos virais para aumentar a eficiência dos diagnósticos. 

Conforme a nota técnica, a variante apresenta 14 mutações “resultando em alterações de aminoácidos e deleções de genes, sendo que uma destas está relacionada ao gene S do vírus".

Dessa forma, “os ensaios que utilizam exclusivamente este alvo [gene S], ou que o viram como referência para o desenvolvimento do teste, podem não ser capazes de detectar esta cepa”, alertou a Anvisa.

A agência frisou porém que a maioria dos testes utilizados no Brasil já utilizam mais de um alvo, o que reduziria o impacto no monitoramento da proliferação da covid-19. É o caso do exame RT-PCR. 

“Os ensaios em biologia molecular testam várias expressões de sequência genética. Poderia haver uma mutação onde a sensibilidade desse método cairia muito, mas não é o que acontece com essa variante. Nossos laboratórios têm os exames com sensibilidade suficiente para detectar a infecção”, reforça Hélio Bacha.

Munido de grandes pesquisadores e arsenal tecnológico, o Brasil tem condições técnicas de identificar a nova cepa, mas não em larga escala. 

Segundo a infectologista Marcela Vieira, que atua no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o sequenciamento do genoma demanda tempo e estruturas maiores para identificação, o que impede que seja realizado massivamente. 

:: Entenda as diferenças dos testes para o novo coronavírus ::

Ainda que ser contaminado pela nova variante não impacte os pacientes individualmente, ela acredita que o monitoramento por amostragem da linhagem B1.1.7 é essencial para  fundamentar o planejamento de ações, já que a capacidade de disseminação apresentada é ainda maior.

Acompanhando de perto as pessoas contaminadas pela nova cepa, seria possível assegurar o isolamento, evitar a proliferação e ampliar o acervo de pesquisa sobre a doença.

"Diante do que estamos vivendo, de um país com uma dificuldade enorme de vigilância ampla pelo fato de estarmos com um Ministério de Saúde acéfalo, isso tem um impacto direto na construção de políticas públicas e na questão do isolamento social”, destaca.

A infectologista faz a ressalva que o RT-PCR identifica a contaminação mas não especificamente a variante, ou seja, não há uma leitura detalhada do material genético. 

Edição: Leandro Melito