Rival de Bolsonaro?

Artigo | Luciano Huck e Danilo Gentilli representam apenas a si mesmos

Tenta-se repetir o improviso de 2018 – uma candidatura de extrema-direita que pautou mais sua campanha na negatividade

São Paulo (SP) |
Luciano Huck e Danilo Gentili são cogitados como possíveis presidenciáveis - Reprodução/SBT Reprodução/Globo

Como pode uma piada de mau gosto ganhar impulso para se converter em realidade? Como, adicionando insulto ao machucado, pode-se cogitar com alguma seriedade a candidatura de alguém do nível de Danilo Gentili em um país governado por Jair Bolsonaro? O que, além de humor de qualidade duvidosa, ele poderia oferecer, questão análoga a uma que se poderia fazer em relação a Luciano Huck?

O caso de Gentilli, que já teve manifestações de simpatia vindas de elementos como Sergio Moro e Luiz Henrique Mandetta, é exemplar. Alguns não escondem a intenção de que sua chapa sirva apenas como linha auxiliar de outra candidatura, atuando para retirar Bolsonaro do segundo turno.

As duas perguntas iniciais, e suas possíveis respostas, têm relação íntima. Huck e Gentili não representam nenhuma plataforma política conhecida do público. Representam a si próprios. E é justamente essa “qualidade” que atrai os feiticeiros que tentam ressuscitar o “centro”, ou a “terceira via” - leia-se: ressuscitar o neoliberalismo capaz de comer com garfo e faca, em detrimento da barbárie que ocupa o palácio do Planalto.

::19/4/2019: Danilo Gentili é condenado a seis meses de prisão por injúria contra Maria do Rosário::

Por que apresentar o nada, a antipolítica (mais uma vez), como alternativa em 2022? Por que não confiar na viabilidade do programa de uma candidatura de centro-direita? Porque o nada é “melhor” do que aquilo que a direita tradicional tem para apresentar efetivamente.

Como o desejo de substituir o povo brasileiro por um outro capaz de engolir o credo neoliberal sem grandes resistências, ao menos por enquanto, não se efetivou, a solução é simples: oculta-se o conteúdo e se sobrevaloriza a forma. Em seu íntimo, consciente ou inconscientemente, este setor sabe que falar em manutenção do Teto de Gastos, austeridade fiscal, privatizações, flexibilização de regras trabalhistas e previdenciárias, entre outras coisas, não desce redondo entre boa parte da população.

O que é reprimido volta na forma de sintoma. Os sintomas do vazio programático do centro – mais precisamente, de seu ocultamento – são as discussões de nomes esdrúxulos para a disputa da presidência da República.

No fundo, tenta-se repetir o improviso de 2018 – uma candidatura de extrema-direita que pautou mais sua campanha na negatividade política do que na apresentação das propostas ultraliberais -, mas agora de forma mais controlada e orgânica. Acredita quem quiser.

O que os mais sinceros na “estratégia Gentili” deixam escapar é o fato de que tudo não passa de um engodo eleitoral.

O absurdo da situação, entretanto, deixa uma lição para a esquerda e a centro-esquerda, a despeito de todas as dificuldades existentes. É possível operar na lógica oposta. Mais que nomes, uma política, em 2021 e 2022 , que busque concretizar as principais demandas da população – vacinação, auxílio, emprego e crédito – é o que de melhor podemos oferecer ao país.

 

Rafael Tatemoto é doutorando em ciência política na UNB

Edição: Rodrigo Durão Coelho