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Quais as causas e consequências do trabalho infantil? Crianças discutem questão no Radinho BdF

Pelo menos 1,8 milhão de crianças e adolescentes de 15 a 17 anos trabalham no país, segundo o IBGE

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Trabalho infantil deve crescer como consequência da pandemia, alertam especialista; na foto: II Marcha de Belém Contra o Trabalho Infantil em 2020 - Bruno Cecim / Ag.Pará
Um jeito de mudar isso é ajudar os pais para que eles possam trabalhar e sustentar as crianças

Para as crianças, são muitas as possibilidades de profissões para o futuro. Mas só para o futuro, porque elas já têm tarefas essenciais nessa fase da vida, como estudar e brincar, atividades tão importantes que são garantidas por lei. Apesar disso, milhares crianças ainda sofrem com o trabalho infantil no Brasil, problema agravado pela pandemia do novo coronavírus.

“Para mim, trabalho infantil é um serviço submetido às crianças que pode impedir elas de frequentar a escola e ter momentos de estudo, lazer, diversão e descanso”, disse Maria Clara de Lima Carvalho, de 12 anos, que mora em Triunfo (PE). “Trabalho infantil é quando um adulto obrigada uma criança a trabalhar. Na minha opinião isso é erado e não deveria existir”, reforçou Luna Rodrigues, que mora em Campinas (SP) e tem 7 anos.

Em 2019 eram pelo menos 1,8 milhão de crianças e adolescentes de 15 a 17 anos que trabalhavam no país, segundo um estudo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Algumas das atividades desempenhadas por eles fazem parte da lista das piores formas de trabalho infantil feita pelo governo brasileiro, como corte de madeira, trabalho em pedreiras, produção de carvão, coleta de lixo, venda em comércio ambulante e trabalho doméstico.

“Eu acho que um jeito de mudar isso é ajudar os pais mães pobres para que eles possam trabalhar e sustentar as crianças”, sugeriu João Barros, de 7 anos, que mora em São Paulo.

Especialistas alertam que as crianças que trabalham não têm tempo de brincar e de se dedicar aos estudos e que isso compromete o seu desenvolvimento físico, emocional e psicológico. Eles alertam que esse problema é resultado da pobreza, de questões culturais da sociedade brasileira e da falta de políticas públicas para garantir os direitos básicos e proteção para as crianças.

“Com a pandemia percebemos um aumento muito grande no trabalho infantil. Basta olharmos ao redor a quantidade de crianças que estão nos semáforos vendendo balas e pedindo na porta de estabelecimentos comerciais”, disse a gerente de projetos da Plan International Brasil, Elaine Amazonas. “A sociedade normaliza essa situação a partir de mitos, como ‘melhor trabalhar do que roubar’ ou ‘eu trabalhei e me tornei um sujeito bom’. Quando eu assumo que para determinados grupos o trabalho faz parte nós não conseguimos fazer esse enfrentamento.”

Crianças nas artes e nos esportes

Existem outras maneiras de exercer atividades profissionais na infância. São, por exemplo, as crianças e adolescentes que se dedicam às artes, como atores e cantores mirins, e as que se dedicam ao esporte, como a skatista Rayssa Leal, que com 13 anos ganhou a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio, neste ano, na modalidade street skate. Ela pratica desde muito pequena, como contou recentemente na sua conta no Instagram.

Eu comecei a nadar de skate com 6 anos e nunca mais parei. Eu estudo a tarde então tenho que andar de skate das 18h às 21h. Sobre a escola, ela é superparceira minha. Sempre que vou participar de um campeonato eu levo meus materiais e estudo online, sempre curtindo a infância e me divertindo”, disse.

Apesar da dedicação, os treinos, competições e viagens não anulam os estudos e as brincadeiras da Rayssa. A atividade que ela exerce não é considerada um caso de trabalho infantil porque ela não depende dela para sobreviver, pelo contrário, é algo divertido que ajuda ela a se desenvolver.

Mas é preciso ficar atento: não são todos os atletas que tem tanto apoio e segurança. Se o treino coloca em risco a segurança da criança ou se ela não tem tempo de estudar e brincar, algo está errado.

Crianças trabalhadoras

No Brasil a idade mínima para começar a trabalhar é 16 anos. Antes disso, aos 14 anos, os jovens podem desempenhar algumas atividades como aprendizes, um regime especial de trabalho apenas para funções seguras, com uma jornada reduzida e a obrigatoriedade de estar matriculado e de frequentar a escola.

A Organização Internacional do Trabalho (OIT), ligada à ONU, recomenda 18 anos como idade ideal para começar a trabalhar, mas cada país tem uma realidade própria. Na Bolívia, por exemplo, crianças a partir de 10 anos já podem trabalhar. Para tentar ter mais segurança, elas fundaram, em 2014, a União das Crianças e Adolescentes Trabalhadores da Bolívia.

“Já são 5 anos que estou aqui e é muito bonito. Tem me ajudado a crescer como pessoa, a me formar e a ter mais capacidade de entender sobre as coisas. E eu gosto porque não é somente aqui que ativa e líder, também tem me ajudado no meu colégio, na minha casa, a organizar-me melhor”, diz a sindicalista boliviana Lizeth, que ingressou na organização aos 10 anos, em declaração ao documentário “Trabalho Infantil”, da produtora portuguesa Baozi Prod.

São realidades diferentes, que precisam ser vistas com cuidado. Muitas dessas crianças exercem atividades depois da escola, em comércios da família, dividindo o tempo com os pais.

Ajudar em casa pode?

Pode e deve! Ajudar em casa é uma tarefa de todas as pessoas que moram nela. Nesse caso, as atividades são divididas, e cada um faz aquilo que é adaptado para a sua faixa etária e condição física e psicológica, garantindo tempo para brincar e se divertir.

“Eu ajudo minha mãe a organizar a casa e a lavar a louça. Ajudo meu pai a prender dos bezerros e a tirar leite e meu avô a plantar alface. Eu me sinto muito bem quando ajudo eles, me sinto importante. Na minha opinião isso é diferente do no trabalho infantil porque nele as crianças não têm tempo de estudar e brincar e na ajuda dos pais você pode estudar e brincar no seu tempo e ainda aprende muitas coisas e se divertir”, disse a Luara de Paula Souza Ferreira, que mora no Assentamento Geraldo Garcia, no Mato Grosso do Sul.

Nas comunidades rurais e tradicionais, inclusive, as famílias têm formas próprias de passar conhecimentos entre gerações, sem que isso seja considerado trabalho infantil.

Como eu moro no sítio, eu ajudo meus pais a cuidar dos animais e a plantar e colher, já que eles são agricultores. Eu me sinto muito grata porque eles sempre me ajudam. Com eles eu aprendo muitas coisas, que parecem simples mas que me ajudam hoje e no meu futuro. A diferença com trabalho infantil é que em casa são tarefas simples que ajudam no nosso desenvolvimento, já o trabalho infantil obriga as crianças a trabalhar de forma exagerada”, pontou Clara.

Diversão garantida

Para embalar esse debate complexo e importante, as crianças podem curtir a história “O Sonho de Lu Shzu”, escrita por Gómez Ricardo, publicada pela editora Mov Palavras e contada no Radinho pela educadora Bruna Melauro. Nela as crianças conhecem a história de uma menina que trabalhava em uma fábrica de brinquedos e são convidadas a refletirem sobre a origem dos produtos que consomem.

E já que brincar é a principal obrigação das crianças, que tal colocar a imaginação para funcionar em uma brincadeira de faz de conta? Usando alguns objetos de casa, dá para se divertir brincando de professora, cozinheiro, construtor, cientista e o que mais a imaginação permitir. Quem dá a dica é a educadora Lila Vanzella que pesquisa sobre brincadeiras.

E para embalar a criançada, a Vitrolinha BdF põe para tocar “Sementes”, do Emicida e da Drika Barbosa, “Criança não trabalha”, do grupo Palavra Cantada e “Anjos da Guarda”, da Leci Brandão, uma homenagem do Radinho BdF ao Dia dos Professores, celebrado em 15 de outubro.


Toda quarta-feira, uma nova edição do programa estará disponível nas plataformas digitais. / Brasil de Fato / Campanha Radinho BdF

Sintonize

O programa Radinho BdF vai ao ar às quartas-feiras, das 9h às 9h30, na Rádio Brasil Atual. A sintonia é 98,9 FM na Grande São Paulo e 93,3 FM na Baixada Santista. A edição também é transmitida na Rádio Brasil de Fato, às 9h, que pode ser ouvida no site do BdF.

Em diferentes dias e horários, o programa também é transmitido na Rádio Camponesa, em Itapeva (SP), e na Rádio Terra HD 95,3 FM.

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Edição: Sarah Fernandes