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A lambança das Forças Armadas na Amazônia

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Extermínio ambiental, sob a guarda e a conivência das Forças Armadas, ainda está para ser conhecido em sua totalidade - Divulgação / Exército Brasileiro
O Alto Comando aceitou de bom grado o discurso neofascista do nacional-populismo

Nos últimos anos, as Forças Armadas encontraram terreno fértil para voltar à cena política. Deram suporte à escalada de violência iniciada com a ruptura do tecido democrático em 2016, por ocasião do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff.

Uma data emblemática foi abril de 2018, quando o general Eduardo Villas Bôas, então comandante do Exército, publicou mensagens ameaçadoras em sua conta no Twitter. O intuito do general, confesso em entrevistas, foi pressionar o Supremo Tribunal Federal a não conceder Habeas Corpus ao ex-presidente Lula, preso em Curitiba.

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De lá para cá, as Forças Armadas derreteram a imagem de competência e equilíbrio que havia sido construída após a ditadura. A sucessão de erros culminou com a nomeação de um general da ativa para o Ministério da Saúde. Os resultados são conhecidos, apresentados pela CPI da Covid. O general Pazuello, incompetente para o cargo e incapaz de se negar a cumprir ordens criminosas, foi um dos responsáveis pelo agravamento da pandemia.

Hoje, o Exército reflete no próprio espelho a mórbida toxidade do psicopata que preside o país.

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O Alto Comando aceitou de bom grado o discurso neofascista do nacional-populismo e sua horda de infelizes, racistas, misóginos, homofóbicos e toda a sorte de extremistas que se reuniram em torno do bolsonarismo.

Será longo e doloroso o julgamento dos atos praticados pelos homens que atualmente estão no poder.

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GLOs na Amazônia

Enquanto isso, em uma semana na qual o governo brasileiro cumpriu seu papel de “pária” na Conferência do Clima, que acontece na Itália, volta a entrar em evidência os recordes de desmatamento e assassinatos na Amazônia.

Somente em 2020, 182 indígenas foram assassinatos, boa parte deles na Amazônia. É um aumento de 61% em relação ao ano anterior, segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI).

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A devastação ambiental segue na mesma toada. Os dois piores anos do desmatamento na Amazônia foram durante a gestão Bolsonaro, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Neste mesmo período, a Amazônia esteve sob intervenção do Exército. Foram três GLOs, decretos de garantia da lei e da ordem. A um custo de R$ 550 milhões, as intervenções serviram para piorar um cenário que era muito ruim.

Esse valor é seis vezes o orçamento do Ibama, que faria o serviço de um jeito muito mais eficiente.

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Do ponto de vista de planejamento e organização, a lambança do Exército na Amazônia chega perto do que fez Pazuello no Ministério da Saúde. O extermínio ambiental, sob a guarda e a conivência das Forças Armadas, ainda está para ser conhecido em sua totalidade.

O aumento da devastação se deve por incompetência, inoperância e inépcia dos interventores. Mas se deve também, e talvez principalmente, pela adoção da lógica de desmonte dos órgãos de fiscalização, em curso desde a posso do capitão. A intervenção foi também no Ibama, no Instituto Chico Mendes, na FUNAI, na estratégia de criminalizar organizações da sociedade civil, na conivência com garimpos ilegais, no aumento dos assassinatos, no incremento do racismo ambiental contra comunidades quilombolas e outros povos tradicionais.

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Na Amazônia, as Forças Armadas e o governo Bolsonaro encamparam a lógica do terror e do desmonte das instituições. O pior é que ainda não chegamos ao fundo do poço.

 

*Marques Casara é jornalista especializado em investigação de cadeias produtivas. Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP. Leia outras colunas.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Vivian Virissimo