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Novembro Negro e a narrativa da “consciência humana” como negação da consciência negra

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Por que no Brasil pobreza, prisões, feminicídio, auto de resistência têm cor? - Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado Fonte: Agência Câmara de Notícias
Não há espaço intelectual para negação do quão falho foi e é abolição da escravatura brasileira

A Carta Magna Brasileira, a Constituição Cidadã, nossa Constituição da República Federativa do Brasil, documento hierarquicamente superior a qualquer outro, jurídico ou normativo, elevou os direitos sociais à característica de direitos constitucionais. Alguns teóricos importantes, a exemplo de Luigi Ferrajoli, a consideram uma das mais avançadas do mundo.

De fato, os Constituintes fizeram um excelente trabalho, pois antes de adentrar as questões inerentes aos direitos sociais propriamente ditos, o art. 5º, que compõe o Capítulo I, do Título II, foi inteiramente dedicado aos direitos e garantias consideradas fundamentais. O caput do artigo determina que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”

Entretanto, neste mês de novembro, mês da Consciência Negra, as reflexões sobre a efetivação dessas garantias e o acesso a direitos afloram mais fortes do que nunca, pois nos encontramos em um contexto de violações, por parte do Estado, para com populações periféricas, pretos e pretas na maioria, principalmente da juventude negra.

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Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. A maneira do Estado arrecadar e gerir os recursos públicos não cumpre essa referência de igualdade. Mantemos a mesma lógica do Brasil colônia: os negros plantando, colhendo, enchendo os celeiros dos “sinhorzinhos”, ao mesmo tempo em que recebem apenas o mínimo dos mínimos, para conseguir se manterem de pé e trabalhando. 

Inviolabilidade do direito à vida de quem? Estamos sob a égide de uma política de extermínio de mais de 300 anos, fielmente mantida pelo Estado, especialista em apagar a negritude jovem, que opera a segurança pública no exercício do controle e punição dos corpos. Mulheres negras são as que mais contribuem para o Estado, elas, porém, recebem o retorno desse investimento nas balas pagas com seus recursos e encontradas em seus filhos abatidos. 

Muitas pessoas insistem em deslegitimar o Dia da Consciência Negra, fundamentadas na narrativa da “consciência humana”, porém, essa dita “consciência” não consegue explicar: Por que no Brasil pobreza, prisões, feminicídio, auto de resistência têm cor? Onde está a consciência humana na naturalização desses fatos? Pessoas pretas não são humanas?!

Porque se mantém vigente o plano de extermínio, matar os jovens de um povo e findar toda uma raça, etnia. E o Brasil financia essa ação desde a abolição.

Pessoas negras, indígenas, que chegaram aos 18 anos após a eleição do 17, entraram na vida jovem tendo como líder governamental uma figura que os criminalizam, efetiva ações políticas racistas em fortalecimento do genocídio das juventudes negras e etnocídio das juventudes indígenas.

Essa geração tem também o peso da PEC 95 sobre seus ombros, o Teto de Gastos que limita investimentos em políticas sociais tão vitais no cenário atual. São 20 anos sem maiores recursos em políticas sociais, o que significa dizer que eles e elas viveram toda a juventude em tempos de escassez de investimentos, cuidados ao bem viver.

Basta de Zumbi tombando nos 20 de novembros diários, todo dia um líder negro ou indígena é assassinado! Basta de floreios ao 13 de maio e à carta assinada pela Princesa Isabel! Não há espaço intelectual para negação do quão falho foi e é abolição da escravatura brasileira, sem uma política de inclusão, ela foi criminosa.

Urge adotarmos a interseccionalidade de classe, raça, gênero e idade no desenho das políticas públicas, elaborar estratégias diferentes para conseguir a sua efetivação, considerar a totalidade do ser.

De 2021 adiante, nenhum direito a menos! Que a destinação dos recursos públicos considerem as pluralidades e diversidades sem discriminar e/ou exterminar grupo algum. Que seja considerada a justiça fiscal, da arrecadação a execução das ações, em respeito para com a dignidade humana de forma contínua e inclusiva, onde o Estado dialogue com a população toda ela, não apenas adultos, agindo com responsabilidade social para usar o máximo de seus recursos financiando a vida com a ciência de que a primeira consciência humana, cientificamente falando, foi uma consciência negra.

*Dyarley Viana é pedagoga e assessora técnica do Inesc

**Cássia Lopes é estudante de Direito e estagiária do Inesc

*** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato - DF.

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Edição: Flávia Quirino