Judiciário

Saiba quem é o novo ministro do STF, André Mendonça, que toma posse nesta quinta (16)

Evangélico e conservador, o advogado herdará mais de 900 processos deixados por Marco Aurélio na Corte

Brasil de Fato | Fortaleza (CE) |
André Mendonça é segundo nome escolhido por Jair Bolsonaro para vaga na Corte - Evaristo Sa / AFP

Com posse marcada para ocorrer na tarde desta quinta-feira (16), o advogado da União André Mendonça chega ao Supremo Tribunal Federal (STF) como o segundo ministro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para compor a Corte. Ele irá ocupar no plenário a cadeira que pertenceu ao ex-ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou em julho deste ano.

Pastor da igreja presbiteriana e líder religioso engajado no segmento, o “pastor André”, como costuma se apresentar em certos momentos, é apontado como o nome “terrivelmente evangélico” que o chefe do Executivo vinha prometendo para o posto a lideranças neopentecostais desde 2019.

Mendonça, no entanto, não é unanimidade entre seus pares religiosos. Antes de chegar a estes últimos passos para sentar na cadeira que durante 31 anos pertenceu a Mello, o pastor enfrentou uma onda de críticas, entre elas a reprovação de cerca de 35 organizações evangélicas e da sociedade civil organizada que se juntaram em uma carta contrária a um eventual aval ao seu nome por parte do Senado.

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A frente, que reúne entidades do campo progressista, ressaltou, no documento, que ele foi indicado "em circunstância absolutamente estranha aos requisitos da carta constitucional, vinculada a uma particularidade do presidente da República".

Disse ainda que “não há dúvida de que as possíveis decisões institucionais do [então] postulante, enviesadas por acordos confessionais, teológicos e morais escusos à razão democrática, poderão suscitar um retrocesso importante aos direitos civis e aos valores laicos garantidos na Constituição”, em um aceno ao perfil acentuadamente conservador de Mendonça.

O documento registrou, inclusive, o episódio em que ele, ao atuar na condição de advogado-geral da União em julgamento do STF ocorrido em abril deste ano, fez coro pela realização de cultos religiosos durante a pandemia. Mendonça chegou a afirmar, na ocasião, que os cristãos “estão sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião”.

É nessa mesma sintonia que o agora ministro do STF será celebrado pelos parceiros de religião nesta quinta-feira. Após a posse, Mendonça será recebido em um culto evangélico marcado para ocorrer na Assembleia de Deus em Madureira, segmento do qual é adepto e que tem unidade em Brasília. A comunidade em questão deverá promover uma solenidade em sua homenagem.

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Mundo político

No ambiente político, André Mendonça também viveu uma odisseia particular até que chegasse esta data da posse. No Senado, contou com a rejeição de diversos nomes, entre eles o próprio presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre (DEM-AP), o responsável direto pela demora da sabatina no colegiado.

Vítima indireta da crise institucional que balançou a relação entre o Senado e o Palácio do Planalto, o advogado era também preterido por Alcolumbre e outros parlamentares diante de outros nomes cogitados para o cargo.

Apesar dos 47 votos favoráveis à sua indicação, o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro angariou 32 votos contrários ao seu nome. O placar foi precedido de uma romaria enfrentada meses a fio pelos corredores e gabinetes da Casa em busca de celeridade no processo de avaliação e aprovação de sua indicação.

Como bagagem, Mendonça trazia ainda a experiência à frente do Ministério da Justiça (MJ), onde substituiu o ex-juiz Sérgio Moro e ficou de abril de 2020 a março deste ano. Na AGU, onde é servidor de carreira desde o ano 2000, o advogado conduziu o órgão entre 2020 e 2021.

Natural de Santos (SP), Mendonça também é pós-graduado em direito pela Universidade de Brasília (UnB), mestre em Estratégias Anticorrupção e Políticas de Integridade pela Universidade de Salamanca, na Espanha, e doutor em Estado de Direito e Governança Global pela mesma instituição.

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Ideário

O caráter conservador do novo ministro ficou claro em diferentes momentos de sua trajetória no mundo político. Ao atuar como AGU, ele se colocou contra a liberação do aborto em casos de mulheres infectadas pelo zika vírus, por exemplo. Sustentou, na época, que o aval seria um “retrocesso” e confrontaria o direito à vida.

No Ministério da Justiça, colecionou controvérsias, entre elas as posturas em defesa de atitudes autoritárias de Bolsonaro. Mendonça chegou a adotar a Lei de Segurança Nacional, nascida na época da ditadura como uma das normas de endurecimento do regime, como instrumento de revanche contra críticos do presidente.

Também foi alvo de ataques por conta da suspeita de ter relações com um dossiê que enquadrava cerca de 600 professores e policiais antifascistas. A denúncia foi feita em reportagem do colunista Rubens Valente, da UOL, em julho do ano passado.  

Na época, o jornalista apontou a existência de um compilado de informações, como fotografias e endereços virtuais de pessoas que estariam sendo monitoradas pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do MJ, diretamente ligada a Mendonça. A pasta, na época, negou a existência do documento e também a possibilidade de envolvimento com o dossiê.

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Processos

No STF, ficarão a cargo de Mendonça processos sobre temas considerados caros para o mundo progressista. Entre as mais de 900 ações que o aguardam, estão a que trata sobre o direito de detentas transexuais e travestis optarem por cumprir a pena em penitenciárias voltadas ao gênero com o qual tenham identificação. O ex-ministro da Justiça terá que dar o voto de desempate sobre o assunto, cujo julgamento está paralisado em cinco votos a cinco.

Mendonça também deverá se encontrar com outros debates considerados áridos para o segmento conservador, como o bloqueio de perfis de apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais e a prisão em segunda instância, os quais ele deverá relatar.

Ações sobre a omissão do Congresso ao não discutir a taxação de grandes fortunas e as que exigem, por parte do governo federal, um plano de prevenção e combate a incêndios no Pantanal e na Amazônia também irão cruzar, em breve, a rota jurídica de Mendonça.

O novo ministro da Corte também precisará opinar em processos que discutem o marco temporal, a demarcação de terras indígenas e os decretos de armas do chefe do Executivo.

Edição: Vinícius Segalla