PRÓXIMO PRESIDENTE

No Chile, esquerda e extrema direita disputam 2º turno presidencial acirrado no domingo

José Antonio Kast (Republicano) e Gabriel Boric (Aprovo Dignidade) encerram campanha declarando vitória

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
José Antonio Kast e Gabriel Boric disputam a presidência do Chile em polos opostos da política - - Martin Bernetti / AFP

Em menos de 24h, cerca de 15 milhões de chilenos serão convocados a escolher quem será seu próximo presidente. Na disputa, Gabriel Boric (Aprovo Dignidade), candidato de unidade do campo progressista, possui certa vantagem frente ao extremista José Antonio Kast (Partido Republicano) nas pesquisas de opinião publicadas nesta última semana. Tudo indica, no entanto, que a decisão será acirrada.

Segundo as pesquisas realizadas pelas empresas Cadem, Activa e Criteria, o candidato do campo progressista teria preferência entre 40% e 54% das intenções de votos contra 28% a 46% de Kast. Já o levantamento da empresa AtlasIntel aponta um empate técnico, Boric com 51,5% e Kast com 48,5% da preferência eleitoral.

As três últimas semanas de campanha entre o primeiro turno, realizado no dia 21 de novembro, e o segundo turno do próximo domingo (19) foram marcadas pela disseminação de notícias falsas e ataques da direita contra Boric. Até o último debate presidencial, realizado no sábado (10), Kast voltou a propor um "teste anti-drogas" para os candidatos, sugerindo que seu oponente estaria consumindo substâncias ilícitas.

Na última quinta-feira (16), ambos postulantes realizaram seu encerramento de campanha. José Kast permaneceu na região metropolitana da capital, com um show no Parque Araucano. Enquanto Boric realizou sua atividade de encerramento em Valparaíso.

Durante o ato, candidato de extrema direita voltou a animar o anticomunismo entre os seus apoiadores e comparar a ideologia de esquerda ao terrorismo. "Conheci a violência de esquerda. Os verdadeiros mentirosos, os verdadeiros construtores da falsidade são de esquerda", disse.

O postulante pelo Partido Republicano, considerado o "Bolsonaro chileno", recebeu o apoio da chapa governista e no seu "plano de governo concreto" propõe diminuir os impostos às empresas, aumentar os tratados de livre comércio e oferecer um "Estado menor, mais austero e a serviço das pessoas".

No aspecto de segurança propõe restabelecer a "ordem e autoridade" para combater o narcotráfico. Em relação à educação, afirma que a tarefa do Estado será garantir que as famílias se ocupem de educar as crianças.

:: Comissão de Direitos Humanos da Constituinte do Chile aprova texto de reforma policial :: 

"O recurso privilegiado nessa campanha foi o medo: medo ao comunismo, medo ao fascismo, uma inédita dupla campanha de terror", analisa o economista chileno, Rafael Agacino.


José Antonio Kast, considerado o "Bolsonaro chileno", promete restabelecer ordem e autoridade caso seja eleito presidente do Chile / Mauro Pimentel / AFP

Apesar dos ataques, o atual deputado pelo partido Convergência Social conseguiu aumentar seu leque de apoios para reverter a tendência do primeiro turno, que finalizou com a vitória de Kast com 27,9% dos votos.

Além de incorporar as propostas de Yasna Provoste (Partido Democrata Cristão) e Marco Enríquez-Ominami (Partido Progressista do Chile - PRO), Gabriel Boric também se reuniu com a ex-presidenta chilena e atual Alta Comissária para os Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet.

"Há muitas coisas que valorizar no governo de Bachelet. Foi uma pioneira em instalar a paridade no seu primeiro gabinete, apesar de toda a resistência das elites do mundo político. Creio que aí ela abriu um precedente do qual nós não vamos retroceder", afirmou Boric.  

Durante o último debate presidencial, Boric já havia declarado que iria inspirar-se em Salvador Allende e Bachelet no seu governo. 

Leia também: Depois de 48 anos do golpe, qual o legado de Allende para a constituinte no Chile?

Em relação às críticas sobre as mudanças no seu programa político, Gabriel Boric afirmou que deseja cumprir suas promessas ao mesmo tempo que deve "se ater à realidade". Assegura, no entanto, que quer avançar para um "Estado que cuide das pessoas".

Suas principais propostas são a reforma tributária, aumentando impostos sobre a mineração, assim como a criação de uma pensão básica universal no valor de US$ 297 (cerca de R$1600) e um sistema público de saúde.


Gabriel Boric conta com apoio dos movimentos de esquerda que iniciaram processo constituinte para tentar tornar-se próximo presidente do Chile / Martin Bernetti /AFP

No Chile desde que o voto se tornou facultativo, há 10 anos, a média de participação eleitoral não ultrapassa 50%. O recorde foi o plebiscito popular, que contou com a opinião de 78,2% do eleitorado e abriu caminho para a convocatória da Convenção Constitucional, em outubro de 2020. 

Boric foi uma das principais figuras que fecharam um acordo com o governo de Sebastián Piñera, da realização do plebiscito como saída para o fim das manifestações massivas iniciadas em outubro de 2019. "Saibam que vamos defender o processo constituinte. No nosso governo não admitiremos que se retirem direitos e que tratem os povos originários como inimigos", declarou em discurso. 

Saiba mais: Convenção Constitucional do Chile completa um mês com debates sensíveis e oposição

Desde 1990, com o fim da ditadura de Augusto Pinochet, este será a primeira decisão eleitoral sem a presença dos partidos tradicionais da direita e da esquerda chilena.

Para o economista Rafael Agacino, apesar das novas caras, a disputa do Chile requer ainda mais organização popular para mudar o caráter tecnocrático do Estado.

"Ainda que possamos eleger autoridades executivas ou legislativas, a evidência mostra que a institucionalidade política formal tende a ser neutralizada ou capturada por uma esfera fora do Estado, pelas corporações empresariais e seus think tanks", afirma.

As eleições de domingo irão das 8h às 18h (horário local) e a partir das 20h se esperam os primeiros resultados preliminares. A posse do novo presidente será no dia 11 de março de 2022.

Edição: Vinicius Segalla