GÊNERO

Casos de aborto previstos em lei devem ser mantidos ou ampliados, defendem 74% dos brasileiros

Pesquisa diz que 77% da população considera que as principais vítimas da criminalização do aborto são as mulheres pobres

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Interromper a gravidez em caso de abuso sexual ou quando o parto põe em risco a vida da mulher é lei desde 1940 no país - Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Casos de aborto previstos em lei devem ser mantidos ou ampliados: é o que 74% dos brasileiros defendem. Atualmente, há permissão legal em casos de estupro, risco à vida da gestante e anencefalia fetal (saiba mais).

As informações são de pesquisa realizada em parceria do Instituto Patrícia Galvão e do Instituto Locomotiva. O estudo entrevistou 2 mil pessoas com 16 anos ou mais de idade, entre 27 de janeiro e 4 de fevereiro deste ano, pela Internet.

De acordo com o levantamento, apenas 12% da população considera que o aborto não deveria ser permitido em nenhum caso, enquanto 14% não soube responder à pergunta. Faça o download do estudo na íntegra.

Leia o gráfico:


Infográfico com resultados de pesquisa feita pela Agência Patrícia Galvão / Reprodução/Agência Patrícia Galvão

Aborto legal

No artigo 128 do Decreto Lei nº 2.848 de 07 de Dezembro de 1940 está claro que aborto é considerado legal quando a gravidez é resultado de abuso sexual ou põe em risco a saúde da mulher. Além disso, em 2012, um julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que é permitido interromper a gestação quando se nota que o feto é anencéfalo, ou seja, não possui cérebro.

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A gestante que estiver em um desses três casos tem direito de realizar gratuitamente o aborto legal por meio do SUS (Sistema Único de Saúde).

Se tratando de gravidez que ponha em risco a vida da mulher ou feto anencéfalo não há limite de semanas de gestação para realizar o aborto. Em caso de abuso sexual o tempo limite são 20 semanas de gestação, ou 22 caso o feto pese menos de 500 gramas.

A legislação não exige que a mulher apresente provas ou boletim de ocorrência atestando que foi vítima de abuso sexual para realizar o procedimento.

Fora dessas situações, interromper a gravidez é crime no Brasil. Fazer um aborto induzido pode acarretar em detenção de um a três anos para a mulher, e quem a auxiliar no procedimento pode pegar de um a quatro anos de prisão.

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Quando o aborto é induzido e provocado sem o consentimento da mulher, a pessoa que o provocou pode pegar de três a dez anos de reclusão.

Criminalização de mulheres pobres

Outro dado que chama a atenção no levantamento é que 77% dos entrevistados reconhecem que as principais vítimas da criminalização do aborto no Brasil são as mulheres pobres, que não podem pagar por um aborto realizado com acompanhamento médico. Assim, para 64%, a discussão sobre aborto no Brasil é sobretudo um tema de saúde pública e direitos.

A pesquisa mostra ainda que, caso sofressem um estupro, 67% das mulheres entrevistadas iriam primeiro à polícia e 26% buscariam primeiramente um serviço de saúde. A percepção geral é de que as vítimas não procuram esses equipamentos por vergonha e medo da exposição e de não serem acreditadas. Das mulheres que declararam já terem sido vítimas de estupro, 81% não buscaram nenhum serviço de apoio.

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As entidades descobriram que o temor de sofrer um estupro é ainda maior entre mulheres jovens e pretas. No total, 87% das entrevistadas pretas e 88% das jovens com idade entre 16 e 24 anos expressaram esse sentimento. A pesquisa também confirma que, no imaginário social, as meninas e mulheres negras são as principais vítimas desse tipo de crime.

Quando questionados quem seriam as principais vítimas de estupros do país, 37% dos entrevistados apontaram meninas adolescentes, 57% afirmaram se tratar de meninas mais novas e 6% citaram mulheres adultas. As idosas não foram apontadas pelas pessoas que responderam à pesquisa.

Quando se trata de meninas vítimas, prevalece em 89% dos entrevistados a noção de que os estupros são consumados em casa. Para as vítimas com esse perfil, 71% presumem que os principais autores são parentes, 22% apontam amigos da família/conhecidos, 5% citam estranhos, e 1%, professores, médicos, padres ou pastores.

Edição: Raquel Setz