BRASÍLIA

"É preciso ocupar a política", dizem indígenas na abertura do Acampamento Terra Livre

Maior mobilização indígenas do país começou nesta segunda-feira (4) e vai até 14 de abril, em Brasília (DF)

Brasil de Fato | Brasília (DF) |

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Líderes dos povos indígenas concederam entrevista coletiva na manhã desta segunda-feira, em Brasília - Divulgação/APIB

maior mobilização indígena do país, o Acampamento Terra Livre (ATL), começou nesta segunda-feira (4) e vai até 14 de abril, em Brasília (DF). Com o mote “Retomando o Brasil: demarcar territórios e aldear a política”, a 18ª edição do ATL deve reunir cerca de oito mil representantes dos povos originários.  

Em entrevista coletiva concedida por líderes indígenas na abertura do acampamento, Sônia Guajajara, coordenadora-executiva da Associação dos Povos Indígenas do Brasil, apresentou as principais pautas políticas da mobilização.

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"Vamos falar das principais medidas anti-indígenas e do pacote destrutivo que está tramitando nos Três Poderes. Vamos falar dos impactos da mineração, do garimpo, do desmatamento, que estão trazendo violência, conflitos e insatisfação entre nosso povos indígenas", disse Guajajara.

O cacique Marcos Xucuru, da Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme), disse que o evento mostra que os povos originários entendem que "é preciso ocupar e assumirmos esse protagonismo dentro da política".

"A pauta trazida hoje para o ATL, e sempre foi a questão de fundo, é a territorial. Passados 500 anos, há um déficit muito grande o Estado brasileiro em relação à demarcação de terras indígenas. A resistência dos povos vem nessa perspectiva, da garantia da delimitação e da demarcação dos nossos territórios, que é o onde está a soberania de cada povo, de cada família, de cada indígena, que vai para além da questão física, dentro da nossa perspectiva cósmica, da nossa religiosidade e da nossa ancestralidade", declarou o cacique.

Assista à coletiva de imprensa:

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A retomada, depois de dois anos, do formato presencial do Acampamento Terra Livre acontece em um momento em que a apreciação do apelidado “Projeto da Mineração” passou para caráter de urgência. O PL 191/2020 prevê que empresas mineradoras e de outros setores que envolvem explorações de grande infraestrutura aconteçam dentro de Terras Indígenas (TIs).  

Esse é só um entre outros projetos de lei tramitando no Congresso Nacional e que são chamados, em nota convocatória da APIB, de “projetos da morte”.  

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Programação de 2022 

Compondo as atividades dos dez dias, além de manifestações e assembleias, acontecerão plenárias sobre o impacto e a ameaça das ações do Executivo, do Legislativo e do Judiciário aos territórios indígenas; uma plenária virtual com o Parlamento Europeu e a Organização das Nações Unidas (ONU); conversas sobre saúde, economia, educação, diversidade e juventude; bem como um resgate dos 18 anos do Acampamento Terra Livre. 

Na sexta-feira (8), está prevista a “caravana das originárias” e atividades sobre o corpo como território e a ancestralidade indígena. “Nós pelas que nos antecederam, nós por nós e nós pelas que virão” é o nome de um dos encontros agendados. No último dia acontece a plenária #LutaPelaVida, sobre a aliança de movimentos sociais para o fortalecimento das lutas indígenas.  

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“A partir do Acampamento Terra Livre também identificamos situações que estão acontecendo em todos os estados, trocamos informações, experiências e cada vez mais novas lideranças estão se apresentando e se formando”, conta Kerexu. 

A origem do Acampamento Terra Livre 

Era 2004 quando um grupo de indígenas do sul do Brasil, dos povos Kaingang, Guarani e Xokleng, viajaram a Brasília para expor às autoridades as suas demandas em defesa da terra. Chegaram e não foram atendidos. Era preciso agendar, esperar.  

Resolveram, então, acampar em frente ao Congresso Nacional. “A partir daí começam a chegar outros parentes, se juntar a esse movimento, para dar força”, relata Kerexu Yxapyry, liderança do povo Guarani Mbya da Aldeia Morro dos Cavalos, em Palhoça (SC), coordenadora da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que organiza o ATL. 

“A mobilização ganha visibilidade e esse movimento começa a crescer. Se torna, então, um movimento nacional de todos os povos indígenas do Brasil que, a cada ano no mês de abril, se reúne em Brasília no Acampamento Terra Livre”, narra.  

“É também para dizer que o ‘dia do índio’ em 19 de abril não é um dia para comemorar. Para que se comemore, é preciso demarcar nossos territórios”, afirma a liderança Guarani Mbya.  

“A gente tem desafios muito grandes pela frente”, avalia Kerexu Yxapyry. “Mas estamos muito cientes do que a gente quer”, finalizou.

Edição: Rebeca Cavalcante