DENÚNCIA

Atuação de ex-diretor da Previdência de Porto Alegre sinaliza conflito de interesses 

Rodrigo Costa deixou o Previmpa para surgir como “agente de investimentos” de empresa ligada a vencedora de licitação

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Nove dias após a licença concedida a Rodrigo Costa, a prefeitura publicou o resultado do processo de seleção de “entidade de previdência complementar” - Reprodução

O diretor do Departamento Municipal de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Porto Alegre (Previmpa), órgão que gerencia a previdência dos funcionários da Prefeitura de Porto Alegre, entrou em licença para tratamento de interesse em 7 de março passado e, em seguida, passou a figurar no staff da empresa Grid Investimentos.

Rodrigo Machado Costa, o diretor, aparece como “agente autônomo de investimentos”. Nove dias após a licença concedida a Costa, a prefeitura publicou o resultado do processo de seleção de “entidade de previdência complementar”, sagrando-se vencedora a Icatu Fundos de Pensão. Ao lado de outras gestoras, a Icatu Vanguarda consta no portfólio da Grid.

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Costa foi um dos funcionários escolhidos pelo prefeito Sebastião Melo (MDB), em 13 de dezembro de 2021, para compor o grupo de trabalho “para seleção de Entidade Fechada de Previdência Complementar (EFPC) (...)”. É o que consta no Diário Oficial de Porto Alegre (DOPA) publicado naquela data. Com resultado publicado em 16 de março, o processo de seleção, portanto, aconteceu durante a gestão do então diretor geral do Previmpa.   

Conflito com Código de Ética

A prática conflita com o que estabelece o Código de Ética, de Conduta e de Integridade dos Agentes Públicos e da Alta Administração de Porto Alegre, editado em junho de 2021 e assinado pelo próprio Melo

O código, no artigo 17, terceiro parágrafo, veda pelo prazo de seis meses após o término do vínculo, “aceitar cargo de administrador, conselheiro ou estabelecer vínculo contratual ou empregatício com pessoa física ou jurídica com a qual tenha mantido relacionamento”. 

Também desaprova a atuação “em benefício ou em nome de pessoa física ou jurídica, inclusive sindicato ou associação de classe, em processo ou negócio do qual tenha participado, em razão do cargo ou função que ocupava”.

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A legislação federal, na qual se espelha o código municipal, igualmente trata do conflito de interesses, identificando-o, por exemplo, quando o servidor aceitar “cargo de administrador ou conselheiro ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que desempenhe atividade relacionada à área de competência do cargo ou emprego ocupado”. Sujeita-se ao disposto aquele funcionário que ocupa cargo “cujo exercício possibilite acesso à informação privilegiada” e que possa lhe trazer vantagens ou para terceiros.

A informação surge quando prefeitura e funcionalismo discutem as mudanças no regime previdenciário dos municipários provocadas pelo projeto de lei complementar 03/22. Os funcionários temem prejuízos nas suas aposentadorias caso a reforma previdenciária seja aprovada pela Câmara de Vereadores que está prestes a votar o projeto. Costa teria sido um dos articuladores das alterações.

O pedido de exoneração de Costa do cargo de diretor geral do Previmpa, segundo o Diário Oficial de Porto Alegre, ocorreu no dia 4 de março deste ano “cessando todas as vantagens percebidas em relação ao cargo, a contar de 07/03/2022, através da Portaria 121, de 25/02/2022”

Seguindo-se cronologicamente a publicação oficial da prefeitura, vamos encontrar, no dia 4 de março, a publicação do afastamento do diretor a contar do dia 7 do mesmo mês. Ele entra em licença – sem direito a salário, mas permanecendo como funcionário – para reaparecer quase imediatamente como agente de investimentos da empresa privada.

Recursos de mais de R$ 3 bilhões 

Ao mesmo tempo em que era o diretor geral, Costa atuava no Comitê de Investimentos do Previmpa. Em 31 de dezembro de 2021, os recursos da entidade dos municipários aplicados em fundos de investimento somavam R$ 3.263.653.768,48.

Informação do portal de transparência da prefeitura – transparência.portoalegre.gov.br – agrega que Costa, em 2015, recebeu auxílio do Previmpa para cursar formação e capacitação em mercado financeiro na Universidade George Washington – School of Business, nos Estados Unidos.

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A Grid se apresenta como “Escritório de AAI direcionado à distribuição de fundos de investimentos para RPPS” – sigla que significa “Regimes Próprios de Previdência Social”, como é o caso do Previmpa. Conforme o site da Grid, a Icatu Vanguarda foi criada em 2010 “dando continuidade à tradição do Grupo Icatu na gestão de recursos”. 

Outro lado 

Contatado na terça-feira (5) via aplicativo de mensagens, o ex-diretor geral do Previmpa somente retornou no dia seguinte. Dizendo estar “sem tempo no momento”, mesmo assim respondeu brevemente duas questões. Indagado se considerava que sua saída conflitava com o Código de Ética do município, Costa respondeu que “em absoluto, não”. 

Questionado sobre não ter cumprido a exigência dos seis meses estabelecidos na norma, respondeu da mesma forma. Diante da indagação sobre qual teria sido seu papel na concepção e elaboração do projeto de lei complementar 03/22 (PLC 03/22), o ex-diretor não respondeu até o momento da publicação desta matéria.

Através de email, a reportagem do Brasil de Fato RS tentou contato com o Previmpa e procurou a Grid Investimentos. Não houve resposta. Perguntas também foram enviadas ao setor de transparência da prefeitura que solicitou mais tempo para avaliar a questão. Quando houver retorno, a versão será acrescentada ao fim da matéria.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Katia Marko