ameaças à democracia

Tribunal Permanente dos Povos julgará Bolsonaro por crimes contra a humanidade

Instância internacional não tem poder de decisão, mas eventual condenação pode ser mais um constrangimento internacional

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"Infelizmente chegamos a esse ponto devido justamente à negligência, ao autoritarismo, à violência (de Bolsonaro) de colocar a vida das pessoas como se fosse objetos", denunciam - Andressa Zumpano/Articulação das Pastorais do Campo

O Tribunal Permanente dos Povos (TPP) julgará o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), por crimes contra a humanidade cometidos durante a pandemia de covid-19 e por ataques contra minorias e pelas ameaças à democracia brasileira. De acordo com o correspondente internacional Jamil Chade, do portal UOL, Bolsonaro será acusado de ter, no uso de suas atribuições, propagado intencionalmente a pandemia, provocando mortes e adoecimentos evitáveis de milhares de pessoas. 

O TPP é uma instância de tribunal de opinião que procura reconhecer, visibilizar e ampliar as vozes dos povos vítimas de violações de direitos. A corte busca suprir a ausência de uma jurisdição internacional competente que se pronuncie sobre os casos de violações contra os povos de maneira geral.

denúncia também chama atenção para a “escalada autoritária que busca suprimir direitos e também erodir a democracia principalmente contra a população indígena, negra e dos profissionais de saúde” no Brasil sob Bolsonaro. A denúncia aponta também que a conduta do presidente acentua vulnerabilidades e desigualdades no acesso a serviços públicos e na garantia de direitos humanos. 

Segundo Jamil Chade, ainda que o órgão internacional, criado nos anos 70, não tenha o peso do Tribunal Penal Internacional, de Haia, uma eventual condenação pode, além de colocar pressão sobre o Palácio do Planalto, ser mais um fator de constrangimento de Bolsonaro diante do mundo. O julgamento está previsto para os dias 24 e 25 de maio, em sessões simultâneas nas cidades de Roma, na Itália, sede do TPP, e em São Paulo. O caso brasileiro é oficialmente denominado como “Pandemia e autoritarismo – A responsabilidade do governo Bolsonaro na violação sistemática de direitos fundamentais de populações ao longo da covid-19.”

Bolsonaro culpado

Em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta segunda-feira (9), o secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Antonio Eduardo Cerqueiro de Oliveira, defendeu a ação do tribunal “devido à falta de diálogos e providências do governo brasileiro”. A denúncia foi apresentada pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, a Internacional de Serviços Públicos, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e a Coalizão Negra por Direitos. E também conta com o apoio do Cimi e outras entidades ligadas às lutas dos direitos humanos.

“Ninguém quer que o Brasil e seu presidente sejam penalizados, ou que o país chegue a esse ponto de ser um pária internacional. Mas, infelizmente, chegamos a isso devido justamente à negligência, ao autoritarismo, à violência (de Bolsonaro) de colocar a vida das pessoas como se fossem objetos em função de um grupo restrito que quer explorar e ter domínio da riqueza nacional em detrimento de toda a situação de fome, pobreza e exploração. E não só dos povos, como também de todo o meio ambiente”, lamentou Oliveira. 

A ação, informa o Cimi, se soma também à nota da Organização das Nações Unidas (ONU), da semana passada, que chamou atenção do Brasil para a situação de violência contra o povo Yanomami, ameaçados pelo garimpo ilegal. Oliveira diz ser fundamental esse conjunto de ações contra Bolsonaro que, segundo ele, constantemente “toma providências contrárias aos povos indígenas”.

O secretário cita, como exemplo, a tramitação do projeto de lei 191/2020, colocado em regime de urgência pelo governo federal para liberar a mineração em terras indígenas. Assim como a aprovação recente no Senado do Projeto de Lei Complementar PLP 275/2019. A medida permite a passagem de linhas de transmissão de energia elétrica por terras indígenas. 

“Para esse atual governo e esse atual Congresso é relevante o interesse da União em explorar os territórios indígenas. Portanto, virão mais consequências nocivas para os povos indígenas”, alerta Oliveira. 

Ministério Indígena

À jornalista Marilu Cabañas, o secretário-executivo do Cimi também avaliou a proposta do pré-candidato do PT à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, que se comprometeu a ter, em um eventual governo, um ministério indígena. De acordo com Oliveira, a iniciativa seria um passo importante para dar centralidade à pauta. Mas a avaliação é que será preciso, primeiro, reconstruir toda a estrutura de fiscalização e de responsabilidade de um estado social desmontada pelo governo Bolsonaro. 

Ele garante, contudo, que “ter um ministério que se responsabilize com a reconstrução de uma política de Estado para os povos indígenas trará consequências positivas para todo o povo brasileiro e para o mundo, porque ele preserva vidas, o ecossistema, a biodiversidade e as futuras gerações. Não podemos viver no planeta só a partir da lógica de exploração. Temos que viver pensando nas futuras gerações que vão necessitar de ar puro, água e alimento saudável”, finaliza.