Trocas na estatal

Governo pressiona e inclui em conselho da Petrobras membros reprovados pela própria empresa

Dois indicados do governo vão atuar na cúpula da empresa mesmo com currículo rejeitado por conflitos de interesses

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Conselheiros podem pressionar por queda de preço dos combustíveis antes da eleição - Filipe Araujo / AFP

O governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) conseguiu nesta sexta-feira (19) driblar regras de governança da Petrobras para eleger dois executivos com currículo rejeitado pela estatal como membros do Conselho de Administração da companhia. A manobra reforça a tese de que Bolsonaro tentará intervir na Petrobras para baixar preços de combustíveis e tentar se reeleger à Presidência.

O Conselho de Administração é a instância máxima de gestão da estatal. É ele que toma decisões estratégicas da empresa e que decide, por exemplo, se uma refinaria ou campo de petróleo pode ou não ser vendido.

O conselho tem 11 membros. Oito vagas estavam em disputa na assembleia, que foi realizada nesta tarde.

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O governo, que é sócio-controlador da Petrobras, indicou oito nomes para o conselho. Entre eles, estavam o secretário-executivo da Casa Civil, Jônathas Castro, e o procurador-geral da Fazenda Nacional, Ricardo Soriano de Alencar – que foram eleitos.

Antes da assembleia, o Comitê de Elegibilidade da Petrobras (Celeg) e o próprio Conselho de Administração da empresa já haviam declarado que Castro e Alencar não poderiam ser eleitos por conta de conflitos de interesse deles com a empresa.

Alencar defende a União em ações judiciais, e a Petrobras tem inúmeros processos contra o Fisco. A governança da empresa concluiu que não seria adequado ter um de seus conselheiros atuando em órgãos governamentais em litígio com a companhia.

Já Castro ocupa um cargo de governo. A Petrobras entendeu que ter ele em seu conselho não seria o mais adequado para sua independência.

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Petroleiros contestam

A Federação Única dos Petroleiros (FUP) e a Associação Nacional dos Petroleiros Acionistas Minoritários da Petrobras (Anapetro) já haviam reclamado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e à Justiça sobre o fato de o governo insistir na indicação de Castro e Alencar apesar dos conflitos de interesses constatados. As entidades chegaram a pedir que a assembleia de acionistas não fosse realizada. Esses pedidos, porém, não surtiram efeito.

Após a assembleia, a FUP e a Anapetro declararam que vão pedir a anulação da eleição na Justiça e também na CVM, que fiscaliza empresas com ações negociadas em bolsa, como a Petrobras. "Vamos entrar com ação na Justiça Federal na segunda-feira para anular a assembleia", disse o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar.

"A nomeação de pessoas passíveis de conflitos de interesses e sem a necessária formação e experiência no setor de petróleo e gás é inadmissível", complementou Mário Dal Zot, presidente da Anapetro. "É um precedente que não podemos deixar acontecer."

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Olho na eleição

Dal Zot afirmou que a eleição de conselheiros sem experiência e comprometidos com o governo deixa a Petrobras sujeita a "desmandos do acionista majoritário", o próprio governo. "Isso pode trazer prejuízos para empresa a partir de medidas danosas e muitas vezes eleitoreiras", ressaltou.

Bolsonaro é candidato à reeleição, mas está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Criticado por conta da alta no preço dos combustíveis no país, o presidente tem agido para tentar baixá-los meses antes da eleição.

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A Petrobras é a maior fornecedora de combustíveis do país. Seus preços influenciam o custo da gasolina e diesel em postos Brasil afora.

O Conselho de Administração da Petrobras tem hoje o papel de supervisionar os preços praticados pela estatal. Com mais conselheiros "fiéis" ao governo, cresce a possibilidade de interferências governamentais no preço dos combustíveis antes da eleição.

Nas últimas semanas, a Petrobras já anunciou reduções de preços.

Levando em conta a eleição desta tarde, o governo tem seis indicados no conselho de administração da Petrobras. Acionistas minoritários têm quatro. Um conselheiro representa trabalhadores da estatal.

Edição: Nicolau Soares