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Xi Jinping: ditador ou líder do socialismo chinês? Conheça a trajetória do presidente da China

No 20º Congresso do PCCh, Xi Jinping pode ganhar terceiro mandato diante de desafios econômicos e políticos para a China

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Xi Jinping poderá ser o primeiro presidente da China a assumir o terceiro mandato depois de Mao Zedong - Wang Zhao / AFP

Desde 2013 no poder, Xi Jinping deve assumir seu terceiro mandato como presidente da China, o primeiro a chefiar o país por mais de duas gestões depois de Mao Zedong, líder da Revolução de 1949. A decisão será tomada durante o 20º Congresso do Partido Comunista da China (PCCh), que inicia neste domingo (16), tem duração de uma semana e é considerado o evento mais importante da política nacional chinesa, uma vez que além de eleger os novos dirigentes do Bureau Político do PCCh, também define as bases dos planos quinquenais. 

Ao todo, 2.296 delegados são esperados no Grande Salão do Povo na Praça da Paz Celestial, em Pequim. O Congresso inicia com um discurso do seu secretário-geral, Xi Jinping, que oferece um balanço sobre os últimos cinco anos de gestão. Apesar de ser taxado pela imprensa tradicional como 'autoritário' ou até um 'ditador', Xi Jinping iniciou sua vida política nas bases do partido e foi eleito pelos delegados do PCCh para os seus dois mandatos, de 2013 a 2018 e 2018 a 2022.

Assim como Zedong, Xi também foi condecorado com o título de Líder Supremo do Partido Comunista da China. No entanto, Xi Jinping é o primeiro dirigente do país nascido após a revolução de 1949.

"O sonho chinês" é o projeto que Xi defende para o seu país, propondo uma nova etapa de desenvolvimento do país como potência socialista, prevendo que em 2050, o Produto Interno Bruto (PIB) da China - previsão de que chegue a US$ 70 trilhões (R$ 372 trilhões) - e dos países do Sul global deverá superar o conjunto de países da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), incluindo os EUA, cuja previsão de PIB em 2050 é de US$ 35 trilhões (R$ 186 trilhões).

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Segundo a proposta do presidente chinês, os próximos anos, até 2035, deverão servir para realizar a modernização socialista necessária para consolidar a potência asiática.

"O Partido e o povo chinês mostraram ao mundo que o povo chinês era capaz não só de desmantelar o velho mundo, mas também de construir um novo, que só o socialismo poderia salvar a China, e que só o socialismo poderia desenvolver a China. Trabalharemos para construir um novo tipo de relações internacionais e uma comunidade humana com um futuro compartilhado e usar as novas conquistas da China no desenvolvimento para proporcionar ao mundo novas oportunidades", declarou Xi no discurso de abertura da cerimônia de celebração dos 100 anos do PCCh, em junho de 2021.


Discurso de Xi Jinping com balanço dos últimos cinco anos de gestão deve abrir o 20º Congresso do Partido Comunista da China / Noel Celis / AFP

Suas ideias estão resumidas na série "A Governança da China", conjunto de quatro livros lançados em 2014, com propostas para o socialismo chinês do século XXI, a organização interna do Partido e a política externa chinesa, entre outros apontamentos, que fazem a obra ser comparado ao Livro Vermelho de Mao Zedong.

Xi Jinping levanta a expectativa de retomada da estratégia socialista dentro do Partido Comunista chinês, comenta o professor Li Bo, em conferência com o Instituto Tricontinental. "Ele reconciliou o sucesso da era Mao com as reformas que Deng iniciou em 1978", defende Li Bo.

Aos 69 anos, Xi lidera o maior partido do mundo, com 96 milhões de filiados, e 100 anos de história, projetando o que planeja para o PCCh no próximo século."Não apenas devemos cumprir a primeira meta do centenário, mas também devemos embarcar na jornada em direção à segunda", declarou.


Xi Jinping ingressou no Partido Comunista da China como militante de base em 1974 / Greg Baker / AFP

História

Natural de Fuping, é filho de Qi Xin e Xi Zhongxun, um dos fundadores do partido comunista. Seu pai, Xi, chegou a ser vice primeiro-ministro da China. Sua mãe, Qi, também foi dirigente do PCCh. No entanto, seus pais foram condenados no período da Revolução Cultural e foram enviados para o trabalho forçado.

Aos 15 anos foi trabalhar no campo, na região central chinesa de Liangjiahe, onde trabalhou durante sete anos como agricultor em fazendas comunistas vivendo em uma caverna que se converteu na sua casa. 

Mais de uma vez teve seu pedido de ingresso no PCCh negado, por conta do histórico familiar. Somente em 1974 entrou para as fileiras do partido. 

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Graduou-se engenheiro químico pela Universidade de Tsinghua, em Pequim, em 1979. No mesmo ano, casou-se com Ke Lingling, com quem teve seu primogênito: Xi Haun. Nos três anos seguintes trabalhou como secretário de Geng Biao, então ministro de defesa. Nos anos 80, mudou-se para diferentes províncias da China, atuando em diversos cargos para o partido. 

Em 1987, casou-se com Peng Liyuan, uma das cantoras mais famosas da música clássica chinesa, com quem teve uma filha: Xi Mingze.

Já em 1999 foi eleito governador da província litorânea de Fujian, três anos mais tarde assumiu a secretaria geral do partido comunista na província de Chequião e em 2007 assumiu o governo de Xangai, a maior metrópole chinesa com cerca de 25 milhões de habitantes. Já em 2008 tornou-se membro do bureau político do Partido e vice-presidente da República.

Em 2012 assumiu como Secretário-Geral do Partido Comunista da China (PCCh), e no ano seguinte foi indicado para presidir a Comissão Militar Central (CMC) e ser Presidente da República Popular da China (RPC).

No seu primeiro mandato, um total de 360 ​​grandes planos de reforma foram apresentados e mais de 1.500 medidas de reformas administrativas foram lançadas. A economia chinesa cresceu a uma taxa média anual de 7,2% entre 2013 e 2016, superando o crescimento médio global de 2,5%.


O Museu do PCCh expõe fotos de Xi Jinping com a história dos dez anos da sua condução do partido / Noel Celis / AFP

Combate à corrupção 

Quando assumiu a liderança do Partido, um dos maiores fatores de desprestígio do PCCh eram as denúncias de corrupção pelo amplo controle do aparato estatal. Xi decidiu empreender uma campanha anticorrupção para investigar e penalizar autoridades chinesas.

Ao todo, mais de 1,54 milhão de pessoas foram expulsas do partido, incluindo 43 altos mandatários civis e militares do país. 

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Um olhar para a pobreza e criação de constrastes

Em 2014, foram deslocados 800 mil membros do PCCh para as zonas mais empobrecidas do país para conhecer a realidade das famílias vulneráveis e realizar um censo nacional, identificando ao fim 89,62 milhões de pessoas pobres em 128 mil localidades.

Sob a administração de Xi Jinping, a China adotou o método: uma renda, dois seguros e três garantias, que significava que todas as pessoas deveriam ter direito a acesso a renda, alimentação e roupas; assim como o acesso à  educação, moradia, saúde e emprego. Para aplicar a metodologia, foram criadas 225 mil equipes com mais de 3 milhões de membros do Partido Comunista.

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Ao mesmo tempo que conseguiu erradicar a miséria, o desenvolvimento econômico constante da China nos últimos 40 anos também criou condições para o surgimento de superricos. Hoje o país lidera o ranking mundial com 73 entre os 500 maiores bilionários do planeta. 

Por isso, além de combater a pobreza, o presidente chinês também apontou para a necessidade de combater as desigualdades sociais entre a região litorânea, que concentra as grandes metrópoles e zonas econômicas especiais, e as partes do centro e do oeste do país. 

"À medida que o socialismo com características chinesas entrou em uma nova era, a principal contradição que a sociedade chinesa enfrenta evoluiu. O que enfrentamos agora é a contradição entre o desenvolvimento desequilibrado e inadequado e as necessidades cada vez maiores do povo por uma vida melhor", discursou Xi durante o 19º Congresso Nacional do PCCh em 2017.


Traçado da nova rota da seda; Na imagem ainda não há o caminho que levará até a América Latina / Reprodução

Cinturão e a Rota

Inspirado na antiga Rota da Seda, Xi Jinping lançou, em 2013, uma nova ideia de rota internacional de investimentos em infraestrutura e comércio. A proposta "Cinturão e a Rota" (One Belt, One Road) propõe, em 30 anos, erguer obras de infraestrutura e acesso do gigante asiático aos cinco continentes. Com a adesão de 70 países, as projeções apontam para US$ 1,3 trilhão em investimentos.

O projeto foi incorporado à Constituição chinesa em 2017 e também busca criar um parque industrial com transferência de tecnologia chinesa e foco no acesso à internet de 5ª Geração, além de projetos de economia verde.

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Dois anos após o início da emergência sanitária de covid-19, a China continua realizando jornadas de desinfecção nas ruas de Xangai e outras grandes cidades do país / Hector Retamal / AFP

Pandemia

Durante o último mandato de Xi, a China foi o epicentro da pandemia de covid-19, identificando os primeiros casos de infecção pelo vírus sars-cov2 em dezembro de 2019, na província de Wuhan. 

O governo chinês criou redes de cooperação científica internacional para identificar o genoma do vírus e criar respostas para o surto da doença. A biomedicina chinesa desenvolveu três fórmulas de vacinas próprias e ainda cooperou com estudos internacionais, como foi o caso da Coronavac, desenvolvida em parceria com o Instituto Butantã, no Brasil.

Com a política de covid zero foram implementadas medidas de lockdown em várias regiões do país, inclusive depois de iniciadas as campanhas de vacinação.


China lança primeira vacina nasal contra covid-19 / AFP

Apesar de ter vivenciado a emergência sanitária, a China ainda pôde sediar os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Inverno, em Pequim, em 2022.

Desde o início da pandemia, o país acumula 8,2 milhões de casos e 27.172 falecidos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). 

O êxito da administração de Xi Jinping parece ter conquistado unanimidade dentro das fileiras do PCCh. "O partido estabeleceu a posição central do camarada Xi Jinping no Comitê Central do PCCh e no partido como um todo, e definiu o pensamento de Xi Jinping sobre 'o socialismo com características chinesas para uma nova era' como uma ideologia orientadora", revelou o último comunicado do Comitê Central do Partido, prévio ao Congresso, publicado na sexta-feira (14).

Edição: Arturo Hartmann