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Artigo | A festa acabou, e agora?

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"É plenamente possível que Belo Horizonte avance para um “carnaval lixo zero”, que seja capaz de reciclar 100% dos resíduos gerados" - Foto: Léo Lara/Área de Serviço/Belotur
Carnaval de BH arrecada milhões e precisa de incentivo público

O carnaval de Belo Horizonte se consagrou como um dos maiores do país. Mais de cinco milhões de pessoas aproveitaram a festa popular na capital mineira. Esse é um fato novo e exige organização antecipada da cidade.

Vale lembrar que, há alguns anos, o carnaval em Belo Horizonte praticamente não recebia incentivos públicos. Já vivemos momentos terríveis de carnavais acontecendo em espaços cercados por grades, com monopólios de bebidas e sem a ocupação das ruas.

O carnaval de protesto, de manifestação e da cultura popular começou a tomar os espaços da cidade com pequenos bloquinhos que hoje viraram grandes blocos. Diante dessa nova realidade, é necessário que Belo Horizonte avance em uma legislação específica e em comissões de trabalho que consigam atender às necessidades do evento.

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O festejo movimenta uma quantidade grande de recursos e precisa de incentivo público. Só neste ano, a estimativa da Belotur foi de R$ 24 milhões de arrecadação em impostos indiretos líquidos (ICMS, IPI e ISS), além da movimentação de R$ 720 milhões e a criação de cerca de 20 mil empregos diretos e indiretos.

Recentemente, a Secretaria de Cultura passou a investir no carnaval, o que é justo e fundamental. No entanto, é importante que o financiamento não seja apenas durante o evento. Afinal, para que o carnaval aconteça, os grupos carnavalescos trabalham durante o ano inteiro movimentando a economia desde o setor têxtil, que produz fantasias, até a remuneração de artistas, entre outros setores que se mobilizam para garantir os dias de folia.


Escola Canto do Alvorada na produção das fantasias do desfile 2023 / Foto: Amélia Gomes / Brasil de Fato

Carnaval lixo zero

Outra questão importante é a mobilização do poder público para reduzir os resíduos gerados, especialmente por meio do fortalecimento das cooperativas de catadores e catadoras de materiais recicláveis. Neste ano, a festa gerou mais de 900 toneladas de lixo, da qual boa parte poderia ser reciclada.

Apesar disso, a prefeitura não garantiu a contratação de catadores, alegando falta de “patrocínio”. É necessário que as empresas de bebidas que lucram milhões com o evento paguem pela reciclagem. Nosso mandato acompanhou as negociações e seguirá lutando para que essa postura vergonhosa do poder municipal não se repita nas próximas folias.

É plenamente possível que Belo Horizonte avance para um “carnaval lixo zero”, que seja capaz de reciclar 100% dos resíduos gerados. Para isso, é preciso mais apoio às cooperativas em processos de triagem e transporte de materiais. Esse cuidado com os resíduos não deve se restringir apenas ao período da festa, mas incluir também as semanas de pré-carnaval.

Valorização dos ambulantes

Um terceiro ponto de atenção para potencializar o carnaval de rua é em relação ao trabalho ambulante. Foram 16 mil ambulantes cadastrados pela prefeitura, cerca de 10% a mais em relação ao carnaval de 2020. Defendemos que o licenciamento amplo e massivo para os ambulantes deveria ser permanente, não apenas nesse período.

Essa importante fonte de renda para várias famílias também deve ser organizada considerando a estimativa de público dos blocos, a fim de garantir maiores ganhos para os ambulantes e mais conforto para os foliões.

Não podemos admitir nenhum tipo de desrespeito ou violência a esses trabalhadores. Episódios lamentáveis como a proibição de ambulantes no pré-carnaval (11 de fevereiro), durante a Banda Mole, não podem se repetir. Os trabalhadores não foram avisados previamente, o que gerou prejuízo para quem foi até o local e não pôde vender seus produtos.

Pelo fim do assédio e da LGBTfobia

Pesquisa encomendada pela CDL, em janeiro deste ano, mostra que 43,5% das pessoas consideram o assédio sexual como o principal ponto negativo do carnaval na cidade. Nesse contexto, a preparação das guardas municipais também é necessária para garantir a segurança dos blocos e, especialmente, o enfrentamento às formas de assédio e à LGBTfobia, que infelizmente foram registrados durante o carnaval.

Neste ano, vimos uma postura importante da segurança pública e a redução de crimes de importunação sexual em Minas Gerais e em Belo Horizonte. No estado, os casos de importunação sexual diminuíram de 51 para 38, enquanto na capital passaram de 14 para 8 ocorrências. Os casos de estupro também tiveram uma queda de cinco para dois em Belo Horizonte e de 15 registros para 10 considerando o estado todo.

Todas essas questões podem e devem ser estruturadas para que o carnaval de Belo Horizonte seja cada vez mais democrático, movimentando a economia popular, mobilizando a cultura e recebendo bem os foliões. Temos condições de seguir como uma das principais festas de carnaval do país, mas com a qualidade que a nossa cidade merece. Viva o carnaval de Belo Horizonte!

Bella Gonçalves é mulher, lésbica, lutadora pelo direito à cidade e deputada estadual de Minas Gerais (PSOL).

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Este é um artigo de opinião. A visão da autora não necessariamente expressa a linha editorial do jornal.

Edição: Larissa Costa