segunda tentativa

Chile inicia novo processo para tentar deixar para trás constituição dos tempos de Pinochet

Texto constitucional foi rejeitado em 2022; eleição de 50 membros de conselho dará início à redação de novo texto

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ) |
Em plebiscito, chilenos rejeitaram nova constituição em setembro de 2022: país começa agora novo processo constitucional - Martin Bernetti/AFP

O Chile deu início a um novo processo constitucional, com a expectativa de criar uma Carta Magna que substitua o texto atual, que vem desde a ditadura de Augusto Pinochet, entre 1973 e 1990. O processo começa com a eleição dos 50 membros de um conselho que vai redigir o texto da nova proposta. Esta é a segunda tentativa de mudança no texto constitucional chileno, após um plebiscito ter recusado a primeira proposta em setembro do ano passado.

Os membros do conselho constitucional serão eleitos em votação marcada para o próximo dia 7 de maio. Até lá, os candidatos estarão em campanha. Os partidos políticos do país sul-americano se agruparam em quatro coligações, duas de situação, com integrantes que apoiam o presidente Gabriel Boric, e duas de oposição à direita. A composição será paritária, ou seja, haverá integrantes de situação e oposição.

O início do trabalho efetivo dos eleitos está previsto para o próximo dia 7 de junho. Eles terão um prazo de até quatro meses para elaboração do texto final da proposta de nova constituição. Esse texto passará por nova consulta popular, prevista para 17 de dezembro.

Rejeição histórica em 2022

O rechaço à proposta constitucional chilena em 2022 entrou para a história: foi a primeira vez que um país disse "não" a uma proposta de constituição redigida por um organismo eleito através do voto popular. O processo, à época, foi semelhante ao que se iniciou nesta semana. 

Na votação, realizada em setembro do ano passado, 61,8% dos eleitores disseram "rejeito", enquanto 38,1% votaram na opção "aprovo". Na época, participaram cerca de 80% dos eleitores aptos a votar. O resultado foi contundente: a rejeição à proposta foi vencedora em todos os estados chilenos.

Na época, o presidente Gabriel Boric, que apoiava o texto, preferiu se manifestar celebrando a participação do eleitorado, e convidou o Congresso a dialogar sobre os próximos passos do processo. 

"Esta decisão dos chilenos e chilenas exige às instituições e aos atores políticos que trabalhemos com mais empenho, diálogo, respeito e carinho até conseguir chegar a uma proposta que interprete a todos, que nos dê confiança, que nos una como país", disse Boric na ocasião.

O texto de 2022 foi escrito por uma convenção que tinha mais representantes de partidos progressistas que de direita. Setores conservadores, liderados por políticos como José Kast, candidato de extrema-direita derrotado por Boric nas eleições de 2021, fizeram intensa campanha pela rejeição ao texto.

Entre os pontos mais atacados pela direita chilena estavam uma proposta de reforma dos carabineiros (força policial equivalente às polícias militares do Brasil) e a introdução de um sistema jurídico específico para os povos indígenas.

Herança pinochetista

A constituição chilena vigente foi imposta em 1980 pela ditadura de direita de Augusto Pinochet. O texto foi escrito por um chamado "grupo de notáveis" (como sempre aconteceu no país até então - a constituição atual é a décima do Chile). 

Com o fim da ditadura pinochetista, em 1990, houve uma série de emendas e reformas constitucionais, mas o texto base foi mantido. As bases econômicas, por exemplo, foram formuladas pelos "Chicago Boys", economistas formados na Universidade de Chicago, de vertente extremamente neoliberal. O grupo era referência para Paulo Guedes, que foi ministro da economia no governo de Jair Bolsonaro (PL) no Brasil.

As políticas econômicas foram o principal motivo para a revolta social no Chile em outubro de 2019, com milhões de pessoas nas ruas em manifestações diárias e repressão das forças de polícia e do exército. Um acordo entre os partidos políticos pôs fim aos protestos ao determinar, entre outras medidas, o plebiscito constitucional.

Edição: Thalita Pires