Crise climática

Em 12 meses, desmatamento sobe 16,5% no Cerrado e cai 7,4% na Amazônia, mostra Inpe

Coordenador do Inpe alerta que maior parte do desmatamento no Cerrado está ocorrendo com autorização legal

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Desmatamento na Amazônia cai pela metade em 2023 e volta a patamares pré-Bolsonaro
Desmatamento na Amazônia cai pela metade em 2023 e volta a patamares pré-Bolsonaro - FLORIAN PLAUCHEUR / AFP

Entre agosto de 2022 e julho de 2023, os alertas de desmatamento no Cerrado cresceram 16,5% em comparação com o ano anterior. Foram 6,3 mil km² de vegetação destruída. Os dados foram divulgados nesta quinta-feira (3) pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). 

As informações captadas pelo sistema Deter, com imagens de satélite em tempo quase real, apontam, por outro lado, que na Amazônia houve uma redução de 7,4% dos alertas neste mesmo período. 

Se focarmos apenas no primeiro semestre de 2023 em comparação com o mesmo período do ano passado, quando Bolsonaro (PL) iniciava seu último ano de gestão, a queda dos alertas de desmatamento na Amazônia brasileira foi de 42,5%.  

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Em julho, mês mais propício para queimadas por conta da seca na região amazônica, bateu recorde histórico de redução dos alertas de desmatamento. A queda foi de 63% em relação a julho de 2022.  

Já no Cerrado, o aumento na primeira metade de 2023 chegou a 21,7%. O monitoramento do Deter detectou que de todo o desmatamento no bioma, a região do Matopiba – que corresponde aos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia – concentra 78,7%. A Bahia lidera o ranking, seguida pelo estado maranhense. 

Realidade complexa, mas maior know-how 

No evento do governo federal em Brasília que divulgou os dados, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, comparou os desafios atuais com aqueles que enfrentou há 20 anos, quando assumiu a mesma pasta na primeira gestão presidencial de Lula (PT).  

Em 2003, apontou Marina Silva, não havia a “realidade mais complexa que envolve as formas de criminalidade” que existem hoje. Em sua avaliação há, por outro lado, um aprimoramento de conhecimento. Segundo a ministra, na sua primeira gestão uma queda de 32% no desmatamento amazônico foi alcançada depois de mais de um ano de trabalho.  

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“Nesses primeiros 6 meses, com o know-how que temos, em que pese o desmonte das instituições, conseguimos uma queda de 42,6%”, destacou Marina Silva. “Da outra vez tivemos que consertar o avião voando. Desta vez tivemos que fabricar o avião voando. E entra outro fator: fazer política pública com base em evidência”, afirmou a ministra do Meio Ambiente. 

“Mas sabemos que é preciso uma mudança estruturante”, agrega Marina Silva, ao elencar exemplos: “Bioeconomia, agricultura de baixo carbono, agregar valor aos produtos, é isso que vai fazer criar um novo ciclo de prosperidade”. 

“Além das ações de coação e monitoramento, precisamos de um plano e é isso que está em curso”, disse Luciana Santos, ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, pasta a qual o Inpe está vinculado.  

“É complexo, mas estamos agindo com a verdade. Com a transparência dos avanços incontestes no controle do desmatamento da Amazônia e que serão necessárias medidas mais assertivas na direção do Cerrado”, avaliou Santos. 

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Aumento das fiscalizações 

Coordenador-geral de Ciências da Terra do Inpe, João Paulo Capobianco destacou que as ações do Ibama e do ICMBio permitiram “de forma inquestionável, a mudança da curva de aceleração para redução dos alertas de desmatamento na Amazônia”. 

Entre janeiro e julho deste ano, o Ibama aplicou quase quatro mil autuações ambientais no bioma amazônico. Foi um aumento de 173% em relação ao mesmo período dos últimos quatro anos. As apreensões de equipamentos usados em crimes ambientais saltaram 107%. Já as autuações emitidas pelo ICMBio cresceram em 216%. 

Além disso, 3.200 cabeças de gado foram apreendidas na Reserva Biológica Nascentes da Serra do Cachimbo. “Isso é um ato completamente fundamental. Não haverá conivência e se não retirarem o gado no prazo combinado, ele será retirado e entregue para usos sociais”, ressaltou Capobianco. 

O desmatamento legal no Cerrado 

Em relação ao cenário no Cerrado, o coordenador do Inpe comentou fatores que “não justificam, mas explicam as dificuldades”. “Houve mais foco na Amazônia e menos tempo de ação direta em campo. Mas o cerrado tem um fator adicional que exigirá uma discussão importante da sociedade brasileira”, introduziu.  

“Ao contrário da Amazônia, em que a reserva legal obrigatória - ou seja, aquela área que toda propriedade tem que manter com vegetação nativa -, é 80%, no Cerrado é 20%”, explicou. “No Cerrado, há a possibilidade maior de desmatamento legal. E é isso que está acontecendo”, apresentou Capobianco. 

“Temos casos de desmatamento ilegal, proprietários que se aproveitaram da autorização de desmatamento e expandem essa área. Mas o fato é que está sendo dado, de forma discutível no mínimo, um volume enorme de autorizações de desmatamento no Cerrado”, alerta o coordenador de Ciências da Terra do Inpe. 

Edição: Vivian Virissimo