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Artigo | Novo Rodoanel na RMBH agudizará crise climática e social. Mas há alternativa

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Projeto do Rodoanel da RMBH - Foto: Reprodução
13 municípios serão rasgados pelo Rodoanel

Em contexto de emergência climática com eventos extremos cada vez mais frequentes e letais, a realidade de uma sociedade capitalista como a nossa, com seus conflitos e contradições, em Minas Gerais a ameaça é o desgovernador Zema: insistindo em empurrar goela abaixo uma obra faraônica, ecocida e hidrocida que é o projeto do Rodoanel na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

Caso o rodominério seja construído, será na prática uma infraestrutura para a mineradora Vale S/A e outras mineradoras subalternas a ela continuarem ampliando mineração em Belo Horizonte e na Região Metropolitana.

Já passou da hora de decretarmos a capital mineira território com mineração zero. Após 300 anos de devastação socioambiental apunhalando as montanhas e arrancando das suas entranhas minério, jogando-o no “trem da morte” ou nos minerodutos das mineradoras todos os dias para irem para os portos do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, deixando um rastro de devastação nos territórios vítimas da exploração minerária.

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Já são R$ 170 bilhões de prejuízo ao erário público mineiro pela não arrecadação do ICMS pelas mineradoras, por causa da Lei Kandir, que dispensa o pagamento de ICMS sobre as commodities para exportação. Commodities são mercadorias primárias, entre as quais está o minério.

Em quase três anos de luta contra este famigerado Rodoanel, já fizemos dezenas de atos públicos, marchas, panfletagem, audiências públicas, giros com carro de som em dezenas de bairros denunciando as ilegalidades, as injustiças e as violências socioambientais que esta megaobra absurda e desnecessária trará aos povos e a toda a biodiversidade de Belo Horizonte e da RMBH.

Alternativas

O movimento social “Somos Todos Contra o Rodoanel na RMBH” critica de forma contundente a construção do Rodoanel na RMBH e propõe alternativas para resolver de forma justa, ética e democrática os problemas de trânsito e de mobilidade em Belo Horizonte e RMBH. Para impedir a agudização das injustiças socioambientais, econômicas e políticas reinantes em Belo Horizonte e RMBH propomos quatro alternativas à construção do Rodoanel:

1) Ampliação do metrô de Belo Horizonte para as várias cidades da RMBH, que volte a ser público e com tarifa a mais barata possível;

2) Resgate do transporte de passageiros por meio de trens entre as 34 cidades da RMBH e Belo Horizonte, realidade que existia até por volta da década de 1970. Existem estudos avançados inclusive no âmbito da própria Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (SEINFRA) do Governo de Minas Gerais e na Comissão de Ferrovias da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que corroboram estas alternativas;

3) Melhoria do transporte público de ônibus em Belo Horizonte e RMBH;

4) Revitalização, ampliação e duplicação do Anel Rodoviário de Belo Horizonte, o que é viável tecnicamente e será muito menos oneroso e não trará as brutais violações aos direitos socioambientais, históricos e arqueológicos de Belo Horizonte e 13 municípios da RMBH. Sobre esse ponto, deve-se observar que o anteprojeto detalhado de reforma do Anel Rodoviário foi realizado pelo Governo de Minas Gerais e está pronto desde 2016.

A apresentação de propostas alternativas cumpre o propósito de demonstrar que existem caminhos menos danosos ao meio ambiente, às pessoas e ao patrimônio histórico e cultural da Região Metropolitana de Belo Horizonte, que devem ser estudados e divulgados antes da implantação do Rodoanel, grande obra que somente irá beneficiar as mineradoras.

Ilegalidades, injustiças e violências

O projeto do Rodoanel está eivado de ilegalidades, injustiças e violências socioambientais e econômicas. Eis algumas delas:

a) O desgovernador Zema fez leilão do projeto do Rodoanel na Bolsa de Valores de São Paulo, B3, sem discutir o projeto com o povo, sem participação popular, pois as “audiências públicas” realizadas durante a pandemia da covid-19, a toque de caixa, foram farsas de audiências públicas. O princípio da participação popular foi violado;

b) O leilão e a assinatura do contrato com uma empresa multinacional italiana, a INC S.P.A., ligada à extrema direita na Itália, foram feitos sem consulta prévia, livre, informada, consentida e de boa-fé aos Povos e Comunidades Tradicionais, conforme prescreve o Tratado Internacional da Convenção 169 da OIT da ONU. Nos 13 municípios da RMBH que estão na mira para serem rasgados brutalmente pelo Rodoanel existem dezenas de Comunidades Quilombolas e dezenas de outras Comunidades Tradicionais, tais como: carroceiros, ciganos, agricultores familiares, povos de terreiros etc.;

c) Não foi feito o licenciamento ambiental antes do leilão e da assinatura do contrato. Isto ao arrepio de leis que exigem que primeiro deve-se fazer o licenciamento ambiental, antes de se fazer leilão e assinar contrato. E se o licenciamento ambiental com os necessários estudos de impactos ambientais demonstrar que é inviável a construção do Rodoanel? Em cláusula leonina do contrato para caso de necessidade de romper o contrato, o Governo de Minas Gerais garante pagar uma multa de R$ 5 bilhões, o que, segundo juristas, fere a Lei de Responsabilidade Fiscal;

d) E os direitos das mais de 15 mil famílias que serão desapropriadas e terão suas casas demolidas recebendo uma indenização que não cobrirá mais do que 30% do valor justo pelo terreno e construções? Sendo mais de 95% das propriedades sem escritura e sem registro de propriedade, mas só com “Contrato de Compra e Venda”, a indenização será menor e mais injusta ainda. Isso agravará brutalmente a injustiça urbana e metropolitana na RMBH, porque aumentará muito o déficit habitacional, o que eleva a desigualdade social de forma violenta;

e) Serão devastados muitos mananciais, áreas de proteção ambiental, sítios históricos e arqueológicos e as dezenas de Comunidades Quilombolas, centenas de Terreiros, outros Povos Tradicionais da RMBH e milhares de famílias de agricultores familiares que há mais de cem anos produzem alimento no chamado “cinturão verde” da RMBH? A Comunidade Quilombola de Pinhões e o Cemitério dos Negros escravizados serão rasgados ao meio;

f) O Rodoanel não será uma estrada pública, será pedagiada com o pedágio mais caro do Brasil, o que proibirá o povo pobre de passar por ela.

É previsível que nos 13 municípios que serão rasgados pelo Rodoanel um grande número de ações judiciais serão impetradas para impedir tantos crimes anunciados.

Gilvander Moreira é frei e padre da Ordem dos Carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em filosofia pela UFPR; bacharel em teologia pelo ITESP/SP; mestre em exegese bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CebiI e das ocupações urbanas; professor de teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica).

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Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal

Edição: Elis Almeida