Fracassou?

CPI do MST confirma isolamento da extrema direita; movimento mostra força social

Para analistas, 'o bolsonarismo saiu chamuscado' e Câmara dos Deputados teve imagem 'desgastada'

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Parlamentares progressistas usam boné em apoio ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra durante depoimento do dirigente João Pedro Stedile à CPI do MST no dia 15 de agosto
Parlamentares progressistas usam boné em apoio ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra durante depoimento do dirigente João Pedro Stedile à CPI do MST no dia 15 de agosto - Igor Carvalho/ Brasil de Fato

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) deve ter seu ponto final na próxima terça-feira (26), com a votação do relatório produzido pelo relator da comissão, o deputado federal Ricardo Salles (PL-SP).

Durante os 130 dias de funcionamento da comissão houve um embate aberto entre parlamentares progressistas e de extrema direita. Cientistas políticos escutados pelo Brasil de Fato analisaram os resultados da CPI e o impacto político dos meses de trabalho de investigação do MST.

Para a cientista política Rosemary Segurado, professora da PUC-SP, "a CPI nunca teve um fato político, só queriam desgastar o MST, na sua luta legítima por reforma agrária". A docente criticou o desempenho dos parlamentares de extrema direita na comissão.

"Ótimo que essa CPI chegue ao final, porque o que me preocupa não é desgaste do bolsonarismo ali, mas é o quanto estamos desgastando a imagem da Câmara dos Deputados com essa CPI, as pessoas começarem a pensar 'nossa, esses são nossos deputados' e virarem as costas para a democracia e a política", ponderou Segurado.

O sociólogo Rudá Ricci, do Instituto Cultiva, lembrou que durante a CPI, bolsonaristas chegaram a ser maioria na composição das cadeiras e, mesmo assim, não conseguiram avançar ou justificar a existência da comissão.

"O bolsonarismo saiu chamuscado. Várias tentativas de convocação foram frustradas. Na prática, o tema conseguiu o que em política se denomina 'vacina': numa próxima tentativa, o país já estará imunizado, ou seja, perceberá um revival, uma 'ressurgência' do tema com gosto de comida requentada", afirmou Ricci, que destaca o tamanho que o movimento social sai da CPI.

"O MST ressurge no cenário político como grande produtor coletivo, que defende a agroecologia e mantém um ideário à esquerda e popular. Mudou o perfil e se adaptou ao novo século, além de se adaptar ao lulismo. Não poderia ser melhor para esta organização", explica.

Para Segurado, o baixo nível dos parlamentares facilitou a vida do MST. "O preparo deles é esse, é o limite do preparo deles. Se fosse para investigar o movimento social, iriam atrás de documentos e provas, mas esse não é o modus operandi deles. Então, o preparo deles era apenas para fazer a fala mais agressiva e violenta, para alimentar o setor mais radicalizado deles."

Por fim, Rudá Ricci lamenta que temas maiores não tenham ganhado muito espaço no debate público, ficando circunscrito à esquerda.

"Ocorre que com o fracasso da extrema direita, a CPI foi se confinando como tema da bolha progressista. Até mesmo a grande imprensa deixou de destacar como pauta quente, a não ser para revelar a fragilidade da bancada extremista e ruralista", afirma ele.

"Não deixa de ser uma demonstração do jogo político pela narrativa que explique o atual momento por que passa o país. Algo como uma conjuntura morna, mediana, que fica sempre no meio do caminho. O MST saiu ileso, mas o tema da reforma agrária e a violência do ruralismo não retornou à agenda nacional", acredita.

Edição: Rodrigo Durão Coelho