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Na defesa das palmeiras, jovens produzem artesanato a partir do coco babaçu no Tocantins

Na luta pela preservação ambiental e permanência no campo, juventude cria grupo de artesãos no interior do estado

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Juventudes do Bico do Papagaio enfrentam desafios para realizar o desejo de permanecer no campo - Mariana Castro
Trabalhar com o grupo Pindova é muito mais do que ser um artesão

A estrada de terra que leva à comunidade de Juverlândia, na área rural de Sítio Novo (TO), no norte de Tocantins, está rodeada de palmeiras de coco babaçu preservadas por lei. Neste cenário, desde 2008, o grupo Pindova reúne jovens que produzem artesanato que tem a espécie como matéria-prima. 

Além da comercialização, a iniciativa é uma forma de preservação das palmeiras, de sustentabilidade financeira das famílias e de permanência das juventudes no campo.

“Somos o grupo Pindova, um grupo de jovens filhos e netos de quebradeiras de coco babaçu e trabalhadores rurais. Esse nome, 'Pindova', é como as quebradeiras costumam chamar as palmeiras mais jovens. Então fazemos artesanato do babaçu, como colares, brincos, porta canecas, carimbos e tudo o que você imaginar. Vendemos nas feiras, quando tem eventos das associações e dos movimentos sociais”, conta Andreina Xavier, que compõe o grupo. 

Por trás de cada peça de artesanato e de cada jovem integrante do grupo, há uma história de resistência ligada às palmeiras.

“Sou filha de quebradeira de coco e desde pequena minha mãe me levava para as reuniões, para participar das articulações de grupos. Lembro demais de uma vez que minha mãe conseguiu vender para o PAA [Programa de Aquisição de Alimentos] pela primeira vez, e com o dinheiro dos azeites comprou um notebook. Sempre gosto de contar essa história para as pessoas conhecerem o quanto a gente batalha para conseguir as coisas aqui na base, na comunidade. E eu nunca perdi minha essência, enquanto filha de quebradeira de coco e sempre me orgulho de falar disso. Minha mãe teve sete filhos, todos em casa, aqui na comunidade de Juverlândia”, relata a jovem Elizete Araújo.  

Leia e ouça: Conheça o Movimento de Mulheres Quebradeiras de Coco Babaçu

Hoje assessora técnica do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu e integrante do GT das Juventudes do Bico do Papagaio, Elizete fala sobre os desafios enfrentados pelos jovens do campo.
 
“Um dos desafios que a gente enfrenta enquanto juventudes é que aqui na nossa comunidade não temos estudos. A partir do ensino médio, a juventude tem que sair da comunidade para procurar estudos fora. Um desafio que a gente também encontra é a questão do trabalho, que é todo artesanal, nós quase não utilizamos nenhum maquinário. Usamos tudo manual, tem que colocar muita força. Somos guerreiras", destaca Elizete. 

Além da produção de artesanato, as juventudes do Pindova também estão engajadas na preservação dos babaçuais. “Nós, enquanto juventudes, nos fortalecemos na participação desses eventos, dessas atividades pertencentes às entidades que nos apoiam em defesa do babaçu em pé e da 'mãe palmeira'. Nós chamamos a palmeira de babaçu como 'mãe palmeira', que garante o nosso bem viver”, explica Elizete, que participa do grupo.  

O estado do Tocantins hoje se destaca pela criação da Lei Babaçu Livre. O professor e artesão Márcio Lima afirma que a conquista na legislação foi "fruto de muitas lutas, sofrimento e até perdas de companheiras na defesa do acesso aos babaçuais". Ele aponta que esse processo foi acompanhado pelos jovens do grupo quando ainda eram crianças.  
  
“Também sou filho de uma quebradeira de coco babaçu. Cresci no meio das mulheres quebradeiras de coco babaçu, vendo a luta delas nos movimentos, em todos os espaços, cresci vendo a luta com os latifundiários, agricultores da comunidade que não deixavam elas entrarem nas roças para colher o coco babaçu e a partir daí tirar o sustento dos seus filhos, das famílias”, lembra Márcio.
 
A comunidade de Juverlândia é formada por cerca de 70 famílias. Na região, o babaçu é a principal fonte de renda, o que fortalece a identidade do grupo Pindova.
 
“Fazer parte do Pindova, para mim, não é só trabalhar artesanato, mas também uma forma de identidade, porque a gente cresce vendo a luta das mulheres. A minha mãe também é quebradeira, e a gente tinha muita dificuldade de coletar o coco babaçu. Fomos criados praticamente com o coco babaçu. Somos quatro filhos sem pai, nenhum ajudava minha mãe com nada. A gente trabalhava ajudando-a, estudava, e ela se virava para cuidar da casa. E, além disso, quebrar o coco babaçu e tentar garantir a permanência da gente. Então, trabalhar com o grupo Pindova é muito mais do que ser um artesão, é muito mais do que trabalhar com o coco babaçu. Na verdade é uma identidade, é uma forma que a gente se vê atualmente”, relata Márcio.

Edição: Geisa Marques