Entenda

Supremo pode definir nesta sexta (27) se agrotóxicos continuam isentos de impostos no Brasil

Do outro lado da Esplanada, o Congresso Nacional aprecia o Pacote do Veneno, que afrouxa regras de controle

Ouça o áudio:

Agrotóxicos no Brasil têm benefícios fiscais desde a década de 1950 - Alex Mirkhan
R$ 13 bilhões deixaram de entrar nos cofres públicos porque os agrotóxicos não são taxados

Os ministros do Supremo Tribunal Federal têm até o fim desta sexta-feira para finalizar o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5553) sobre a isenção de impostos em agrotóxicos.  

A Corte vai decidir se segue em vigor a redução de 60% do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e a isenção total do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) para determinados agrotóxicos. A ADI, de autoria do PSOL, considera que a liberação de tributos para esses produtos fere princípios garantidos pela Constituição. 

Um deles, o princípio da capacidade contributiva, é a definição do pagamento de impostos a partir da possibilidade de cada contribuinte, seja pessoa física ou jurídica. O conceito está amplamente conectado à ideia de justiça tributária. Em resumo, a ação proposta pelo partido, considera que a isenção vem sendo concedida a um setor que tem larga capacidade de contribuição. 

A ação do PSOL também cita o princípio da seletividade, que condiciona alíquotas mais altas a bens não essenciais e menos impostos para itens imprescindíveis. Por não terem essa natureza, os venenos agrícolas não deveriam contar com isenção de impostos. 

:: Na contramão da vida: 'Não precisamos de mais veneno no nosso prato' ::

Além disso, a legenda alerta para os prejuízos ao direito à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Alan Tygel, membro da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos, explica que a partir da década de 1950, o Brasil passou a conceder incentivos aos agrotóxicos, como parte de uma ideia de desenvolvimento tecnológico na agricultura, especialmente na produção de alimentos. 

"O Brasil, desde a década de 1950, foi montando uma estrutura de isenção fiscal para os agrotóxicos. Primeiro com a isenção de impostos para fabricação de agrotóxicos no Brasil, com o objetivo de constituir uma indústria química aqui. Depois uma isenção para a comercialização desses produtos, como tentativa de criar o mercado consumidor, que ainda não havia no Brasil. Esses incentivos permaneceram, foram só aumentando a cada ano."

:: Como a ONU e o "capitalismo verde" atacam a soberania alimentar ::

Os prejuízos na arrecadação e para a saúde pública são expressivos, ressalta o especialista. 

"Hoje, nós temos uma situação completamente absurda, em que estimamos cerca de 13 bilhões de reais de isenção de impostos no último ano. Ou seja, 13 bilhões de reais que deixaram de entrar nos cofres públicos porque os agrotóxicos não pagam imposto, não pagam imposto de fabricação, não pagam imposto de comercialização, não pagam imposto de importação. Por outro lado, provocam gastos enormes no nosso sistema de saúde."

Pacote do veneno

Enquanto os ministros do STF avaliam a pauta, no Congresso tramita o chamado Pacote do Veneno, projeto de lei que afrouxa as regras de controle do uso de agrotóxicos no Brasil. O PL 1.459/2022 está em avaliação no Senado, sem data definida para ir a pauta até o momento. 

:: Aprovação do PL do Veneno teria impacto global e aumentaria 'via dupla' de agrotóxicos com UE, destacam entidades ::

Segundo Tygel, o PL traz uma série de preocupações e vai abrir as portas para mais agrotóxicos no Brasil. Um dos pontos que mais causa temeridade é o uso do termo "risco inaceitável" para produtos que podem levar a doenças como câncer, mutações genéticas, problemas hormonais e malformações fetais, 

"O texto como um todo tem esse espírito de flexibilizar e de deixar a lei mais frágil do que ela é. Em especial, nós temos 2 pontos que nos preocupam muito com relação à saúde da população. O primeiro é a introdução do conceito de risco inaceitável, que, por sua vez, remete ao conceito de risco aceitável para doenças que hoje a lei de agrotóxicos proíbe terminantemente."

O segundo ponto de preocupação, de acordo com Tygel, é a possível perda de poder de veto aos agrotóxicos por parte da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Aniva), órgão de controle que atua no setor. 

A votação no Supremo 

Até o momento três ministros já apresentaram votos. O relator, Edson Fachin, se posicionou contra os benefícios fiscais. Gilmar Mendes defendeu a posição do agronegócio e André Mendonça fez um voto de meio de caminho.  

:: Conheça Adilson Paschoal, criador do termo 'agrotóxico' e parceiro de Ana Primavesi ::

Para Mendonça, a redução de cobrança de tributos nestes produtos é parcialmente inconstitucional. No voto ele sugere prazo de 90 dias para que o poder Executivo da União e dos estados faça uma "adequada e contemporânea avaliação dessa política fiscal" e que atualize a "graduação da carga tributária" dos 3.162 agrotóxicos permitidos no país.  

Edição: Thalita Pires